Proliferam análises sobre as consequências da eleição presidencial americana. Diante das incertezas na área econômica, ao perguntarem qual o cenário provável, a resposta é: depende da China. Se o resultado da eleição aponta para uma vitória do discurso aos deserdados da globalização, na outra ponta está o grande país beneficiário e que não recuará facilmente. Não se está mais na Guerra Fria, quando os EUA impunham sua hegemonia unilateralmente: ao contrário da antiga URSS, a China joga dentro do jogo capitalista. Pragmática, está pouco preocupada com batalhas ideológicas. O regime autoritário conta com o crescimento para legitimar-se. Tem os EUA na mão por ser o grande financiador de seu déficit, com reservas em dólar suficientes para ser o único "player" capaz de causar estrago em sua supremacia. O programa de Trump, para ser executado, precisará aumentar tal déficit em estimados US$ 8 trilhões – os quais em tese não virão de impostos, já que a promessa é baixá-los.
A China pode perder com as mudanças no curto prazo, mas o desafio também representará oportunidade para ampliar suas áreas de influência. Já é a maior parceira comercial de vários países da Ásia, África e América Latina, como o Brasil. Obama compreendeu que o regime cubano tem dias contados e que se manter afastado da ilha a jogaria na órbita chinesa. A política de fechamento dos EUA deixa as elites latino-americanas com sentimento de orfandade que há muito a esquerda sonhava. Governos "liberais", cuja aposta era maior aproximação com os EUA, como os da área do Pacífico e, agora, Brasil e Argentina, sentem-se deserdados. A vergonha passada pelo ministro José Serra virou piada no mundo diplomático. O muro com o México, mesmo que não saia, já complicou a vida de todo capital lá investido – trata-se da economia do continente, desde o Nafta, mais integrada à americana, onde menos se quer uma onda de nacionalismo exacerbado.
Internamente, os caciques republicanos e Wall Street sabem disso, e não é à toa que não faltou apoio financeiro a Hillary, assim como da grande mídia. Externamente, faltou combinar com a China as consequências das promessas. E é aí que mora o perigo, pois o espaço vazio será ocupado por alguém.