Com acessos bloqueados pelos deslizamentos de terra, que destruíram pontes e estradas, Veranópolis tenta contabilizar todos os prejuízos causados pela chuva. Além da falta de acesso com cidades como Bento Gonçalves e Cotiporã devido ao bloqueio e queda de tráfego direto, em levantamento inicial o município já soma R$ 32.346.483,62 em perdas na agricultura, um dos setores mais prejudicados no Estado. Sem previsão de liberação dos locais bloqueados pelos desmoronamentos, ainda é preciso chegar em áreas que estão ilhadas. Por causa da situação, os valores dos danos causados pela chuva em toda cidade podem superar os R$ 50 milhões, acreditam as autoridades locais.
Na Serra, a soma das perdas agrícolas é de pelo menos R$ 485,5 milhões. O número, porém, deve ser bem maior, porque, assim como Veranópolis, outros 10 municípios contabilizados na soma inicial divulgaram dados preliminares e ainda estão em processo de quantificação total dos prejuízos.
Sendo majoritariamente impulsionada pela citricultura, Veranópolis registrou estragos em aproximadamente 685 hectares de pomares de laranjas e bergamotas. Além de perdas em culturas que já estavam prontas para serem colhidas, em alguns locais o solo plantado foi totalmente comprometido e estudos devem ser feitos para que os produtores consigam recomeçar.
Em alguns lugares de áreas plantadas, os deslizamentos, estimados em cerca de 300 nas áreas rurais, foram profundos, derrubando o solo e deixando apenas as rochas nas propriedades. Sem terra para plantio, o processo de recomeço dos agricultores precisa ser feito desde o solo até a preparação, para que esteja fértil para produção. A partir disso, aguardar os cerca de cinco anos estimados para que as laranjeiras e as bergamoteiras comecem a dar frutos em quantidade ideal para consumo e comercialização.
O caso de recomeço preocupa o agricultor André Dal Más. Uma das propriedades passadas de geração para geração na família, de cerca de sete hectares, foi destruída e, devido a 10 deslizamentos de terra na estrada, não é possível estimar quanto foi perdido, porque a família ainda não conseguiu chegar até o local.
— A gente tem duas propriedades, uma onde a gente mora e outra que é onde a gente tem o pomar das frutas e que foi atingido. Duas partes tiveram deslizamentos que levaram embora boa parte do pomar e ficou inviável de chegar lá, ficamos sem acesso ao pomar. Lá tinham frutas prontas para colher, que já estão caindo e as que ficariam prontas mais adiante nós não conseguimos chegar para fazer tratamento, então elas vão ser perdidas também. É uma safra perdida, um ano perdido — lamenta o produtor.
Na primeira semana de maio, quando ocorreram os deslizamentos na Serra, a família do produtor conseguiu acessar duas propriedades vizinhas, onde moradores ficaram ilhados. Passando por entre os desmoronamentos, foi possível resgatar as pessoas para que pudessem se abrigar na área metropolitana de Veranópolis.
— Fomos abrindo caminho na mata fechada e passando pelos perais, era uma caminhada íngreme e com muito barro, muita lama. Enquanto caminhávamos nós podíamos ver as fendas que se abriram na terra, são enormes e achávamos que ia desmoronar mais, mas conseguimos tirar quem ficou ilhado. Teve um casal de idosos que o homem nós tivemos que improvisar uma maca para subir com ele, a mulher foi se apoiando e nós fomos ajudando. Um percurso de um quilômetro nós demoramos umas seis horas para fazer por causa da condição que estava — lembra Dal Más.
Por causa da situação e dos riscos de novos deslizamentos na cidade, a família de agricultores acredita que as perdas sejam de 90% de toda a área de plantio. Para o produtor, o futuro é incerto, principalmente devido ao desafio de reconstruir todo o local de trabalho e sustento da família.
— Nós ficamos agradecidos porque não perdemos ninguém, mas eu ainda estou indeciso, ainda não tenho um norte. Não sei se é viável a gente investir ainda neste pomar ou partir para alguma outra coisa. No momento queremos tentar chegar nele para depois tentar resolver a situação. Estamos vivendo uma sensação de desânimo. Vemos o nosso trabalho, as frutas que estariam praticamente prontas indo água abaixo, é muito triste. Consegui acessar a propriedade afetada por uma trilha e vi as frutas caídas no chão. A gente sabe que tem gente passando fome e ver o alimento perdido, o pouco que sobrou caindo, é muito triste. É uma sensação de incerteza porque não sabemos por qual caminho seguir — revela Dal Más.
Município tenta liberar estradas
De acordo com o secretário de Agricultura e Meio Ambiente, Fernando Fracaro, a prioridade atual dos trabalhos no município é a limpeza das estradas bloqueadas pelos deslizamentos. Por causa das barreiras, inúmeros produtores não conseguem acessar as propriedades de produção.
— A situação é preocupante. Temos comunidades inteiras sem energia elétrica desde o dia 30 de abril. Além disso, a cidade enfrenta desafios logísticos significativos devido à interrupção das estradas principais e em alguns lugares a rede de abastecimento de água foi comprometida e os produtores estão sem água. Isso nos deixa muito preocupados, a gente tem uma velocidade para recuperar as estradas, as máquinas conseguem trabalhar, mas tem alguns lugares que tem que parar o trabalho pelo risco de mais deslizamentos e a previsão de mais chuva nos faz não saber quando vamos conseguir chegar em todos os pontos atingidos — afirma o secretário.
Conforme relatos de agricultores à Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, parte de casas, maquinários, animais e áreas de cultivo foram perdidas devido aos deslizamentos de terra. Os impactos negativos se estendem além das áreas rurais, afetando também o comércio local e a vida urbana. A interdição da Ponte Ernesto Dornelles, na BR -470, que liga a cidade a Bento Gonçalves, e a queda da ponte que liga Veranópolis a Cotiporã, tem prejudicado a logística de transporte, dificultando o escoamento da produção agrícola e o acesso a cidades importantes para o município, como Caxias do Sul.