
Entre setembro e dezembro do ano passado, professores da rede estadual de ensino realizaram o mais longo movimento grevista da categoria dos últimos 30 anos. No auge da mobilização, cerca de 7 mil educadores aderiram à paralisação, o que influenciou no andamento das aulas de quase metade das 2.545 escolas da rede no Estado. Passado quase um mês desde o encerramento oficial da greve, as instituições agora se mobilizam para recuperar o período de atividades suspensas.
Em Caxias do Sul, turmas de 28 escolas atravessam a época em que tradicionalmente crianças e adolescentes estariam de férias e prosseguem com as aulas. Na situação mais dramática, a Escola Professor Clauri Alves Flores, que atende a cerca de 400 estudantes do Ensino Médio no bairro Vila Ipê, estenderá as atividades até 20 de fevereiro, sendo que o ano letivo de 2018 se inicia oficialmente dois dias após essa data. Com isso, considerando a necessidade de pelo menos 30 dias de recesso, a instituição só deve começar o próximo calendário escolar em 18 de abril.
Apesar do adiamento das férias, segundo a vice-diretora Madalena Lucimar de Souza Silva, professores e estudantes demonstram comprometimento e cultivam boa relação:
– Não houve nenhuma reclamação de pais, de quem recebemos apoio, assim como dos estudantes, que defenderam a causa (greve dos professores). Todos os nossos professores estão cumprindo com a responsabilidade de recuperar o período em que estiveram paralisados. Ou seja, não há maiores problemas – garante.
Embora ainda precisem esperar mais de 40 dias para usufruírem de descanso, os alunos reiteram não haver incômodo em frequentar a escola em um período no qual muitos familiares e amigos estão aproveitando as férias.
– É complicado, mas a gente entende. Os professores não têm culpa, ninguém tem de trabalhar sem receber. E eu não tinha planos de qualquer forma – comenta o estudante Fernando Oliveira, 18 anos, do 3º ano da Clauri Flores.
– Ao menos estamos no último ano, então não vamos ter de abreviar as férias depois. De qualquer forma, eu trabalho, então nem pretendia sair da cidade – relata Dalvan Miranda, 17.
Reorganização constante
A resolução dos transtornos no calendário escolar resultantes da greve dos professores ainda está em processo de definição. Das 122 escolas abrangidas pela 4ª Coordenadoria Regional de Educação (4ª CRE) – que abrange 14 municípios da região –, 38 instituições estão em articulando redefinições.
– Nas escolas que vão encerrar as aulas até 20 de janeiro, haverá tempo hábil para retornarem às aulas no dia 22 de fevereiro. Para as que vão encerrar o calendário após 20 de janeiro, há duas alternativas: retomar aulas em 18 de abril ou aderir a um calendário híbrido, que é elaborado em conjunto entre as escolas e a coordenadoria – comenta a titular da 4ª CRE, Janice Moraes.
O calendário híbrido vai depender da organização das instituições sobre a quantidade de dias que pretendem oferecer de recesso e sugerir uma data para o fim das aulas. Para algumas instituições, o remanejo do calendário será mais complicado, uma vez que apenas algumas turmas continuam a ter aulas, devido a paralisações de profissionais específicos – especialmente dos anos iniciais, que possuem apenas uma professora, sem diferenciação de disciplinas. É o caso da Escola Sílvio Stallivieri, no bairro Santos Dumont, em Caxias, onde há apenas uma turma de 3º ano do Ensino Fundamental ainda em atividades, que devem prosseguir até 19 de fevereiro.
– Vamos ter de organizar um calendário específico para essa turma. Os pais compreenderam, apoiaram e aceitaram a realidade do movimento. A escola também cede em caso de alunos precisarem viajar de férias. Entendemos a situação das famílias – explica a diretora da Sílvio Stallivieri, Rosimeri Carvalho Teixeira.
Uma das maiores escolas estaduais do município, a Evaristo de Antoni, onde estudam 1,2 mil alunos, também dependerá de um estudo próprio para organizar as aulas da maioria dos estudantes.
– Vamos tentar algumas aulas aos sábados, mas já sabemos que essa situação vai gerar consequências também para o final desse ano. Os alunos vão atravessar 2018 e 2019 estudando novamente. Férias, provavelmente, só em meados de janeiro – comenta a diretora da Evaristo, Eloisa Elisabeth Waschow Medeiros.
– Tive de deixar de viajar. Pretendia ir para a minha avó. Meus pais ficaram chateados, mas a gente entende, os professores lutaram pelos seus direitos – comenta a estudante do 9º ano, Juliana Ritter Alexandra, 14 anos.
Reorganização
– Turmas de escolas que terminam as aulas antes de 20 de janeiro poderão iniciar o próximo calendário em 22 de fevereiro.
– Turmas de escolas cujas aulas vão ultrapassar o dia 20 de janeiro, precisarão optar por iniciar as atividades em 18 de abril ou elaborar um calendário híbrido.
4ª CRE investiga denúncias
Além de organizar os calendários junto às escolas, a 4ª CRE verifica supostas irregularidades cometidas por educadores na recuperação das aulas. De acordo com a titular da coordenadoria, Janice Moraes, somente nos primeiros dias de 2018, sete reclamações foram recebidas pela entidade.
– Foram protocoladas denúncias de que professores teriam ingressado com licença médica, quando, na verdade, estariam no Exterior. Também surgiram relatos de docentes que colocaram substitutos sem qualquer qualificação no lugar deles. Estamos apurando tudo e abrindo processos administrativos e sindicâncias – garante Janice.
Segundo ela, no entanto, a postura irregular seria exceção, já que a que maioria dos profissionais estaria cumprindo com os dias pendentes.
– É uma pena isso acontecer, pois prejudica o próprio movimento dos professores. A maioria deles (professores) está fazendo tudo de forma correta – afirma.
A vice-presidente do núcleo do Cpers/Sindicato em Caxias, Ana Paula Santos, é uma das educadoras que cumpre com o calendário remanescente com uma turma de 3º ano da Escola Sílvio Stallivieri.
– Não posso julgar meus colegas, mas espero que todos recuperem como previsto os dias de greve. Eu não pude fazer diferente porque aqui respeitamos muito nossa comunidade, de quem recebemos apoio. Tiveram pais que, inclusive, participaram do movimento dos educadores – afirma.