Em Pinto Bandeira, não há criança fora da escola, não tem fila de espera por vagas e sequer se aplica o zoneamento, regra que condiciona a matrícula de um aluno ao seu endereço residencial. Diferentemente de muitas cidades da região e do país, a prefeitura fornece o uniforme e um kit escolar para todo os matriculados na rede municipal. O transporte também é garantido, independentemente se o aluno está sob a responsabilidade do município ou do Estado. São situações assim que fazem de Pinto Bandeira a cidade que mais aplica recursos no Ensino Fundamental em todo o país, condição que a própria comunidade desconhecia até a última terça-feira (25).
O dado foi revelado pelo movimento Todos pela Educação, que acompanha o cumprimento das metas do Plano Nacional da Educação (PNE), surpreendendo o prefeito, Hadair Ferrari, e a secretária de Educação, Angelita Pavan Poloni.
Pinto Bandeira gastou em 2015 (base do estudo) R$ 19.511,40 por aluno _ ou R$ 53,45 por dia. É o maior valor de todo o país, superando capitais e cidades mais ricas. O Anuário Brasileiro da Educação Básica também mostra o abismo do ensino público. Turiaçu, no Maranhão, ocupa a última posição no ranking e disponibilizou R$ 2.936,81 por pessoa, ou R$ 8,04 por dia.
Pinto Bandeira se destaca por alguns fatores. O mais óbvio deles é o tamanho da população. Com 2,8 mil habitantes, o gasto com setores básicos como educação, saúde e infraestrutura são relativamente menores na comparação com Caxias do Sul ou Vacaria.
Outro ponto relevante é a emancipação conquistada em 2013, quando foi definido o desmembramento do distrito de Bento Gonçalves. No comando de um dos cinco municípios mais jovens do país, a administração pública de Pinto Bandeira se viu dona de um recurso que antes ia todo para o caixa da prefeitura de Bento e retornava aos poucos. A educação da comunidade, por exemplo, precisava disputar com outras demandas em uma região com mais de 100 mil moradores. A fila deixou de existir e o imposto recolhido ficou concentrado em Pinto Bandeira — R$ 2 milhões sobraram no ano passado.
Como Pinto Bandeira só tem três escolas municipais e 160 alunos matriculados, supera proporcionalmente administrações que atendem centenas ou milhares de estudantes. A única escola estadual tem 245 estudantes.
Em 2018, a aplicação de recursos na educação chegou a um total R$ 3,66 milhões, ou 28,56% do orçamento — no mesmo período, Caxias aplicou 21,4% dos recursos públicos na área, segundo o Portal da Transparência. O maior município da Serra ocupa a posição 307 no ranking — R$ 6.616 por aluno/ano.
— Seguimos mantendo o volume aplicado. Basta olhar no TCE (Tribunal de Contas do Estado) e ver que o valor no ano passado subiu em relação a 2015. Foram gastos R$ 23.028,97 por aluno — ressalta a secretária.
O valor investido por aluno é alto, mas representa pouco menos da metade da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): US$10.520 ou R$ 40,5 mil (cotação de quarta-feira).
Assim como em outras cidades, Pinto Bandeira também recebe recursos federais e estaduais para aplicar na educação.
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Sem avaliação da qualidade
Embora lidere o ranking no país, ainda não é possível determinar qual é a qualidade do ensino de Pinto Bandeira. Conforme a secretária Angelita, o número reduzido de alunos por turma impede a realização de avaliações do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) para os anos iniciais. A Escola Estadual Professor José Pansera, que não tem os mesmos recursos financeiros das municipais, obteve uma média de 5,5 na prova do Ensino Médio de 2017 _ a meta era de 4,8.
— Estamos estudando uma maneira de fazer uma avaliação própria para termos uma dimensão — projeta Angelita.
A prefeitura também assinou um termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público para viabilizar a construção de uma escola infantil. A unidade atual atende 45 crianças no piso inferior da paróquia.
_ Queremos erguer o prédio para atender de 75 a 80 crianças com recursos próprios até o próximo ano _ diz o prefeito Hadair.
"Nunca me preocupei com uniforme"
A estrutura da rede municipal da cidade é simples, sem unidades modernas, mas conta com equipamentos e profissionais necessários para o que se exige de uma escola básica. Todos os professores têm formação superior e boa parte possui especializações e mestrado. A Barão de Mauá, na Linha Jansen, recebe 59 alunos em um prédio erguido em 1942. Foi possível fazer melhorias como a cobertura da quadra e a abertura de uma brinquedoteca, segundo a diretora Greice Bettoni Tognon.
Outra vantagem é a disponibilidade de vagas. A única creche tem cinco vagas sobrando há tempos e se existe alguma criança sem atendimento seria por falta de interesse dos pais, conforme a diretora Silva Ferrari Detoni. Da mesma forma, o transporte escolar gratuito é estendido aos estudantes da escola estadual e aos 80 jovens que frequentam cursos técnicos e superiores em outras cidades. A prefeitura também oferta contraturno escolar com atividades variadas para quem quiser.
Por outro lado, as turmas multisseriadas, com alunos de idades diferentes numa mesma sala, chamam a atenção.
— Ficaria discrepante ter cinco estudantes e um único professor — justifica Angelita.
Mãe de Lucas, estudante do 2º ano do Fundamental da Barão de Mauá, Maria de Lourdes Greggio enxerga um interesse claro pela educação municipal.
— Na minha época não ganhava nada e tinha de ir a pé para o colégio. Desde que meu filho começou a estudante, nunca me preocupei com uniforme, material escolar e transporte. É outra coisa — atesta Maria.