As consultas de pré-natal estão reservando uma surpresa desagradável para gestantes no Rio Grande do Sul. Mesmo quando têm com a cobertura de um plano de saúde, futuras mães deparam com a cobrança de um valor extra feita por obstetras sob a justificativa de garantir que o médico escolhido faça o parto, em vez de uma equipe de plantão.
A chamada taxa de disponibilidade, considerada irregular pelo Ministério da Saúde, mas tolerada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), costuma variar entre R$ 2 mil e R$ 4 mil pelo Estado. Em Caxias, o valor vai de R$ 700 até R$ 3 mil, dependendo da "disponibilidade econômica da paciente", conforme o presidente do Sindicato Médico da cidade, Marlonei dos Santos.
O tema ganhou destaque no mês passado, quando o ministro da Saúde, Arthur Chioro, condenou a cobrança praticada em todo o país. O valor é exigido como compensação pelas horas em que os médicos precisam ficar disponíveis para realizar o parto _ inclusive desmarcando agendas em seus consultórios e, com isso, perdendo dinheiro. Obstetras oficializaram a cobrança em Caxias há um ano em assembleia geral. De acordo com dos Santos, nenhum dos profissionais se opôs à decisão na reunião. A cidade conta com 120 destes especialistas. A estimativa do sindicato é que 80% dos profissionais tenham adotado a cobrança.
- Todos os contratos que temos com as cooperativas médicas não dizem, em momento nenhum, que estamos 24 horas à disposição. Os planos de saúde contam com plantão obstétrico com um médico que atenderá qualquer paciente que chegar. A paciente está pagando a mais para ser atendida pelo médico de confiança, porque prefere ele ao plantonista - defende Marlonei.
Cada médico recebe, em média, entre R$ 500 e R$ 600 por parto pelo plano de saúde. O valor está longe do ideal, afirma Marlonei. A presidente da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Rio Grande do Sul (Sogirgs), Mirela Jiménez, concorda: a remuneração oferecida pelos planos de saúde é muito baixa.
-Nós endossamos o posicionamento do Conselho Federal de Medicina, que considera ética a cobrança desde que seja informada na primeira consulta, e não seja um valor abusivo - afirma Mirela.
* Com Marcelo Gonzatto, da Zero Hora
Parto custou R$2,6 mil
A advogada Mariana Bernardi, de Caxias do Sul, conhece bem o constrangimento que a gestante passa ao receber a informação de que, mesmo pagando plano de saúde, precisa desembolsar mais dinheiro para ter o parto com a médica de confiança. Junto com a surpresa de que estava grávida, veio o aviso, ainda na primeira consulta:
- Vamos ter tempo para decidir qual é o tipo de parto que tu fará. O que não tem discussão é a taxa que cobro para o procedimento - lembra.
Este foi apenas o alerta do primeiro obstetra que visitou. O segundo e terceiro médico que também comunicaram que não abriam mão do pagamento adicional. Sem saída, Mariana acertou o parto por R$ 2,6 mil. E com uma exigência por parte do médico: a não emissão de nota fiscal. Ela diz que não assinou nenhum contrato, apenas recebeu um documento que explicava o que era a taxa de disponibilidade.
- Eu estou pagando duas vezes pelo parto. Mesmo tendo todo procedimento coberto pelo plano, você acaba pagando a taxa. É o parto do seu filho, momento em que está fragilizada, tu teme pela tua saúde. Não tem jeito - lembra Mariana, mãe de um bebê de seis meses.
ANS considera a taxa ilegal
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) considera a taxa de disponibilidade ilegal. Ela orienta que o consumidor relate o fato à sua operadora de plano de saúde. Caso o plano não encaminhe a denúncia, o consumidor poderá fazer uma reclamação na ANS e a operadora será notificada e poderá, inclusive, ser multada, caso constatada a infração. Denúncias podem ser feitas para ANS pelo 0800 7019656. A advogada especialista em casos envolvendo planos de saúde, Ramone Grasselli, afirma que pacientes ainda temem ingressar com ações contra obstetras em relação à cobrança indevida, ainda mais que os médicos dificilmente emitem notas fiscais.
- O correto é não pagar. Procure o plano de saúde, exija o direito, mas não pague - disse o advogado.
CONTRAPONTOS
Círculo Operário
"O Conselho Federal de Medicina preconiza que os médicos podem cobrar essa taxa de disponibilidade. As Operadoras devem se responsabilizar em proporcionar a suas beneficiárias, partos sem custo.
Essa situação no Círculo tem ocorrido de forma tranquila, pois havendo algum impasse com o profissional médico, nossas beneficiárias possuem a segurança de poder contar com o plantão obstétrico do Hospital do Círculo que atende 24h"
Fátima Saúde
"A operadora está ciente da existência da taxa de disponibilidade cobrada por parte de profissionais médicos para procedimento obstétrico. De acordo com diretoria técnica do Fátima Saúde, a operadora age de acordo com as recomendações da Agência Nacional de Saúde Suplementar, órgão regulador do governo quanto aos planos de saúde. Existe uma divergência de entendimentos entre a ANS, o Conselho Federal de Medicina e a Sociedade Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. A definição de um parecer único por parte destes órgãos beneficiará toda a sociedade. Prezamos sempre pelo atendimento adequado às beneficiárias, provendo toda a cobertura médica especificada em contrato e estabelecida por normas regulatórias"
Unimed
O Pioneiro tentou contato duas vezes com a operadora, mas a empresa optou por não se manifestar.