O ambiente corporativo brasileiro tem mais mulheres do que nunca. O aumento de líderes femininas é apontado por uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que indicou a presença delas em 39% dos cargos de liderança em 2023. Atualmente, o grupo também representa 34% dos empreendedores com mais de três anos e meio em atividade no país.
Diretoras, gerentes, supervisoras: a diversidade de espaços galgados pelas mulheres tem comprovado a capacidade de coordenar. Para além do clichê do “olhar feminino”, essas profissionais têm apresentado características que agregam o meio empresarial.
Conforme um estudo desenvolvido pelos pesquisadores norte-americanos Jack Zenger e Joseph Folkman, que integra um relatório do centro de formação executiva Cnex, as líderes atuais são bem preparadas para comandar, focam no autodesenvolvimento, possuem a mente aberta, sabem ouvir críticas e são ousadas. Essas mesmas características são observadas em gestoras da Serra, que trazem ao ambiente empresarial uma nova versão de condução de negócios.
Há 12 anos em cargo de liderança e hoje na função de diretora de Planejamento Estratégico e Financeiro & Sistemas de Gestão na Randoncorp, Veridiana Sonego trouxe consigo a gestão de carreira, preparação profissional e a visão estratégica para coordenar outras pessoas.
— Entrei na empresa como analista financeira, mas sempre observei os colegas que ocupavam cargos de liderança e criei um plano de desenvolvimento. Muito disso se deu pela leitura do ambiente: avaliar quais as áreas tinham mais contato com a alta gestão para, a partir daí, me preparar para as oportunidades, pensar no network, na qualificação — conta.

Esse processo de Veridiana foi marcado por outro atributo frequentemente relacionado às mulheres: a formação contínua. Segundo o relatório do Cnex, a preocupação das mulheres com o preparo deriva da insegurança em não estar totalmente pronta para assumir a função de liderança.
— É a síndrome da mochila cheia. A mulher precisa dela bem cheia para se candidatar a uma vaga. Comigo também foi assim, parti do curso de contabilidade, que é minha formação inicial, e passei pela administração, fiz pós-graduação e um mestrado no ano retrasado em design estratégico. Foram anos saindo totalmente da minha zona de conforto, mas consegui ampliar meu leque de conhecimento — pondera.
Em contrapartida, os anos dedicados à formação contribuem para aumentar o nível de capacitação das mulheres, que, conforme a CNI, é de 12 anos, em média, enquanto o dos homens fica em 10,7 anos, além de permitir o desenvolvimento profissional e tornar as lideranças femininas mais propícias a aderirem a novas ideias.
Mulheres à frente na sucessão

O relatório divulgado pelo Cnex traz uma série de competências que as mulheres se destacam em relação aos homens. Entre elas estão construção de relacionamento, foco em resultados e resiliência. Não por acaso as duas homenageadas do 30° Mérito Metalúrgico Gigia Bandera, Silvia Paniz e Silvane Zan, trazem essas habilidades no perfil de gestão.
Depois de perder o irmão e o pai, então gestor e futuro gestor da Silpa Implementos Rodoviários, Silvia contou com o apoio da equipe para assumir a liderança da empresa e construir uma nova coordenação.
— Na época, lá em 2011, tínhamos colaboradores bem antigos. Eles foram meu suporte nessa transição da contabilidade para a gestão. Lembro que cada gestor me explicou como as áreas funcionavam, me ajudaram a entender qual era o estilo do meu pai e irmão de coordenar. Foi assim que encontrei meu jeito de tocar o negócio — conta.
Hoje, somando 14 anos na gestão, Silvia projeta a sucessão familiar com a neta, que, apesar dos quatro anos, já demonstra traços do perfil de liderança que o meio corporativo demanda.
Quando decidiu se juntar ao então companheiro para atuar na Matrizaria Cardoso, Silvane Zan se desafiou a aprender sobre um universo completamente desconhecido e amplamente masculino. A resiliência foi a primeira habilidade que precisou desenvolver.

— Eu nem sabia usar um computador, mas fiz curso de AutoCad para entender sobre o cotidiano da empresa. É impossível gerenciar algo que não se entende. Depois foram vários cursos e muito tempo para conquistar a confiança, sobretudo dos clientes. A sensação que tinha era que precisava demais provar que eu era tão capaz quanto um homem — relembra.
A situação mudou quando Silvane passou a investir em novas tecnologias para dentro da empresa. O foco nos resultados fez da marca mais competitiva, tornou os processos mais assertivos e a consagrou como líder experiente e inovadora. O próximo passo da sua gestão será preparar a filha para assumir.
Elas vão além do básico
Mais ousadas e dedicadas a metas desafiadoras. O perfil de liderança feminina apontado pelo Cnex mostra que as mulheres são ambiciosas quando se trata de objetivos profissionais – ao menos 3,4 pontos a mais que os homens.
Reinventar o hábito de consumo, expandir rapidamente as operações e criar um modelo de negócio moderno são algumas das conquistas que Inaeh Boeno teve nos últimos sete anos.
De uma pequena produção instalada na incubadora municipal de Garibaldi, em 2018, a quatro lojas e uma fábrica própria, que levam o nome da confeiteira. Em 2025, a empreendedora se tornou case de sucesso e referência em dos mais tradicionais segmentos.
— Todo mundo falava que não ia vingar, porque era uma loja só de doces. Diziam que eu tinha que colocar salgados, colocar mesas, ter um café. Realmente foi um projeto ousado, direcionado para um público muito específico. Mas já se passaram cinco anos que a primeira loja foi aberta e eu celebro nosso crescimento — revela.

As lojas em Garibaldi, Carlos Barbosa, Bento Gonçalves e Farroupilha são administradas por ela e pelo ex-noivo, que se tornou sócio do negócio. Segundo ela, adotar a gestão compartilhada foi uma das decisões assertivas que mais contribuíram para o desenvolvimento do negócio.
— Com o passar dos anos, eu entendi que para ser uma boa gestora precisa dosar o trabalho. Hoje, eu crio as receitas, gerencio a equipe da confeitaria, com 12 pessoas, faço o marketing. E o Eduardo, único homem entre nós, cuida do administrativo. Claro que a tomada de decisão é sempre em conjunto, mas essa divisão das coisas torna tudo mais fácil. Eu sonho e ele organiza as coisas para gente tirar do papel — comenta.
Gestão feminina em expansão
Cativar e reter talentos estão entre os maiores desafios da indústria. Nesse cenário, a diretora Veridiana Sonego entende que as mulheres podem aproveitar essa demanda para conquistar espaço e impulsionar a carreira.
— As empresas estão fazendo movimentos de atração e engajando as mulheres, sobretudo porque existe uma demanda por pessoas qualificadas. Nesse cenário de carência de talentos, as mulheres têm chances reais de crescer — avalia.
Na Randoncorp, ações de desenvolvimento voltadas para as colaboradoras têm auxiliado as mulheres a descobrir o potencial para se tornarem líderes. Cerca de 520 participantes já passaram pelo projeto Jornada Delas. Só na turma de 2023, cerca de 40% das participantes foram promovidas para cargos de liderança.
Em 2021, quando o projeto começou, cerca de 11% de mulheres ocupavam cargos de liderança. Agora, o índice atingiu 21%, com meta para expandir para 22% até o final de 2025. A ação reflete diretamente na diversidade, representatividade e alta capacitação do público feminino para assumir novos desafios na indústria.