Cambará do Sul viverá um momento histórico na manhã de quarta-feira (14) com o lançamento do edital de concessão à iniciativa privada da exploração de serviços no Parque Nacional de Aparados da Serra e no Parque Nacional da Serra Geral. Os dois complexos, que formam a divisa natural entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina, possuem uma área total de 30,4 mil hectares.
A concessão divide opiniões uma vez que parte da população e do setor turístico é a favor da concessão, desde que sejam respeitados critérios como o comprometimento com a natureza nos cânions e com os moradores da cidade. A assinatura está programada para as 10h no Mirante da Trilha do Cotovelo, na sede do Aparados da Serra, onde fica o Itaimbezinho. O encontro conta com a presença do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. A informação foi confirmada pelo prefeito de Cambará do Sul, Schamberlaen José Silvestre (PP).
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Para ele, a assinatura do edital é mais um passo a ser celebrado, visto que é uma luta antiga da comunidade. De acordo com o prefeito, mais de 250 pessoas participaram da audiência pública para debater a concessão. No encontro realizado em 16 de janeiro de 2020, a maioria se manifestou favorável à concessão.
O único ponto que provoca controvérsias, segundo Silvestre, é a possibilidade de explorar novos acessos aos parques que abrigam os cânions Itaimbezinho e Fortaleza, o que preocupava o setor local que respira turismo e depende dos cerca de 250 mil visitantes todos os anos para manter os negócios lucrativos. Esses acessos, hoje fechados, interfeririam no fluxo de pessoas que circulam por dentro de Cambará do Sul. Com rotas alternativas, os turistas não precisariam passar pelo centro da cidade, o que poderia impactar na queda de arrecadação, uma vez que os visitantes não gastariam nos comércios e serviços da comunidade:
— Em um determinado momento se falou dessa possibilidade antiga de acesso principalmente ao parque Aparados da Serra, onde fica o Itaimbezinho. Debatemos e ficou definido que a única rota de acesso será a RS-427. Ela já está entre as prioridades do governo do Estado para ser pavimentada. Já o acesso ao Fortaleza no Serra Geral é pela estrada municipal CS012, que está em processo para ser asfaltada.
Silvestre acrescenta ainda que a concessão representa desenvolvimento não apenas para Cambará do Sul, mas para a região.
— Não só investimentos em melhorias e infraestrutura, que hoje é escassa no Fortaleza, a concessão só tem pontos positivos para toda a região. Em Cambará representa geração de emprego e renda, aumento do fluxo de visitantes e, consequentemente, oportunidades de negócios com a abertura de empreendimentos no setor de turismo, comércio, rede hoteleira e serviços. É algo que a cidade precisa e espera há anos, uma conquista — comemora.
O edital prevê investimentos em 62 pontos obrigatórios, como bilheterias, estacionamento, transporte interno, hospedagem e alimentação no Itaimbezinho e no Fortaleza, na Serra Geral. Entre as estruturas previstas no projeto básico, por exemplo, estão passarelas ligando os dois lados do Itaimbezinho.
AVALIAÇÃO
A presidente da Associação dos Empreendedores Turísticos de Cambará do Sul (Aeturcs), Kelly Fonseca, é a favor da concessão ao levar em conta as melhorias que serão promovidas no parque e o retorno dos investimentos à cidade, com incremento no turismo:
— Temos dois parques nacionais no município e é por essa razão que nós entendemos que a iniciativa privada vindo para cá e colocando a infraestrutura necessária, vai ser uma melhoria essencial para visitação nos cânions. Vai ser uma grande melhoria também para o fluxo turístico do município e isso vai trazer desenvolvimento para o Cambará do Sul, no sentido que a grande vocação da nossa cidade é o ecoturismo e turismo de aventura. A presença de um concessionário trazendo infraestrutura vai nos permitir ter um turismo mais qualificado para toda a região.
