Após a tragédia da boate Kiss, que resultou na morte de 242 pessoas e deixou centenas de feridos, o Ministério da Saúde criou um centro de atendimento aos sobreviventes, que passaram a necessitar de acompanhamento médico constante. Um cadastro de todas as pessoas envolvidas direta ou indiretamente com o incêndio (feridos, familiares, socorristas) está em andamento. O objetivo é monitorar essas pessoas por um prazo de cinco anos.
A Secretaria Estadual da Saúde calcula que cerca de 1, 6 mil pessoas passaram por algum tipo de atenção, seja em hospitais, ambulatórios ou no programa Acolhe Saúde, especializado em atendimento psicológico.
Centro de atendimento
O Ministério da Saúde determinou, ainda em fevereiro, que o Hospital Universitário de Santa Maria deveria concentrar os atendimentos aos sobreviventes da tragédia na Kiss. Por meio de concurso emergencial, foi contratada uma equipe multiprofissional para compor o Centre Integrado de Atendimento a Vítimas de Acidente - o Ciava Acolhimento.
Chefiado pela enfermeira Soeli Guerra, o núcleo já atendeu cerca de 700 vítimas diretas ou indiretas da Kiss, encaminhando cada um para as especialidades necessárias. Os casos que carecessem de fisioterapia para recuperação de movimentos, musculatura e respiração - num total de 62 - foram encaminhados para o Ciava Reabilitação.
O Ciav Reabilitação é coordenado pela doutora em fisioterapia Ana Lúcia Cervi Prado, e conta ainda com mais sete profissionais. Dos 62 pacientes iniciais, 42 ainda estão em tratamento contínuo. A partir de agora, os pacientes queimados que precisarem serão encaminhados para agendamento de cirurgias plásticas e não precisam mais das malhas protetoras.
Medicamentos
Os medicamentos são fornecidos através da 4ª Coordenadoria Regional de Saúde. A orientação era de que todos os remédios receitados estivessem inseridos dentro de uma lista liberada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Caso a droga estivesse fora dessa tabela, o custeio teria de ser particular ou então o paciente necessitaria entrar com uma liminar por meio do Ministério Público para receber a medicação.
De acordo com Ilse Melo, coordenadora da 4ª CRS, o problema com a falta de remédios foi sanado.Hoje, o principal problema no Ciava está relacionado à demora na reposição de equipamentos e material de consultas. A 4ª CRS afirmou que essa questão também já estaria sendo encaminhada, para que não haja prejuízo no tratamento.
Pesquisa
Além do auxílio médico, fisioterápico e psicológico às vítimas, o Ciava proporcionou ganhos na questão acadêmica. Um grupo de pesquisa foi criado para atuar em duas frentes: gestão e clínica. Na parte da gestão, serão apontadas as formas de organização e administração de serviços para ação em grandes tragédias. Na parte clínica, será feito o cruzamento e compilação de dados referentes à tragédia da boate Kiss para uso na literatura médica.
Neste primeiro ano, o grupo já participou de congressos dentro e fora do Brasil. Vale lembrar que as tragédias de Rhode Island, nos Estados Unidos em 2003, e de Cromañon, na Argentina em 2004, não deixaram registros que pudessem auxiliar no tratamento das vítimas da Kiss.
Entenda o caso
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, ocorreu na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013 e resultou na morte de 242 pessoas. O fogo começou durante uma apresentação da banda Gurizada Fandangueira, quando o vocalista do grupo acendeu um artefato pirotécnico e as chamas atingiram a espuma do teto da casa noturna.
A perícia concluiu que o material não era adequado para o isolamento acústico e teria sido o responsável pela liberação de fumaça tóxica. As investigações também mostraram que o local estava superlotado na noite da tragédia, tendo apenas uma porta de entrada e saída, além de janelas obstruídas. Ainda foram constatadas irregularidades em relação aos alvarás da Kiss.
Dois integrantes da banda e dois sócios da boate foram presos no dia seguinte ao incêndio, recebendo liberdade provisória quatro meses depois. O inquérito policial, concluído em março, indiciou 16 pessoas criminalmente pela tragédia. Já o Ministério Público (MP) denunciou oito bombeiros por responsabilidades no caso. Segundo o MP, eles teriam fraudado a liberação de alvarás e dos Planos de Prevenção e Proteção contra Incêndios (PPCI).
O prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB), também foi apontado no inquérito por homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Em julho, contudo, a Justiça determinou o arquivamento da denúncia contra ele, alegando falta de elementos para apontar responsabilidades do prefeito no caso.
Atualmente, três processos criminais sobre a Kiss tramitam na Justiça. Entre os réus estão os sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann; o produtor da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão, e o vocalista, Marcelo de Jesus dos Santos.
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