Dois anos, três meses e 24 dias depois de ser danificado em um acidente de trânsito, em 8 de junho de 2017, o Monumento à Itália retorna oficialmente a seu local de origem. Embora tenha sido recolocada na esquina da Av. Júlio com a Rua Feijó Júnior ainda no dia 8 de setembro, a tradicional "bota" de São Pelegrino será "reinaugurada" nesta quarta (2), a partir das 16h, pelo prefeito Daniel Guerra.
Depois de um imbróglio que se arrastou por todo o ano passado, envolvendo nomes de possíveis restauradores da estrutura em basalto, o trabalho teve início em fevereiro de 2019, quando o artista plástico André Gnatta assumiu o processo de recuperação.
Conforme a arquiteta Karina Dick, da Secretaria Municipal da Cultura e responsável pelo projeto, o resultado também buscou deixar a "bota" mais perceptível à população.
– A base foi elevada dos originais 16 centímetros para 50 centímetros, com o propósito de proteger a obra de eventuais colisões. Dessa forma, a estrutura ainda mantém a relação de altura com os canteiros da Praça João Pessoa, uma vez que o monumento, no nível do piso, passava despercebido pelas pessoas – explica Karina.
A execução de todo o trabalho também foi acompanhada pela Divisão de Proteção ao Patrimônio Histórico e Cultural (Dippahc). Conforme a arquiteta Heloíse Salvador, titular da Dippahc, as duas placas originais em bronze, retiradas da estrutura que havia permanecido na praça para evitar furtos, voltam a compor o conjunto.
Limpas e fixadas com maior segurança, elas destacam duas solenidades históricas, em 1958 e 1978 (leia mais abaixo). Uma terceira placa, em aço escovado, trará as informações referentes ao restauro.
Segundo o artista plástico André Gnatta, a parte danificada da escultura (rachadura) será imperceptível à distância.
– Onde foi consertado, a mudança é mínima – revelou à reportagem da Rádio Gaúcha Serra, na última semana.
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Custos
Conforme a arquiteta Karina Dick, da Secretaria Municipal da Cultura, a recuperação do Monumento à Itália custou um total de R$ 14.210,00. O valor compreende não apenas o restauro em si e os materiais utilizados, mas todo o trabalho de remoção da estrutura, com o auxílio de dois guindastes, para o atelier do artista André Gnatta, em fevereiro.
A restauração será paga pelo Município, que deve pedir reembolso ao motorista responsável pelo dano.
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Inauguração em 1958
A tradicional "bota", esculpida em basalto pelo mestre da cantaria José Zambon, foi inaugurada por ocasião da visita do presidente italiano Giovanni Gronchi a Caxias, em 13 de setembro de 1958.
Gronchi circulou pela cidade na companhia do presidente Juscelino Kubitschek, que naquele ano quebrou o protocolo de governo e não compareceu à abertura da Festa da Uva – a justificativa foi de que, exatamente no período da festa, JK aguardava pelo político italiano no Rio de Janeiro, o que acabou não se concretizando. Para compensar, Juscelino, o vice João Goulart (Jango) e Gronchi chegaram a Caxias seis meses depois.
A placa oficial traz os dizeres: "Giovanni Gronchi, presidente da Itália, aqui esteve hoje, em visita à nova pátria dos artífices que transformaram o Campo dos Bugres na moderna Caxias do Sul. Homenagem do município – 13.09.1958".
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Registros históricos
Na foto que abre a matéria, o momento da inauguração – Juscelino e Jango não participaram da solenidade. Vê-se o presidente italiano Giovanni Gronchi, o prefeito Rubem Bento Alves, o bispo Dom Benedito Zorzi, o padre Giordani, o governador do Estado, Ildo Meneghetti, autoridades e centenas de moradores do bairro.
Abaixo o momento em que o carro da comitiva desloca-se para o centro da cidade. O veículo é rodeado por alunas do Ginásio São Carlos, munidas de bandeiras da Itália e do Brasil. Ao fundo, com as varandas e janelas tomadas de gente, o antigo casarão onde funcionou o consultório e a casa do dentista Aparício Postali e sua família — preservado em suas linhas originais e hoje sede de uma loja de roupas.
Placa extra em 1978
Vinte anos depois, em 4 de novembro de 1978, o "mapa" recebeu uma placa extra oferecida pelo Legislativo, a partir de um projeto encaminhado pelos então vereadores Mário Gardelin, Dino Périco e Remo Marcucci.
Eles buscavam homenagear, 60 anos após o armistício no front italiano, dois caxienses que haviam se inscrito como voluntários para defender a Itália na Primeira Guerra Mundial: o sargento Rafael Zambelli e o soldado Angelo Bracagioli, mortos em 1918.
Conforme informações contidas no livro Os Filhos da Arte, de Irma Buffon Zambelli, após dois anos de combate, Rafael foi ferido e capturado pelos alemães, tornando-se prisioneiro de guerra a partir de 15 de novembro de 1917 – no cativeiro, ele adquiriu a pneumonia dupla que acabou levando-o à morte, em 2 de março de 1918, no hospital militar de Langensalz, na Alemanha.
Rafael Zambelli tinha apenas 18 anos.
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