Embora não seja obrigatório por lei, o isolamento social é recomendado por órgãos de saúde como forma de inibir o contágio por coronavírus. Por meio de decretos estaduais e municipais, o distanciamento é incentivado, tornando-se regra para a abertura, por exemplo, do comércio.
A medida visa prevenir a superlotação em hospitais, que pode ocorrer na região caso os números de pacientes diagnosticados com a covid-19 continuem aumentando — até quarta-feira (6), já eram contabilizados mais de 120 mil casos no Brasil, com mais de 8 mil mortes, sendo 87 delas no Rio Grande do Sul.
Uma parcela da população mostra-se incomodada com quem desrespeita as orientações e promove encontros e eventos particulares em casa. Um dos casos mais emblemáticos no Brasil foi da influenciadora digital Gabriela Pugliesi que, na noite de sábado, dia 25 de abril, recebeu amigos para uma festa, publicando alguns momentos nas redes sociais.
Em desaprovação à atitude, dezenas de milhares de pessoas deixaram de segui-la e algumas marcas que a patrocinavam também romperam contratos. Também são cada vez mais frequentes postagens de "desabafos" contendo relatos de festas com aglomeração de pessoas.
Segundo a médica infectologista Andréa Dal Bó, diretora das vigilâncias em Saúde de Caxias do Sul, é fundamental que as pessoas evitem ao máximo o contato social, restringindo-se neste momento apenas a familiares que vivam na mesma casa e tomando cuidado redobrado com pessoas acima de 60 anos.
— A gente tem a proporção média de uma pessoa podendo transmitir para duas pessoas. Em 30 dias, o número de contágios gerados por uma mesma pessoa pode passar de 400. Por isso a importância de sair apenas para trabalho e outras atividades essenciais, evitando festas e aglomerações — pontua a médica.
Em Caxias do Sul, a Brigada Militar (BM) já atendeu a diversas ocorrências onde foram constatadas aglomerações. De acordo com a polícia, a atuação se deu em virtude da perturbação sonora causada. Porém, em ações como essas, os envolvidos também são orientados a se dispersarem para evitar o contágio. A fiscalização e eventuais punições referentes ao cumprimento dos decretos fica a cargo da Guarda Municipal.
Em Canela, caso foi parar na DP
Um evento privado realizado pelo secretário de Turismo e Cultura de Canela, Ângelo Sanches Thurler, está sob investigação da Polícia Civil. A denúncia é referente a uma suposta aglomeração que teria ocorrido na casa dele na noite de sexta-feira, 24 de abril, estendendo-se até o início da madrugada de sábado, e foi protocolada no Ministério Público (MP).
O processo foi arquivado pelo promotor de Justiça Paulo Eduardo de Almeida Vieira, que encaminhou o assunto à administração municipal e Delegacia de Polícia da cidade. Estas podem dar continuidade ao caso, com eventuais aberturas de processos que teriam Thurler como réu. Conforme o promotor, a instauração de um procedimento administrativo na prefeitura fica a cargo do prefeito e ocorre somente caso ele considere pertinente.
Por meio de assessoria, a prefeitura informou que o secretário respondeu a um questionário, que agora passa por análise da Procuradoria Geral do Município (PGM). Ainda não há definição se um processo administrativo será aberto.
O último decreto publicado pelo município, em 30 de abril, prorroga os efeitos de calamidade pública e proíbe, por exemplo, concentrações de pessoas em espaços públicos, bem como a abertura de bares e restaurantes. Embora o regramento estadual não permita aglomerações com mais de 30 pessoas, o decreto canelense alerta para a obrigatoriedade do distanciamento de pelo menos dois metros entre clientes de lojas, que devem aguardar atendimento na calçada quando atingida a proporção de 30% da capacidade de cada estabelecimento.
A denúncia foi feita por Maria do Carmos Santos, ativista em Direitos Humanos e uma das líderes da ONG Vítimas Unidas — organização que intermedia diversas denúncias por todo o Brasil, incluindo agora casos relacionados à pandemia. A moradora de Canela, Aline Brustolin, também publicou em seu perfil no Facebook o relato a respeito do ocorrido. Uma das publicações teve pelo menos 40 compartilhamentos e uma série de comentários.
— Achei importante denunciar porque enquanto muitos municípios anunciam o aumento de casos confirmados e mortes, aqui em Canela pouco está sendo feito. Ele é um gestor público, não um cidadão sem nome, e me indignou o fato das pessoas envolvidas não terem noção do quanto estavam se expondo — afirma Aline.
"Ninguém vai dar atestado de suicídio"
De acordo com o secretário, alvo da denúncia, a mulher, os três filhos e ele receberam outros quatro casais (totalizando 13 pessoas) para um jantar que o grupo costuma realizar. Ele garante que o encontro ocorreu em um espaço amplo da casa, em uma varanda aberta, respeitando o distanciamento recomendado. Além disso, Thurler diz estranhar o fato do caso ter sido encaminhado à prefeitura, uma vez que não exercia funções de agente político, apenas de cidadão comum.
— Ninguém fala que tem jogo de futebol acontecendo, restaurantes abertos, filas em bancos e supermercados, mas com a minha casa tem que implicar. Eu não estava como secretário de Turismo, estava como Ângelo Sanches. Recebi pessoas que já são de nosso convívio, totalmente de boa índole, de família e que ficaram chocados com essa denúncia. Estou tranquilo, pois não levaria ninguém que pudesse colocar a vida da minha família em risco. Ninguém vai dar atestado de suicídio com tudo isso que está acontecendo — declarou o secretário, que pretende tomar medidas judiciais em sua defesa.
Nas palavras dele, a denúncia trata-se de uma "implicância" por parte da vizinha. Ele afirma, ainda, que muitas pessoas estão demonstrando solidariedade a ele e garante estar atuante no enfrentamento ao coronavírus pelo município.