
O grupo criminoso identificado como responsável por um ataque a um homem no pátio de uma delegacia de Porto Alegre é alvo de operação da Polícia Civil nesta segunda-feira (24). São cumpridas 26 ordens judiciais nesta manhã na Capital e em duas casas prisionais em Charqueadas — sendo 10 de prisão preventiva e 16 mandados de busca e apreensão. Até as 8h15min, cinco pessoas já haviam sido presas. Foram apreendidas drogas, armas, munições e fardas de uso das forças policiais.
Às 14h13min de 30 de outubro do ano passado, um homem correu em direção à 1ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa, na zona leste de Porto Alegre. Logo atrás dele, seguiam em perseguição pela Rua Barão do Amazonas, no bairro Partenon, dois criminosos armados. Os bandidos atiraram repetidas vezes na direção da vítima.
Daniel de Souza Ferreira, 45 anos, caiu morto no pátio, onde buscou refúgio. As imagens foram registradas pela câmera da própria delegacia.
A Operação Iter Criminis (caminho do crime) é resultado de cerca de quatro meses de investigação, que identificou os suspeitos de serem os executores, colaboradores, mandantes e um líder. Todos são alvos de mandados de prisão nesta segunda-feira. A apuração, segundo a polícia, conseguiu mapear toda a estrutura da ação criminosa.
— O crime teve um grau de violência extremamente grave, o que motivou uma força-tarefa ininterrupta para identificar todos os envolvidos e responsabilizar criminalmente cada um que participou desse delito — afirma o delegado Gabriel Borges.
Veículo incendiado
Segundo a investigação, quatro criminosos estavam a bordo do veículo, um Peugeot, que havia sido roubado na semana anterior. Os bandidos se reuniram para realizar o chamado “bonde”, com intuito de executar um rival, da Vila Conceição.
O alvo do ataque a tiros, segundo a polícia, havia se negado a trocar de lado, após a tomada da localidade pela facção com berço no bairro Bom Jesus, na zona leste da Capital. Em razão disso, o grupo decidiu executá-lo. Ferreira tinha antecedentes por tráfico de drogas e outros crimes.
Segundo a investigação, os criminosos se reuniram para planejar a execução dos rivais daquela área e, neste momento, receberam a informação de que havia algumas pessoas, entre elas o alvo, sentadas num beco. O grupo, conforme a polícia, sabia que o ataque seria realizado nas proximidades da 1ª DHPP, mas não imaginava que o alvo tentaria escapar para dentro do pátio. Um dos envolvidos inclusive chegou a monitorar a entrada da delegacia.
— O crime saiu do controle e o alvo conseguiu fugir a pé. Eles seguiram com a ação, e ele correu na direção da delegacia — explica o diretor do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Mario Souza.
Outras duas pessoas que estavam nas proximidades também ficaram feridas. As câmeras de segurança da delegacia flagraram a ação dos criminosos.
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Após a execução, os atiradores retornaram para o bairro Bom Jesus. Nas proximidades do bairro, incendiaram o veículo e esconderam as armas. A vítima foi alvo de disparos de pistola calibre 9 milímetros — um dos intuitos da operação é tentar localizar esses armamentos.
Conversa e comemoração
Num diálogo, extraído pela polícia, os próprios criminosos comentam o fato de que a execução se deu nas dependências da delegacia.
— Quase tomei na cabeça do “polícia” — narra um dos executores.
— Como assim, polícia "tava" lá? — responde o outro.
— Pegamos no pátio da delegacia. Ele caiu dentro da delegacia — responde o criminoso.
Ainda segundo a polícia, os bandidos pediram autorização e dinheiro ao coordenador da ação criminosa para realizar um “churrasco” de comemoração do crime. Esse investigado, de 29 anos, com antecedentes por homicídio, tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo e roubo a estabelecimento comercial, segundo a apuração, estava preso no momento em que coordenou o crime.
No mesmo dia do crime, duas horas após a execução, o carro incendiado foi encontrado pela polícia e encaminhado para perícia. O veículo havia sido roubado no centro de Porto Alegre.
Durante aquela noite, um suspeito de ser o motorista do veículo foi preso, escondido na casa de familiares, no bairro Bom Jesus. O homem, de 24 anos, tinha antecedentes por homicídio, roubo e tráfico de drogas. Ao ser ouvido, ele permaneceu em silêncio.
Crime organizado
Segundo a Polícia Civil, em 2024, o crime organizado foi responsável por 62% dos homicídios registrados na Capital. A operação realizada nesta segunda-feira faz parte das estratégias adotadas como forma de combater as execuções orquestradas pelas facções.
Foi criado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) um protocolo de sete medidas que é acionado sempre que o crime organizado comete um homicídio. Em resumo, a medida prevê uma sequência de ações, adotadas em escala. Estão previstas práticas integradas, entre as quais a mais severa é o isolamento dos líderes que ordenarem as execuções, tanto em penitenciárias dentro do Estado, como em unidades federais.
A técnica, chamada de dissuasão focada, foi criada por David Kennedy, professor de Criminologia da Universidade de Nova York. Há 25 anos, o criminologista desenvolveu com colegas a Operação Cessar Fogo, em Boston, que levou à queda dos homicídios por lá.
Sete ações
- Saturação da área do crime
- Ações pontuais e responsabilização das lideranças por crimes
- Operações especiais e de lavagem de dinheiro
- Revistas em casas prisionais
- Responsabilização de lideranças por homicídios
- Transferências de líderes para penitenciárias estaduais
- Transferências de líderes para penitenciárias federais