O Ira! não tem o que esconder. Por isso, talvez, tenha entrado às claras no palco da All Need Master Hall, sábado. As diferenças entre Nasi e Edgard Scandurra, a voz e a criação do Ira!, estavam evidentes: enquanto o vocalista vestia uma camiseta com o escrito em inglês "O que Johnny Cash faria?", o guitarrista vergava uma do Sonic Youth.
Folk versus noise rock. Era bem com esse espírito que eles estavam. Se o cantor ensaiava um que outro pulo - mas preferia mesmo olhar extasiado para o público _, o guitarrista estava disposto a fazer sua indefectível Strato verde falar, desconstruindo os inícios e solos das músicas.
No palco, Nasi e Scandurra trocavam um que outro olhar. E era o bastante. Os quase sete anos afastados eram imperceptíveis. A não ser pelo tamanho de Nasi, um quase Faustão do rock - graças a Deus sem as piadas infames - e as ausências do baterista André Jung e do baixista Ricardo Gaspa. Por vezes, parecia faltar fôlego ao cantor, mas muitos entenderam como um sinal de emoção dele, dono de (ainda) uma das vozes mais poderosas do BRock. A todo instante, ele pedia: "vamos lá, Caxias", solicitando ao animado público para cantar determinado refrão - o de Eu Quero Sempre Mais foi lindo de se ver.
Da abertura com Longe de Tudo, primeira faixa do primeiro álbum - Mudança de Comportamento (1985) -, a Núcleo Base - escolhida para fechar a primeira perna do show e também desse mesmo disco - o Ira! passou por hinos como Dias de Luta e Gritos na Multidão, além de Tarde Vazia e Tolices, duas das mais belas canções do cancioneiro dos paulistanos, e a nova ABCD, um mod à moda antiga do Ira!
Houve tempo para o bis, com canções como Girassol e a sensacional Prisão das Ruas, de Meninos da Rua Paulo (1991), além de covers destruidores para Foxy Lady, de Jimi Hendrix, e Pra Ficar Comigo, versão para Train in Vain, do Clash - tudo com Scandurra mostrando por que é o melhor guitarrista do rock brasileiro.
O Ira! pode até não ser mais o mesmo, mas continua bom. Assim como o velho rock and roll.
Rock
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