Pacientes chegam às 2h para tentar atendimento de saúde em postinho de Caxias

Um problema que periodicamente incomoda quem depende da saúde pública gera um movimento bem conhecido em Caxias do Sul: diante da falta de médicos, pacientes chegam à Unidade Básica de Saúde (UBS) antes de amanhecer para conseguir uma consulta. A situação ainda gera um mercado paralelo de pessoas que vão para a fila reservar lugar para amigos e vizinhos em troca de pequenas quantias em dinheiro, o que não é unanimidade nas comunidades.

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No postinho do bairro São Victor Cohab, zona Leste da cidade, o panorama complicou desde que um dos dois clínicos gerais se aposentou, em setembro do ano passado. Desde então, o número de atendimentos com o clínico caiu pela metade: de 32 para 16 por dia. Destes, 3 diários são para idosos, com horário agendado por telefone. Agora, todas as consultas ocorrem apenas pela manhã.

Às 4h45min desta terça-feira, oito pessoas já aguardavam na fila. Quinze minutos depois, eram 11. Quando o posto abriu, às 7h, 23 moradores do bairro e arredores esperavam, mas só os 13 primeiros garantiram a consulta.

Idosos, que desde o final de 2011 têm direito a consulta agendada, também madrugam na fila no São Victor Cohab. Plínio Miranda, de 63 anos, chegou às 3h e era o terceiro. No único dia disponibilizado para marcar consultas por telefone, a sexta-feira, ele tentou diversas vezes, mas a linha estava ocupada. Quando finalmente foi atendido, não havia mais horário para esta semana. Como precisa mostrar exames, não quis esperar.

- Não tenho preguiça de vir cedo, mas tinha que ter mais médicos, né - desabafa.

Apesar de ter chegado ao posto às 5h, Katiucha da Silva, 33, desistiu de buscar consulta para ela e o filho, Pablo Henrique, 14. Como já havia 13 pessoas na espera, preferiu não arriscar. Mesmo com medo de caminhar cerca de quatro quadras no escuro, hoje ela pretende chegar na UBS pelo menos uma hora mais cedo. A mulher tem tosse e problema no ouvido, e o jovem, irritação constante nos olhos.

- Faz mais de um mês que eu fiz exame de sangue e de urina e não consigo mostrar ao médico. Dá medo de vir no escuro, mas a gente se obriga, não temos a quem recorrer - resigna-se.

Além dos doentes, há pessoas da comunidade que vão para a fila reservar lugar para conhecidos, que ofertam dinheiro em troca. Nesta terça, um casal de 69 e 48 anos era o primeiro da fila. Eles chegaram à 1h40min para reservar lugar para um homem e uma mulher. A prática não agrada a todos. Enquanto quem aceita ir para a fila argumenta estar ajudando pessoas que terão de ir trabalhar depois da consulta, há quem critique e classifique a prática como um negócio. A secretária da Saúde, Dilma Tessari, desconhecia a situação.
 
Contraponto
 
Segundo a secretária municipal da Saúde, Dilma Tessari, janeiro e principalmente fevereiro são meses em que muitos médicos tiram férias mas o movimento nos postinhos também diminui. Segundo ela, não há nenhuma UBS sem médico: cada uma tem ao menos um profissional. Como terça era dia de fechamento do cartão-ponto, a Secretaria da Saúde não conseguiu concluir o levantamento de quantos médicos estão em férias.

- Há diminuição da oferta de profissionais, mas é pontual e momentânea, dentro de um planejamento. Temos médicos sendo chamados de concurso, nada é estático - diz a secretária, acrescentando que quando algum especialista tem férias, os pacientes são remanejados para outra UBS.

No São Victor Cohab, o novo clínico geral está contratado e começa a trabalhar no dia 2 de fevereiro, quando o posto voltará a oferecer consultas em dois turnos. Ele assinou contrato emergencial.

Dilma explica que nenhum profissional pode ser contratado antes de outro deixar o serviço. Quanto à demora para a chegada do novo médico no São Victor Cohab, a assessoria de imprensa da Saúde diz que a demanda foi maior em outras unidades.
Sobre a dificuldade de agendar consulta, Dilma explica que cada postinho define junto com o Conselho de Saúde local como realizar o procedimento. Dilma diz que vai conversar com a direção da UBS São Victor Cohab para verificar como melhorar a situação. Ela também pretende abordar a questão do pagamento pelas senhas de consultas.