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A conquista da primeira medalha de ouro brasileira nos Jogos do Rio 2016 por Rafaela Silva, judoca oriunda da favela carioca Cidade de Deus, foi a cereja no bolo para os professores da Escola Municipal Dezenove de Abril, em Caxias do Sul. Há três anos, a expectativa pelas Olimpíadas no Brasil inspirou educadores do colégio do bairro São Giácomo, que reúne jovens de áreas bastante pobres, inclusive de invasões às margens da Rota do Sol (RSC-453), a criar o Projeto Olímpico. Surgiu como uma tentativa de, através de competições esportivas, pacificar a conturbada hora do recreio. Por meio do esporte, a rotina de xingamentos, empurrões e socos entre os estudantes deu lugar a disputas empolgantes em modalidades como futsal, basquete, vôlei, pingue-pongue e salto em distância. Os resultados começam a aparecer.
– A agressividade era um problema que tínhamos muito forte. Embora a comunidade tenha evoluído ao longo dos 18 anos em que trabalho aqui, muitos alunos ainda estão inseridos em famílias doentes, que não têm no diálogo a forma de resolver os problemas. Cabia a nós mostrar a eles que é preciso outro tipo de convivência, que não passe por discutir ou agredir. A melhor forma foi através dos valores do esporte, principalmente a obediência às regras. Aliando o ensino em sala de aula com a prática no recreio, temos conseguido diminuir muito os índices de violência – comenta a diretora, Neiva De Rossi, 46 anos.
Principal idealizador do projeto, o educador físico Rudimar Reali, 50, explica que parte dos recursos para melhorias na escola e a compra de equipamentos foram obtidos por meio do projeto Atleta na Escola, do governo federal. Mas a verba foi curta, inferior a R$ 2 mil. Foi necessário então contar com doações de empresas e a participação dos próprios alunos para ajudar na mão de obra, como a pintura da quadra.
– Um dos objetivos é ter o aluno como protagonista e cuidador da escola. Ensinando que o patrimônio também é dele, conseguimos diminuir muito a depreciação escolar. Tanto que, hoje, depois das 17h, nós podemos deixar o portão da quadra aberto para que os estudantes desfrutem dela até anoitecer – comemora Reali.
Atualmente, o único custo que a escola tem é com as medalhas e troféus para os competidores. Laureados em cerimônias em que os colegas param para assistir, os jovens têm a autoestima renovada e se sentem verdadeiros campeões. O próximo passo do Projeto Olímpico é oferecer aos alunos a chance de participar de competições organizadas pela prefeitura, das quais têm ficado de fora por conta dos custos de deslocamento, principalmente.
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Se faltar aula, "tribunal" intervém
Dentro do conceito de que o principal valor que o esporte ensina é a disciplina, o Projeto Olímpico da Escola Dezenove de Abril é rígido quanto às regras que permitem ou impedem a participação nas competições que integram o calendário. Se o aluno faltar à aula e não apresentar atestado, o "tribunal de justiça", como brinca o professor Rudimar Reali, irá bani-lo. O mesmo ocorre se houver envolvimento em episódio de briga ou depredação.
Aluna do 6º ano, Eduarda Bastos, 13, considera o esporte a forma mais divertida de passar o recreio e já participou das disputas de futsal, basquete, vôlei e pingue-pongue. Ela destaca a melhora no comportamento e na assiduidade das turmas:
– Antes, tinha briga o tempo todo, agora ficou bem mais calmo. Muitos param no recreio para assistir aos jogos, é muito mais legal. Às vezes, eu não estou muito a fim de vir para a escola, mas lembro que tenho um jogo e que, se faltar, não vou poder jogar. Até na sala, como depende do comportamento para poder participar, está todo mundo se comportando melhor.
O professor Reali destaca que o principal benefício aos alunos é aprender que, em muitos momentos, o esporte ensina a viver:
– O aluno tem de sair daqui sabendo respeitar o esporte, e isso é entender que vai haver vitórias e derrotas. Muito mais derrotas do que vitórias, como acontece na vida. Mas cada perda tem de servir para alicerçar um degrau rumo ao sucesso. É isso que estamos colocando na cabeça deles, mas a educação é um processo que precisa ser pensado em 10 ou 15 anos, não adianta ser imediatista. Estamos plantando uma semente.