De acordo com um estudo do Instituto Nacional do Câncer (Inca) de 2017, o número de casos incidentes estimados de câncer de mama feminina no Brasil para 2019 é de 59.700. Direta ou indiretamente ligados ao tratamento, são inúmeros os benefícios garantidos pela legislação brasileira para amparar a todas estas pacientes, sobretudo em casos de vulnerabilidade social. Estes direitos podem e devem ser acionados quando necessários e, para muitas mulheres, são fundamentais no processo de enfrentamento da doença.
Com o diagnóstico, o susto. Foi tudo muito rápido: da detecção do nódulo, passando pelos exames que confirmaram o câncer de mama e, ainda antes da quimioterapia, foi necessário passar pela cirurgia de remoção do tumor.
— Até chegar na frente do mastologista tu não pensa em ti, pensa em todos que estão à tua volta, mas depois se agarra ao tratamento e à cirurgia, que são a tua última chance — lembra a dona de casa Jacira Teresinha de Sousa, 43, que deu início ao tratamento de câncer de mama em 2016.
Leia mais
"Confio no poder das minhas escolhas para a cura", diz paciente em tratamento contra o câncer de mama em Bento Gonçalves
"Causa medo, mas não é sentença de morte", afirma caxiense que venceu o câncer de mama
Sem esperar, voluntárias do Centro de Auxílio às Pessoas com Câncer (CAPC) bateram à sua porta e este foi um dos amparos que ela recebeu como paciente oncológica. Além de ter contato com outras mulheres que viviam ou viveram a mesma experiência, a convivência fez Jacira se aproximar dos direitos que são garantidos a quem passa por tratamento.
Um deles é garantido pela chamada lei da reconstrução mamária (12.802/2013) que, assim como o nome já diz, garante a reconstituição da mama no mesmo procedimento da mastectomia (retirada completa ou de parte da mama afetada pelo câncer) quando há condição técnica e clínica. Isso já fez com que Jacira entrasse mais tranquila na sala de cirurgia.
— Como meu tumor era pequeno, foi possível reconstituir sem silicone, mas este é um direito de todas as mulheres, principalmente pela autoestima, porque muitas acabam entrando em depressão pela mutilação que ocorre no corpo.
Desde que foi acolhida, Jacira também tornou-se voluntária da CAPC, sendo hoje diretora de comunicação. Ela destaca a importância do conhecimento dos direitos legais que podem facilitar o enfrentamento à doença.
— É muito falado sobre câncer mas é pouco falado sobre os direitos que as pessoas têm. E elas têm muitos direitos.
O que não é garantido por lei, pode ser buscado por meio das ONGs — como a CAPC — que acolhem tanto às pacientes quanto às famílias, buscando parcerias para o custeio de necessidades como os medicamentos de combate aos efeitos colaterais da quimioterapia. O custo de medicamentos extra tratamento, segundo Jacira, fica na média de R$ 400 a cada sessão.
— Aprendi uma coisa com o câncer: a gente nasce e a morte chega pra todo mundo. No meio disso, tem o intervalo que é a vida. Temos que viver e buscar os nossos direitos. A gente não tá pedindo nada de graça, é um direito. Já é sofrido conviver com o câncer, mas mais sofrido ainda é não saber o que vai fazer.
Atuação pelo direito das mulheres com câncer
Nascer em uma família de médicos e, ainda na infância, acompanhar de perto o tratamento de uma tia diagnosticada com câncer de mama foram alguns dos fatores que levaram a advogada Regiane Ramos De Carli a optar pela atuação na defesa dos direitos das pacientes. Ela lembra bem da experiência da tia em um contexto onde o amparo legal às mulheres com câncer era quase nulo.
— Me marcou muito a cicatriz que ela tinha após a retirada da mama. Além disso, ela não teve um tratamento adequado, acabou morrendo seis meses depois.
Há 12 anos imersa na área, Regiane acredita na importância da garantia dos direitos legais, mesmo quando eles são negados em um primeiro momento, a nível administrativo. Ela destaca que, tendo conhecimento deles, a paciente deve exigi-los, mesmo que seja necessário ingressar com processo judicial.
