A Clarice Lispector tem um conto que eu adoro, acho que é um dos meus contos favoritos. Ele andou pipocando na minha timeline nos últimos dias, chama-se “Restos do carnaval”. Grosso modo, o conto é sobre uma menina que ganha uma fantasia de rosa, feita com os restos do papel crepom da fantasia de sua amiga. É claro que não é só isso, Clarice tem muitas camadas.
Fico aqui pensando na história recente do carnaval Caxiense e isso me deixa extremamente feliz. Carnaval de rua. Rua! Logo aqui, uma cidade que é meio inóspita. Que durante outros períodos do ano não oferece nem a calçada para que as pessoas possam se encontrar. Durante o carnaval, o povo está nas ruas. E é tão democrático que assim seja. É tão bonito. Depois, nos outros meses, nos contentamos com as lembranças.
Mas e o lixo? O mijo? A sujeira? Os restos?
Bem, eu estive em Paris duas vezes durante a Fête de la musique, que é tipo o carnaval dos franceses, para celebrar o verão. Depois de meses de céu cinza e frio, as pessoas podem festejar na rua. Não que o clima seja um empecilho, como nós Caxienses, os Parisienses também saem para festejar com chuva e mau tempo. Quanto à festa da música, bem há música e gente por todos os lados, na rua!
Só que ao contrário de Caxias, Paris oferece muita opção ao ar livre. Não há um dia se quer em que as mesas dos bares e cafés não estejam ocupadas.
Mas o que mais me impressionou, em um dos dias da festa da música, foi a estrutura que a cidade ofereceu em termos de limpeza e segurança. Fecharam algumas ruas quando notaram que as pessoas estavam em perigo, para o bem-estar das pessoas, não dos carros. Havia policiais que estavam por todos os lados, não para impedir ou coagir o comportamento extravagante da galera, mas para garantir que pudessem fazer aquilo sem se preocupar. Outra coisa que me impressionou foi a limpeza. Quem já foi pra Paris sabe que a cidade é suja. Fede a mijo em vários lugares. Ah, o glamour! Sim, o glamour parisiense vem com esse cheiro. Mas eu falava da limpeza. Numa dessas ocasiões, eu estava hospedada em um hotelzinho no meio de Saint Germain, onde a bagunça pega geral. Eram seis da manhã quando ouvi um barulho estranho, era um caminhão de lixo que vinha seguido e um caminhão que lavava tudo e ainda alguns garis que recolhiam o grosso.
Voltei a dormir, eu tinha um dia de turista pela frente.
Quando eu saí para a vida, um pouco mais tarde. A cidade estava lá outra vez. Limpa e fedida na medida certa. É assim.
A gente ocupa, cada um se responsabiliza como cidadão, a prefeitura oferece estrutura. E pronto: temos nossa pequena cidade (carnavalesca e) gris de volta.
Acho que Caxias está no caminho para ser seu próprio exemplo, é só levar em conta que não queremos ser tratados com(o) restos.