Fevereiro nem terminou, é só o segundo mês do ano, e já colecionamos uma sucessão de episódios, cada um deles com imagens emblemáticas, que são acachapantes, desanimadores, embrutecedores, e pior do que tudo isso, episódios trágicos, com vidas perdidas, que nos explicam sobre como agimos e atuamos - ou deixamos de atuar - em sociedade. Episódios onde transcenderam a estupidez e a barbárie, que estão impregnadas entre nós.
Fizemos referência neste espaço sobre Brumadinho, Ninho do Urubu, hipermercado Extra, agressão prolongada a uma mulher, por quatro horas, dentro de um apartamento no Rio. Uma galeria de horrores. Brumadinho ainda está contando suas mortes. Pois será preciso acrescentar uma quinta imagem, demolidora, esclarecedora sobre nosso estilo de vida: os eletrodomésticos, carcaças e bugigangas de todo tipo represados na cidade paulista de Salto, no leito do Rio Tietê. Uma imagem que também nos define como sociedade, essa com foco na área ambiental, e que percorre uma sucessão de lacunas. Por partes: em geral, todo esse material chega ao leito do Tietê a partir de enchentes e alagamentos que alcançam loteamentos irregulares, invasões, palafitas e endereços onde a moradia é indigna. O nível da água sobe e eles são levados pelo rio. É uma lacuna social: as condições degradadas de vida para uns e muitos.
Combina-se com a lacuna educacional: a deseducação geral de boa parte da população, com reflexo ambiental inevitável, refletida no descarte de toda ordem nas águas do Tietê. É mais um resultado da desvalorização da educação pela sociedade, pelos governos como consequência, materializada no salário indecente para professores, na estrutura deteriorada de escolas da rede pública. São elementos simbólicos dessa desvalorização. Em geral, não somos educados nem estimulados ao respeito ao outro. Fortalecido esse valor, seria natural respeitar o que é de todos, o meio ambiente.
Ainda tem a lacuna orçamentária, de gestão e prioridades: os administradores ditos gestores, que invadiram recentemente a cena política, e os políticos tradicionais não investem ou dizem não dispor de recursos para investir em saneamento, meio ambiente, habitação social, educação. Somem-se esses aspectos centrais e gerais, e é assim que construímos a imagem do leito do Tietê inundado por bugigangas. Ela vem sendo construída ano após ano, incansavelmente. Algo que já se viu em menor grau - visualmente falando, não tão intenso como no Tietê - na Lagoa Rodrigo de Freitas, na Baía da Guanabara. E aqui do nosso lado, no Tega, onde o descarte mais grave é de resíduos industriais.
Essa galeria de imagens vai escrevendo o ano. Que ano! E fevereiro ainda nem terminou. Seguindo a média, que Deus nos proteja.