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Tudo o que começa a ser construído nos primeiros anos de vida terá impacto na vida adulta. E um estudo realizado por pesquisadores da Organização Mundial da Saúde (OMS) e publicado na revista The Lancet Child & Adolescent Health, em 2019, aponta para números alarmantes entre crianças e adolescentes entre 11 e 17 anos brasileiras: 84% não realizam atividades físicas suficientes para a faixa etária.
Conforme explica o médico Lisandro Pavan, ortopedista, cirurgião da coluna vertebral e vice-presidente da Unimed Serra Gaúcha, cada etapa do crescimento das crianças e dos adolescentes têm diretrizes para a prática de atividades, que são recomendadas pela OMS e pela Academia Americana de Pediatria.
Conforme estudos citados por Pavan, recém-nascidos até o primeiro ano de idade devem ser estimulados no mínimo 60 minutos por dia com atividades como engatinhar e alcançar objetos, por exemplo. E, até um ano e meio, o ideal é evitar as telas e cuidar com as cadeirinhas e os carrinhos. Para crianças de um a três anos, o ideal são 180 minutos de atividades físicas por dia, como correr, pular e fazer brincadeiras livres. No entanto, o médico aponta uma preocupação para a faixa etária dos seis aos 17 anos:
— Essa é a faixa em que temos os maiores mitos e a maior dificuldade para introduzir exercícios, porque passada a adolescência, eles acabam fazendo por conta própria. Antes disso, até existem as atividades lúdicas e fica mais fácil, desde que se estimule. A diretriz para essa idade é pelo menos 60 minutos por dia, três vezes por semana. É o mínimo. E essas atividades entendemos como de intensidade moderada a vigorosas — explica Pavan.
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O vice-presidente da Unimed Serra Gaúcha diz que a falta de atividades físicas reflete em problemas como o sedentarismo e o uso de telas, que caminham lado a lado e podem desencadear em índices maiores de obesidade, além de diminuição da saúde óssea e muscular.
— Temos observado em crianças, além da obesidade e da baixa autoestima, a perda de foco, porque o esporte e a atividade física trabalham muito o foco e a atenção. Eles têm uma dificuldade social, porque a falta do esportes também não estimula a atividade social de convívio, de competição e trabalho em equipe.
Dicas e mitos
Lisandro Pavan dá uma dica aos pais: evitar a especialização em uma única atividade. Conforme o médico, o ideal é que as crianças e os adolescentes tenham a interação com mais modalidades, o que pode beneficiar, também, a saúde mental.
— Por exemplo, iniciar uma criança de quatro anos somente no tênis, estimular e fazer com que ela seja superespecialista no tênis, também não é bom. Isso acaba fazendo com que a criança não tenha contato com outros esportes, ocasiona lesões e, principalmente, o que temos observado é o burnout (alto nível de estresse), a parte psicológica envolvida, porque é muita pressão.
Um mito que, conforme Pavan, vem sendo derrubado nos últimos anos pelos artigos científicos, é o ingresso das crianças e adolescentes na musculação. Segundo ele, esses estudos acabam com a antiga crença de que a atividade poderia atrapalhar no crescimento, por exemplo. Mesmo assim, prega que é necessário um acompanhamento multiprofissional, começar com cargas leves e focar na técnica.
— Criando os bons hábitos nessa idade (infância e adolescência), tu vais manter durante a vida. Atletas que praticam esportes hoje em idade avançada eram crianças que praticavam antes. Fica muito difícil para quem nunca praticou iniciar em uma.
Família engajada
A nutricionista Sabrina Orlandin e o desenvolvedor de software José Brognoli vivem os esportes. Ela no vôlei e ele no futebol, além de frequentarem a academia. E toda essa atividade reflete nas filhas do casal: Laís, 11 anos, e Clara, nove.
A escolha da família foi por matricular em um esporte individual e outro coletivo, para que as meninas possam ter a experiências em grupo. Assim, estão no vôlei e na ginástica, no Recreio da Juventude.
Clara tem 10 horas semanais de atividades físicas, enquanto Laís, oito horas. Há dois anos, a mais nova ingressou na equipe competitiva da ginástica, enquanto a mais velha começou os testes neste ano.
— Tudo fica mais fácil em virtude da rotina de treinos. Por exemplo, estudar é mais uma situação que elas precisam resolver. Então, elas aprenderam que cada etapa tem que ser realizada e construída — conta o pai.
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Sabrina e José não proíbem as filhas de terem contato com telas, mas o uso é limitado, principalmente durante o período de aulas. Em casa, não há uma pressão para que se tornem atletas profissionais. Tudo é levado com naturalidade.
— Elas sabem que os professores exigem, que tem que ter disciplina, e se por elas está tudo bem, vamos incentivando. Elas viajam para Porto Alegre com os treinadores, elas têm uma maturidade no sentido de levar mais a sério e respeitar os treinadores, já muda a visão de disciplina, de serem cobradas, de lidar com as frustrações, porque também tem — diz Sabrina.