— Os direitos não são muito divulgados porque geralmente são custeados pelo próprio governo. Quando são negados, muitas mulheres não têm condições de contratar um advogado, mas podem acionar a Defensoria Pública.
CONHEÇA OS DIREITOS
:: Tratamento
A Lei 12.732/2012 dá prazo máximo de 60 dias para o SUS iniciar o tratamento das pacientes com diagnósticos de câncer, seja ele de mama ou de outro tipo.
:: Reconstituição mamária
A paciente que passa por uma mastectomia, total ou parcial, tem direito à reconstrução da mama. A Lei 12.802/2013 assegura à paciente, que for submetida à retirada parcial ou total da mama, a cirurgia plástica reparadora da mama.
:: Saque do FGTS
Garantido pelo Art. 20, inciso XI, da Lei Federal n. 8.036/90. A solicitação do benefício pode ser feita em qualquer agência da Caixa, mediante a apresentação dos documentos necessários, cuja lista se encontra no site do INSS.
:: Direito ao Saque PIS/PASEP
Trabalhadores privados que contribuíram com os fundos podem obter informações junto à Caixa e os servidores públicos junto ao Banco do Brasil. Pode ser solicitado na mesma oportunidade em que for solicitada a liberação do FGTS, mediante a apresentação dos mesmos documentos.
:: Auxílio-doença
A paciente pode requerer junto ao INSS quando estiver incapacitada temporariamente para as atividades laborativas em virtude da doença. A concessão do benefício se dá mediante requerimento próprio realizado pela paciente, segurada, ou procurador, em qualquer agência da Previdência Social, portando documentação necessária para fins de agendamento da perícia médica.
:: Aposentadoria por invalidez
É concedida pelo INSS apenas se a incapacidade da paciente for considerada permanente pela perícia médica da Previdência Social. Terá direito ao benefício a segurada que não estiver em processo de reabilitação para o exercício de atividade antes ocupada ou que virá a ocupar.
:: Isenção de IR na aposentadoria por invalidez
A paciente portadora de neoplasia maligna está isenta da incidência de Imposto de Renda (IR) sobre seus proventos, sem limites. Para a obtenção da isenção, deve ser preenchido um requerimento com laudo emitido por órgão oficial atestando a doença.
:: Direito à aquisição de veículo adaptado com isenção de tributos
A paciente com alguma deficiência poderá adquirir um veículo especial adaptado à sua necessidade, comprovada por laudo oficial do órgão respectivo, Receita Federal, Secretaria da Fazenda ou Detran. Os tributos abrangidos pela isenção são o IPVA, ICMS e IPI.
:: Quitação do financiamento da casa própria
A paciente que for acometida por invalidez total e permanente causada por doença poderá ter direito à quitação do seu imóvel, mesmo sendo financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH), pela Caixa ou por bancos privados, ou até mesmo por qualquer outro meio de financiamento. Poderá ter direito à quitação do seu imóvel caso haja cláusula atinente no seu contrato.
:: Tratamento Fora do Domicílio (TFD)
Instituído pela Portaria nº 55 da Secretaria de Assistência à Saúde (Ministério da Saúde) visa garantir, por meio do SUS, tratamento adequado às pacientes com câncer e demais doenças não tratáveis no seu município de origem. Para ter esse direito, é necessário um laudo médico atestando a situação do paciente, demonstrando a real necessidade de fazer fora do seu domicílio o tratamento adequado.
:: Transporte coletivo gratuito
Alguns estados e municípios oportunizam a utilização do serviço gratuitamente, podendo ainda existir, alternativamente, uma redução na aquisição da passagem. Da mesma forma que os demais benefícios, será necessário que a paciente comprove a doença no órgão competente.
:: Prioridade na tramitação processual
O artigo 1.048 do Covo Código de Processo Civil confere expressamente prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais em que figure como parte ou interessado pessoa portadora de doença grave, assim compreendida qualquer das enumeradas no art. 6o, inciso XIV, da Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988.
Leia também
Freud dá conselhos a adolescente no filme "A Tabacaria", que estreia em Caxias nesta quinta