O escultor João Bez Batti dorme apenas três horas por noite. E, ao repousar a cabeça no travesseiro, não consegue afastar a mente da criação artística. Dos sonhos recorrentes com rio, água e peixes, idealizou a série Piscianas, cujas primeiras obras já podem ser visitadas em Caxias. A exposição com a transposição de figuras oníricas para o basalto inaugura nesta sexta, às 20h, na Galeria Arte Quadros e traz uma dupla celebração: o aniversário de 76 anos do artista e a homenagem à companheira de 50 anos de vida, Maria Schirley.
– Ainda me sinto um jovem arrastando um baú de esperança, com meus sonhos de pedra – diz.– Esses peixes são uma volta à felicidade – explica, mostrando a delicadeza de polimento das formas pontiagudas que produziu nas rochas.
Ao referenciar momentos felizes, o artista retoma lembranças da mãe. Recorda-se do pato que ela desenhava quando Bez Batti tinha três ou quatro anos, bem como do hábito de acompanhá-la ao ir lavar roupas nas margens do Rio Taquari. Esculpir a pedra, ainda, apesar das mais de sete décadas de existência, é uma atividade polissêmica, como se promovesse uma viagem no tempo:
– Preciso voltar sempre ao rio, ao menos uma vez por mês. É como juntar meus pedaços e voltar à infância – conta. – Tão rápido quanto o sonho é a felicidade. Eles são como o orgasmo, duram segundos – afirma.
Paralelamente às Piscianas, cuja confecção de obras pode levar anos – há nove delas na Galeria Arte Quadros, além de peças de outros períodos –, Bez Batti está fazendo uma releitura de Pablo Picasso, da qual pretende montar nova exposição. É possível perceber, desde já, algumas influências do espanhol na arte de Bez Batti, em algumas cabeças com formas cubistas. Também quer expor com o filho Diego, tatuador que vive em São Paulo e voltou a pintar e a quem atribui um talento nato.
– O tempo está voando, o Natal já foi e precisamos pensar na Páscoa. Me sinto subindo a correnteza do rio, sei que não vou conseguir fazer tudo o que quero – relata, explicando que o processo produtivo inicia com esboços no papel, porque as esculturas dele sempre partem do desenho.
As mãos, no entanto, estão um pouco mais lentas do que os pensamentos e, aliadas à velocidade dos dias, lamenta ao imaginar que talvez não consiga realizar todos os projetos pretendidos. Ao mesmo tempo, celebra as conquistas.
– Nunca pensei que iria chegar até aqui. Meu segredo é a simplicidade, e parte do meu sucesso se deve a minha mulher. Quando eu esmorecia, ela me lembrava dos meus sonhos, sempre cuidou de tudo para que eu apenas pudesse criar – revela.
E quando sonha – e encontra alguém que o endosse – garante ter maior momento de liberdade. Está feliz, afinal, consegue viver de arte:
– Eu sou um milagre.
Artes plásticas
Bez Batti inaugura a mostra 'Piscianas', nesta sexta, em Caxias
Escultor inspirou-se em sonhos recorrentes com peixes para criar nova série em basalto
Tríssia Ordovás Sartori
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