Gilberto Blume: se a trilha de bicicletas no asfalto não der certo, basta desconstruir a trilha

Temos uma certeza apenas, uma só: chove.

Entre dormir e despertar e dormir de novo, chove.

Não bastasse o mundo, infreável, descendo a ladeira conosco embarcados, chove.

Fosse pouco estarmos encharcados de desmandos, de crises, de autoridades sem autoridade ou com autoridade excessiva, chove - e chove sobre nós quase tanto quanto chove sobre nós pessoas do mal.

O equilíbrio entre as duas chuvas vai longe, São Pedro ainda terá de se esforçar muito para igualar sua criação natural ao fenômeno humano.

Enquanto isso, chove.

Chove de cima para baixo, de baixo para cima, chove em golpes abaixo da cintura.

Em todos os sentidos, os esforços para que a água alcance nosso nariz são fortes, imensos e insistentes.

Diariamente chovem denúncias, chovem acusações, desmentidos, delações.

O volume de dinheiro desviado em falcatruas envolvendo o público e o privado jamais é menor do que alguns pares de milhões. Diante dos desvios, o prêmio da Mega-Sena parece troco de padaria.

Você ainda aposta em loterias?

Apostar em loterias é chover no molhado.

Os governos estão paralisados, nada anda, tudo se deteriora - e não são só as estradas arruinadas pela chuva. Fossem só as estradas a se deteriorar seríamos felizes, teríamos ali na frente o arco-íris e o pote transbordando de ouro.

Só que não.

Anteontem choveu dólar falso sobre Eduardo Cunha (ele voltou a rosnar que não largará o osso).

Ontem nova nuvem negra se formou sobre a CIC e a CDL quando foram divulgados os números da economia de setembro. A nuvem é espessa, é promessa de trovoadas ali adiante.

Choveram críticas sobre a ideia de abrir espaço às bicicletas. Críticas são bem-vindas, bicicletas também. Que tal deixar chover? Se a trilha das bicicletas no asfalto não der certo, basta desconstruir a trilha.

Achamos que não, mas nossa única certeza é que chove. Ainda não sei se é bom ou se é ruim ter certezas. Bom é ter certeza de não saber, mas também deve ser um pouco bom ter certeza de que as chuvas vão passar logo, sem deixar rastros importantes.