Kelly ressalta, no entanto, que desde abril de 2019, quando o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, esteve nos parques, a Aeturcs, as demais entidades e a população vêm debatendo e solicitando que não sejam criadas as tais vias alternativas para acessar o parque. Esses acessos se dariam pela RS-020 - um deles junto ao posto de informação e controle do Rio Camisas e outro na Estrada do Crespo. Atualmente, são utilizados apenas por funcionários do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), braço do Ministério do Meio Ambiente responsável pela gestão dos parques. O receio com a rota alternativa é porque o visitante não passaria pela cidade para, por exemplo, fazer uma refeição, pernoitar , tomar um café ou comprar um suvenir.
— O turista tem que passar por Cambará do Sul. A maior parte da comunidade é a favor desde que o fluxo turístico passe pelo município onde temos toda a infraestrutura para receber os visitantes. Esperamos também contar com o Ministério do Turismo apoiando o desenvolvimento do município para o nosso crescimento, mas de uma forma organizada, pensando em todas as partes de infraestrutura da cidade para receber bem uma quantidade muito maior de visitantes levando em conta todo um planejamento que vem sendo pensado há anos — explica a presidente.
"Sou a favor, desde que a comunidade seja beneficiada e meio ambiente preservado", diz empresária com MBA em Gestão Ambiental
Proprietária da Pousada João de Barro e da Zuppa Massas e Sopas, a advogada com MBA em Gestão Ambiental Cassiana Nery acredita que a concessão tem mais benefícios do que malefícios para a cidade:
— Os parques precisam de infraestrutura como estradas, receptivos, sanitários, área de descanso, alimentação, estacionamento, enfim... uma série de situações que acabam prejudicando o potencial turístico.
No entanto, ela aponta que é a favor da concessão desde que a comunidade seja bem representada.
— Esse processo precisa ser acompanhado de perto por representantes do trade turístico e da comunidade em geral verdadeiramente comprometidos com as pessoas daqui, para que a comunidade e a natureza não sejam esmagadas pelos grupos de investidores que irão chegar com a concessão. É da natureza desses processos que eles acabem por beneficiar grandes grupos de investidores (na maioria de capital estrangeiro) em detrimento do pequeno empresário local. E o que deveria ser a menina dos olhos de ouro para a economia local acaba por esmagar com os pequenos e tradicionais negócios, dando espaço para o maior e para o artificial — aponta.
A advogada também menciona a possibilidade do edital de concessão prever outra entrada para os cânions:
— Isso é inadmissível que aconteça. Seria um crime e uma total falta de respeito e cuidado com os que aqui vivem e lutam para preservar o destino e dar estrutura ao turista, sem ter estrutura na maioria das vezes. O turista procura nossa região por que sim, quer ter acesso e conhecer nossa cultura e nossos hábitos locais, nossa gastronomia, nosso conhecimento da região, nosso jeito de receber as pessoas, isso precisa ser preservado e defendido dentro de uma concessão. Isso também faz parte do turismo — defende.
PRÓS X CONTRAS
Prós
:: Melhorias na infraestrutura com a implantação de atrações e serviços.
:: Aumento no número de visitantes, podendo passar de 250 mil pessoas por ano para até 1 milhão de visitantes.
:: Pavimentação dos acessos.
:: Inclusão dos guias turísticos.
Contras
:: Rotas alternativas.
:: Atrações que podem descaracterizar os parques (apesar de o ministro garantir que todas as questões ambientais serão mantidas).
* A cobrança para acessar o parque é vista como natural, a partir da concessão, desde que a empresa invista em melhorias e que esse valor seja revertido em benefício da população de Cambará. Além disso, a ideia é que moradores dos municípios do entorno pagariam meia-entrada.
INVESTIMENTOS
Em entrevista nesta terça-feira (13) ao programa Atualidade, da Rádio Gaúcha, o ministro Ricardo Salles afirmou que a previsão é que, em dezembro, seja conhecido o vencedor do processo, que será responsável pelos parques por 30 anos. Salles destacou ainda que em janeiro de 2021 será possível iniciar o processo de concessão e os investimentos na região. Os investimentos, sendo R$ 60 milhões em infraestrutura, serão concentrados nos três primeiros anos. Em três décadas, serão R$ 200 milhões previstos.
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