Quem viaja ou tem amigos de fora, certamente, já ouviu: “O que está acontecendo com Caxias? Por que pediram o impeachment do prefeito? E aquele vice, hein?”
As recorrentes polêmicas e, principalmente, as duas denúncias contra Daniel Guerra (PRB) por crime de responsabilidade – a última apresentada pelo próprio vice-prefeito, Ricardo Fabris de Abreu (PSD), nesta semana – têm desgastado não somente a imagem do governo, mas a do município também.
Chefe de Gabinete da prefeitura, Júlio César Freitas da Rosa, diz que com frequência recebe mensagens de amigos de outras cidades fazendo piada da situação.
– Acaba sendo motivo de chacota. As pessoas brincam porque não entendem os disparates. Tenho um amigo que já disse que o Ricardo Fabris é o Temer do Guerra – conta.
Quem vê de longe realmente tem dificuldade em entender o que se passa na segunda maior cidade do Estado. Ex-governador do RS, Germano Rigotto (PMDB), que se divide entre Caxias e Porto Alegre, diz notar, além da incompreensão, uma preocupação em relação ao município da Serra:
– É natural que a oposição faça oposição. Mas eu acho que tem limites.
Sociólogo e professor de Ciência Política da FSG, Adão Clóvis Martins dos Santos é crítico à sequência de pedidos de impeachment. Para ele, há uma banalização do instrumento e falta de respeito à vontade popular.
– Creio que a democracia e os procedimentos democráticos ficam extremamente fragilizados quando se solicita o impedimento simplesmente porque nós não queremos (que o governante permaneça no poder). Isso expõe a cidade e expõe a seriedade da democracia – entende.
Presidente do Legislativo, Felipe Gremelmaier (PMDB) lamenta ter que conduzir, mais uma vez, o processo de votação do acolhimento do pedido de impeachment de Guerra.
– Nunca é bom passar por um processo de impeachment. Independente do resultado, gera desgaste e acaba incomodando.
O QUE DIZEM
Germano Rigotto (PMDB), ex-governador
"Tenho acompanhado de longe. Mas para ter impeachment tem que ter crime de responsabilidade, fora disso, acho que é forçar um processo que leva ao desgaste tanto de quem propõe quanto da própria administração, da própria cidade. Não tenho condições de fazer uma análise profunda dos pedidos, mas o primeiro foi rejeitado por unanimidade, então, não tinha base. O segundo pode estar na mesma linha. Acho que isso enfraquece a administração, enfraquece a própria oposição e atinge a imagem do município, não é bom para o município. Se o prefeito tem que corrigir rumos na administração, tem que analisar os erros que pode estar cometendo, se de fato a oposição tem responsabilidade em dar novos caminhos para a administração municipal... Agora, a radicalização e a vulgarização do processo de impeachment não é um bom caminho. Não é bom para a cidade."
Júlio César Freitas da Rosa, chefe de gabinete
"Temos que ser muito críticos a esse processo de impeachment. O período eleitoral passou. Houve um projeto vencedor que está apresentando resultados para a comunidade caxiense. Quem está manchando a imagem da cidade são os propositores desses pedidos infundados, talvez guiados por interesses pessoais e não republicanos, ao passo que o governo do prefeito Daniel Guerra tem empreendido esforços em enfrentar problemas históricos e tem uma marca reconhecida, que é o respeito às leis e à promoção do interesse público. Além disso, é importante notar que os próprios vereadores estão sendo surpreendidos por esses pedidos de impeachment, tendo logo de votá-los, sem qualquer juízo de admissibilidade prévia. Esse regimento do Legislativo, onde qualquer um, de maneira infundada, pode propor um impeachment e isso ser rapidamente levado à votação, é algo que causa um impacto negativo na opinião pública e paralisação desnecessária no meio político, expondo o Executivo e o Legislativo a discutir matérias estranhas em relação aos poderes."
Adão Clóvis Martins dos Santos, sociólogo e professor de Ciência Política da FSG
"Se nós estivéssemos em um país que possui o que se chama de referendo revogatório, que permite cumprir metade do mandato, tudo bem, mas nós não temos esse procedimento. A ideia que passa é de que, a partir de agora, vale tudo. Independente da vontade, o que está ocorrendo hoje é a criação de uma série de obstáculos que quase paralisam a ação do governo. Pense que o prefeito tomou posse e não tem uma semana sem que se crie um fato. Posso não me alinhar à posição do prefeito, mas isso não me dá o direito de toda semana, todos dias, criar uma espécie de factoide que paralisa a cidade. Eu diria que qualquer cidadão de bom senso percebe o desgaste que os pedidos geram. Inclusive, se abre um precedente muito grave, porque vamos supor que se aceite o pedido e a Câmara decida retirá-lo. A partir desse momento, qual a segurança que teremos da continuidade de um prefeito eleito? A vontade popular é soberana."
Felipe Gremelmaier (PMDB), presidente da Câmara
"Fica um clima tenso no ar, fica um clima de dificuldade, até porque toda a discussão acaba centralizada nesse assunto. Expõe a imagem da cidade, e a gente tem que ter consciência e os pés no chão para resolver essa situação e mostrar que Caxias é maior do que isso. Ninguém gosta de passar por um processo desses e, na minha posição, tendo que agir de forma institucional, é uma dificuldade lidar com todo esse processo, de tensão e divisão. São momentos bem complicados e tem que ter consciência neste momento."
Daniel Scola, editor-chefe da Rádio Gaúcha
"Não conheço nada parecido. Não tem precedentes o que está acontecendo em Caxias. O que pode chegar perto é quando o vice (Paulo Feijó) abriu uma guerra com a governadora Yeda (Crusius) em 2007, e passaram quatros anos se digladiando. A impressão de quem olha de fora é que a cidade está em guerra no seu comando administrativo. Esse conflito político não tem vencedores, e o maior perdedor é a população de Caxias. Não posso acreditar que esse tipo de conflito não ofereça algum prejuízo para a administração da cidade. Não acredito que o vice tem papel decorativo. Temos vários exemplos onde o vice é uma figura fundamental, é o suporte e o braço direito e que torna uma gestão eficiente. E para ter um impeachment precisa ter duas coisas fundamentais: articulação política com um parlamento disposto a derrubar o alvo do impeachment e mais do que isso, clima nas ruas de que tem que trocar."