Na semana passada um casal de amigos se envolveu num pequeno acidente de trânsito, coisa banal, uma batidinha entre dois carros sem consequências como tantas vezes testemunhamos ou protagonizamos no dia a dia e que geralmente acontecem por imprudência de uma das partes.
Ninguém se feriu.
A cena é conhecida: ilesos, os ocupantes desembarcaram dos carros. É o momento de avaliar estragos, acionar seguro.
O casal estava reconhecendo ter errado, estava disposto a negociar a responsabilidade.
Aí se deu o inusitado.
Do nada, sem que houvesse discussão, desacordo, tentativa de mascarar o episódio, o outro condutor sacou um artifício que deveria ter surgido natimorto:
- Minha filha é juíza!
Pasmado, o casal saiu de cena, pois vira que ali a possibilidade de negociação seria zero.
Estamos com o pé em 2015 e ainda precisamos suportar gente armada com o indefectível "você sabe com quem está falando?"
É vergonhoso que um homem adulto, capaz de criar uma filha que tenha virado juíza, se valha de argumentos intimidatórios numa simplória batida de trânsito.
Juízas.
A juíza de Capão que soltou o condutor bêbado que matou uma garota de 19 anos porque não vira o atestado de óbito é nova prova de que as leis, fracas, estão aquém da justiça que o brasileiro merece e precisa. Há quem lembre, com razão, que as leis são criadas pelos vereadores, deputados e senadores que nós elegemos.
Se as leis são falhas, a culpa seria nossa. Seguindo esse raciocínio, logo vão responsabilizar o povo por tudo de ruim que acontece, da corrupção ao tráfico, das tragédias no trânsito aos equívocos judiciais pautados na legislação.
O distinto senhor que ameaça chamar a filha juíza para socorrê-lo no trânsito e a equivocada medida da juíza de Capão não têm nada a ver com leis fracas ou com leis fortes. Nos dois casos faltou bom senso, humanidade, inteligência. Tem, ainda, o caso do assassino de duas pessoas solto em júri na semana passada. Um promotor tenta anular o julgamento. Policiais armam protesto.
Tomara que 2015 venha com soluções para que saiamos com alguma honra desse casamento há tempos falido entre as leis e a justiça. Oremos.
Opinião
Gilberto Blume: Tomara que 2015 traga soluções para que saiamos com honra desse casamento falido entre leis e justiça
Se as leis são falhas, a culpa seria nossa
GZH faz parte do The Trust Project
- Mais sobre: