O ofício do professor é um destes que parece estar no DNA de quem o exerce e transmite para sucessivas gerações da família. Trata-se de uma paixão que a criança desenvolve ao ver o pai ou a mãe lecionar com amor comparável ao que vê dispensado a ela na vida doméstica. Todo professor aprendeu muito cedo na vida que seria professor. Em Caxias do Sul, um exemplo dessa relação sanguínea está na família Tramontin, onde a matriarca Guilhermina, hoje com 84 anos, deu início a uma tradição que abrange três gerações, e dá pinta de ainda não ter se esgotado.
Na casa da Tia Nazinha, apelido que acompanha Guilhermina desde as primeiras salas de aula onde lecionou, em Bom Jesus, vivem a sobrinha Ana Maria, 65, e a neta Ana Paula, 28. São todas educadoras, assim como foi a mãe de Ana Paula, Neise, falecida há oito anos. Neste sábado, em que comemoram mais um Dia do Professor, elas reafirmam que não são unidas apenas pela profissão, mas principalmente pelo motivo em comum que as fazem amar a docência.
– É saber que fomos importantes para a vida de uma criança e que contribuímos para aquilo que ela vier a se tornar no futuro. O papel que o professor exerce é tão importante que não há como ter baixa autoestima, mesmo com toda a desvalorização que a profissão enfrenta – comenta Ana Paula, que é coordenadora pedagógica de uma escolinha infantil no bairro Cidade Nova.
– Nada é mais bonito do que ver um aluno querendo aprender – complementa Ana Maria, que deu aula na Terceira Légua e está aposentada, mas ainda sente um arrepio de vontade de voltar sempre que ouve soar o sino da escola no bairro São Pelegrino, próximo à casa da família.
Da mesma forma que a filha e a sobrinha de Tia Nazinha – e anos mais tarde a neta Ana Paula – reproduziam com suas bonecas aquilo que viam as profes da família fazerem na sala de aula, como escrever no quadro, repreender os malcriados e cobrar a tabuada, hoje as crianças da casa dão os mesmos sinais de que seguirão o caminho do magistério. Manuella, oito, e Ayme, sete, irmã e filha de Ana Paula, respectivamente, mostram-se apaixonadas pelas referências que têm na família.
– As duas chegam em casa e vão direto pegar as bonequinhas e brincar de dar aula. Eu incentivo, porque acho importante trabalhar com aquilo que se ama. Esse amor é a sementinha que nos dá a esperança de um futuro melhor – acredita Ana Paula.
Ninguém esquece de um bom professor
Ao longo da carreira de um professor como Tia Nazinha, que lecionou entre 1948 e 1978, ano em que se aposentou da escola Aquilino Zatti, em Caxias, podem passar milhares de alunos. Por isso, é impossível para ela recordar de todos. Mas na memória de um aluno, que durante a vida estudantil passa por algumas dezenas de mestres, os bons se tornam inesquecíveis. Ser uma figura marcante na vida de alguém é uma das melhores gratificações para quem escolheu a pedagogia.
– Antigamente, começava-se a estudar mais tarde, e por isso a amizade já surgia na escola mesmo. Fui comadre de muitos alunos e pais. Até hoje, gosto quando sou reconhecida na rua. Não faz muito tempo, estava no Santuário de Caravaggio quando fui abordada por um homem que disse que eu lhe dei aula na primeira série, 60 anos atrás – emociona-se Nazinha.
Para a neta Ana Paula, que mesmo jovem já reconhece alunos de 10 anos atrás ingressando na faculdade ou inseridos no mercado de trabalho, a profissão que a família Tramontin escolheu não acaba com a aposentadoria:
– Rubem Alves (escritor e educador brasileiro) tem uma citação de que o professor nunca morre. Independentemente do tempo que passar, um ex-aluno sempre irá chamar de professor aquele que deixou marcas na vida dele.