Apaixonados por cavalos, os amigos Vitor Boldrini, Adriana Susin, Renata Onzi e Maurício Lazari ganharam em junho de 2013 o que eles acreditam ser uma missão. Pela Brigada Militar, souberam de uma denúncia que um cavalo havia sido abandonado em um mato do Parque Oásis, em Caxias do Sul. Era um final de semana e eles não pensaram duas vezes: foram até o local, colocaram o bicho dentro da caminhonete e o levaram até a cabanha que Vitor e Adriana administram em Monte Bérico. O cavalo estava muito magro, completamente debilitado, com bicheiras e não conseguia nem ficar em pé.
- Achamos que ele não sobreviveria. Começamos a tratá-lo em agosto do ano passado e depois de complicações, foi diagnosticado uma osteomielite (inflamação óssea) - explica Adriana.
A alternativa sugerida foi a eutanásia, opção prontamente descartada pelos "anjos da guarda" do animal.
- Era tarde demais: já estávamos amando ele. Foi quando nós mesmos saímos em busca de alternativas, e então ele passou por uma cirurgia para amputar a pata e no lugar foi colocado uma prótese - detalha Adriana, que contou com o apoio dos médicos veterinários Flávio Gomes, Cassiano Boff e Jarbas Castro Junior, este último de Porto Alegre, onde o animal foi operado, uma vez que não há, segundo Adriana, este tipo de serviço em Caxias.
A prótese foi desenvolvida pelo protesista ortesista Antonio Carlos Oliveira, que tem uma clínica especializada em próteses humanas na Serra.
- Ainda que não seja o nosso foco, em casos específicos também desenvolvemos soluções para animais, como cães e outros bichos menores. Mas para um cavalo foi a primeira vez - explica o profissional.
Pudera, essa é uma iniciativa inédita no Estado. O suporte tem encaixe em polipropileno, tubo de alumínio em titânio, revestimento de silicone pra não machucar o animal e base de borracha.
- Assim, conseguimos amortecer a pisada e ele já consegue andar, trotar e ir a galope. Desenvolvemos algo funcional e viável, mas o ideal, claro, seria uma prótese em fibra de carbono. O problema é que isso envolve materiais importados com um custo muito elevado - diz Antonio, que não cobrou mão de obra, apenas o material.
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Depois de quase um ano, Campeão, nome que recebeu dos quatro amigos, segue recebendo cuidados diários. Para que o ferimento na pata amputada não crie escaras, é preciso fazer curativo duas vezes ao dia. Junto da prótese, para facilitar o encaixe, são colocadas uma fralda, medicamentos, meia e faixas.
À noite, o animal dorme sem a prótese. Desde junho do ano passado, o cavalo da raça crioula já usou quatro pernas mecânicas (sendo duas artesanais):
- Ele tem dois anos e meio e segue crescendo, por isso, essa pode não ser a última. Ele sempre se adaptou muito bem. O que nos dá força para continuar lutando é a força de vontade que ele tem. Ele quer viver! Lidamos com cavalos há muito tempo e muitos queria sacrificá-lo. Um cavalo vive, em média, 30 anos. Esse pode ser o tempo que teremos que cuidar dele. E faremos isso - conta Boldrini.
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Os quatro donos do Campeão não sabem ao certo o quanto já gastaram com o tratamento do animal, mas estimam que já desembolsaram entre R$ 10 mil e R$ 15 mil.
O alto custo para manter um cavalo amputado é uma das razões para que a prática seja rara, de acordo com o médico veterinário do conselho regional do Rio Grande do Sul Alexandre Carvalho Monteverde:
- Cavalo é um animal que tem função, seja para o trabalho ou para o lazer. Um cavalo amputado e parado é sinônimo de prejuízo para alguns. A outra razão para ser raro é que eles precisam das quatro patas para se locomover e, na maioria das vezes, não se adaptam tão bem a esse tipo de situação.
Mas, ao falarem do bicho, que já recuperou o seu peso (entre 300kg e 350kg) e caminha normalmente, os donos parecem não se importar com o dinheiro, muito menos com o cansaço.
- Queremos ser exemplo para as pessoas, que a nossa atitude seja multiplicada - destaca Boldrini, ao encher os olhos de lágrimas.
- Quando a gente o assumiu, assumiu ele para sempre. Agora queremos ver ele cada vez melhor, com uma prótese confortável, sem necessitar de tantos cuidados, e correndo solto pelo campo, que é para onde ele vai quando ficar completamente bem. Fizemos e seguimos fazendo tudo o que podemos. Fizemos por amor - finaliza Adriana.
Colaborou Ana Carolina Bolsson (ana.bolsson@zerohora.com)