A felicidade que sempre procurou no acúmulo, Guilherme Possebon descobriu quando passou a compartilhar. Estamos falando de discos de vinil, o hobby que virou ofício do garibaldense que trocou a carreira de engenheiro pelo ritual de comprar, trocar e vender long plays. Grande parte do acervo de 25 mil discos expostos em um antiquário numa galeria no centro de Garibaldi são da coleção particular de Possebon, 40 anos e colecionador desde a adolescência, apaixonado por rock graças à mãe, fã de Elvis Presley, e ao pai, que embora preferisse música gauchesca, tinha lá suas bolachas dos Beatles.
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Dono de 25 mil discos, colecionador de Garibaldi largou carreira na engenharia para dedicar-se ao antiquário
Formado em Engenharia de Controle e Automação na PUCRS, Guilherme atuou no ramo por 10 anos. Saturado da rotina profissional, no início dos anos 2000 percebeu na popularização da internet a chance de dedicar-se ao comércio de antiguidades, e assim deixou para trás a área de formação. No começo, teve de superar não apenas a própria desconfiança, mas também a de todos os amigos que acompanharam o seu fervor de colecionador. Hoje se considera plenamente recompensado:
– Ninguém me imaginei vendendo nada, porque sempre fui muito apegado. Sou um colecionista. Mas posso dizer que a melhor fase da minha vida foi quando passei a compartilhar música. Conheci novas pessoas, adquiri muita informação, diariamente descubro alguma banda nova que não fazia noção que existia. Passei de acumulador de discos a acumulador de conhecimento musical – orgulha-se.
Roqueiro à moda antiga, de jaqueta de couro, camiseta preta de banda e cabelos compridos, Possebon mantém em casa não muito mais do que mil discos de estimação, quase todos pérolas adquiridas na adolescência, como a discografia do Creedence Crearwater Revival, algumas raridades do KISS, edições originais do AC/DC e tudo da banda preferida, Iron Maiden. Provocado sobre qual exemplar ele se arriscaria para salvar de um incêndio, responde de bate-pronto:
– Seventh Son of a Seventh Son, do Iron Maiden. Marcou minha adolescência. Esse eu levaria embaixo do braço.
Entre as histórias curiosas de uma vida dedicada aos vinis, o aficionado recorda quando o LP Rock a'Ula, dos Cascavelletes, voltou pra casa após um misterioso sumiço de 20 anos.
– Nunca vou saber como esse disco sumiu, se foi na mudança da casa da minha mãe ou se alguém roubou, mas era um disco que tinha o meu nome rabiscado. Como queria ter a coleção completa, passei um bom tempo atrás deste álbum até que um dia um amigo me ofereceu. Havia comprado num sebo em Caxias. Só quando cheguei em casa e coloquei para tocar vi que lá estava o meu nome rabiscado. Era o mesmo bom filho voltando pra casa 20 anos depois. Agora não sai da prateleira nem por decreto – brinca.
O acervo de Possebon reúne espólios de DJs que substituíram o vinil por tecnologias digitais, rádios que também se modernizaram ou faliram, colecionadores que desapegaram. A maior compra que já fez, cerca de 12 mil LPs, foi o espólio de uma rádio de Ijuí.
– Como não dá para empilhar as caixas, tive de contratar um caminhão baú para ir buscar. Só para carregar e descarregar foi um dia inteiro. Isso foi quando eu resolvi montar a loja física, uns três anos atrás, porque para ingressar num negócio desses precisa ter quantidade – lembra.
Da origem estritamente roqueira, a coleção passou a contemplar praticamente todos os gêneros musicais. Há pérolas do samba e do choro, coletâneas de MPB, relíquias de soul music e R&B, clássicos do jazz e muitas trilhas de novelas, como Dancin' Days (1978), Feijão Maravilha (1979) e Bandeira 2 (1971). As feiras trimestrais que ele organiza no corredor da galeria comercial onde o antiquário está instalado, passaram de 10 caixas a quase 200 nas edições mais recentes. E a loja passou a ser cada vez mais conhecida.
Confira uma playlist com sugestões do colecionador Guilherme Possebon
– No início do ano até o Humberto Gessinger esteve aqui comprando uns discos de música clássica pra gramofone – conta.
O público que garimpa relíquias nas feiras é bem diverso, de sexagenários que acompanharam o auge do disco a adolescentes que começam a descobrir no vinil um prazer diferente de consumir música (a onda retrô fez gravadoras como a Sony, por exemplo, voltar a produzir LPs após um hiato de 30 anos). Possebon vê a redescoberta do long play com otimismo para além da plataforma, mas para a própria música:
– É uma juventude que dá pra perceber que conhece música e se interessa. Esse retorno da musicalidade não se percebe só pela venda de discos, mas também na quantidade de bandas de garagem surgindo por aí, que é muito bacana. Só em Garibaldi conheço umas 20. A música não é só pra ouvir em casa, é legal que ela se espalhe de várias formas.
Ele próprio, contudo, não é um intransigente ouvinte de LPs:
– Gosto de ouvir vinil em casa, pra relaxar fazendo um churrasquinho, mas na correria do dia a dia prefiro algo mais prático. Mas sempre vou privilegiar os colecionáveis, como o CD, que devo ter uns 3 mil em casa. Porque não abro mão dessa expectativa de ir atrás, de reservar um espaço da casa para eles.
Feira no fínde
Neste sábado, rola uma feira de vinis promovida por Guilherme Possebon, com participação de comerciantes convidados. É na Galeria Rogério Fava Jr (Rua João Pessoa, 135) das 8h30min às 18h