
Após aval ucraniano, a proposta de cessar-fogo com a Rússia mediada pelos Estados Unidos ainda está envolta em incertezas. A principal delas, por ora, é se o Kremlin vai aceitar os termos propostos pelo governo de Donald Trump na terça-fera (11) em Jidá, na Arábia Saudita.
Vladimir Putin é pressionado por aliados ocidentais de Kiev a responder e dar início a uma trégua imediata de 30 dias no conflito (entenda abaixo).
A negociação entre Trump e Volodymyr Zelensky coloca na mesa a retomada da assistência e do compartilhamento de inteligência à Ucrânia, interrompidos após a discussão entre os presidentes na Casa Branca.
Como compensação ao apoio dos EUA em três anos de guerra e como forma de impulsionar a economia combalida, a Ucrânia pode abrir parte de suas reservas mineirais para os americanos.
A situação futura do território ucraniano ainda é uma interrogação. A Rússia ocupa cerca de 20% do país, e a concessão de parte ou todo esse espaço a Moscou é considerada inevitável tanto por Putin quanto para a diplomacia dos EUA.
Cercado politicamente, Zelensky se viu forçado a aceitar os termos americanos. A Rússia diz aguardar detalhes do plano para tomar uma decisão, mas já tem uma vitória com o recuo ucraniano. Dessa forma, o futuro do cessar-fogo é uma incógnita.
— Vladimir Putin não é confiável. Mas Donald Trump também não o é. Essa desconfiança mútua joga dúvidas sobre a efetividade (e eu diria até seriedade) do que está sendo chamado de plano de cessar-fogo na guerra entre Rússia e Ucrânia — analisa o colunista de GZH Rodrigo Lopes.
Nesta quarta-feira (12), Zelensky disse que não confia na Rússia e afirmou esperar que os Estados Unidos implementem medidas "fortes", incluindo sanções, caso Moscou não aceite a proposta.
Essa trégua de 30 dias, enfatizou Zelensky, deve servir para "colocar no papel as etapas acordadas com nossos aliados" e "os formatos para garantias de segurança".
O que se sabe sobre o cessar-fogo
Trégua de 30 dias
Os confrontos, que já duram mais de três anos, seriam interrompidos por 30 dias. Inicialmente, a Ucrânia desejava que apenas incursões aéreas e marítimas fossem pausadas, segundo Zelensky.
Os combates por terra não sofreriam mudanças, com o temor de que, sem garantias, Moscou voltasse a invadir o território ucraniano. Contudo, Zelensky aceitou a trégua por todas as frentes, como propuseram os EUA.
"O lado americano propôs dar um primeiro passo ainda maior: um cessar-fogo provisório total de 30 dias, não apenas interrompendo ataques com mísseis, drones e bombas, não apenas no Mar Negro, mas também ao longo de toda a linha de frente", escreveu o presidente ucraniano nas redes sociais.
Outra demanda de Kiev é a libertação de prisioneiros de guerra, tanto militares quanto civis, e o retorno de crianças ucranianas transferidas à força para a Rússia.
Enquanto o Kremlin não responde, a Rússia manteve ataques. Uma mulher morreu e ao menos 15 pessoas ficaram feridas após um bombardeio atingir a cidade de Kryvyi Rih, no centro da Ucrânia. Um dia antes, Kiev já havia sido alvo de mísseis.

Assistência americana
As feridas expostas no bate-boca entre Trump e Zelensky na Casa Branca começam a ser reparadas — ainda que com as concessões ucranianas. Os americanos devem retomar o repasse de US$ 1 bilhão para o país. O valor, equivalente a R$ 5,8 bilhões, corresponde à ajuda de segurança prestada pelos EUA.
O auxílio militar dos Estados Unidos foi aprovado durante o governo de Joe Biden. Segundo o Departamento de Estado, o país ofereceu "US$ 65,9 bilhões em assistência militar" à Ucrânia desde 24 de fevereiro de 2022.
A suspensão foi tomada como forma de garantir o comprometimento dos envolvidos em uma solução para o confito, disse uma fonte da Casa Banca à agência AFP.
Na esteira dos acontecimentos, Washington também suspendeu o envio de informações de inteligência para Kiev. O diretor da CIA, John Ratcliffe, afirmou à Fox News que "Trump tinha dúvidas reais sobre se o presidente Zelensky estava comprometido com o processo de paz".
Minerais
Estados Unidos e Ucrânia decidiram assinar um acordo para que os americanos tenham acesso aos recursos minerais do país europeu.
A negociação busca criar um fundo controlado por Washington a fim de receber receitas da exploração de titânio, lítio, gás, petróleo e elementos de terras raras, metais usados em setores de alta tecnologia. Esses elementos são utilizados na fabricação de celulares, veículos elétricos e equipamentos militares.
O secretário de Estado americano, Marco Rubio, disse nesta quarta-feira (12) que o acordo daria aos EUA "interesse direto" em proteger a Ucrânia, embora não tenha prometido garantias formais de segurança aos europeus.
— Eu não apresentaria isso como uma garantia de segurança, mas, certamente, se os Estados Unidos tiverem um interesse econômico que gere receita para nosso povo e também para o povo ucraniano, teremos interesse em protegê-lo — afirmou Rubio.
Território
Depois de perder a região da Crimeia em 2014, após uma invasão russa, a Ucrânia não tem o controle das regiões de Luhansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhzia, tomadas na atual guerra.
O acordo firmado com os EUA não tratou do futuro das fronteiras ucranianas, mas os americanos já consideram a possibilidade de que o mapa do país europeu será redesenhado.
— Os russos não podem conquistar toda a Ucrânia, e obviamente será muito difícil para a Ucrânia em qualquer período de tempo razoável forçar os russos a voltarem para onde estavam em 2014 — disse o secretário de Estado americano, Marco Rubio.
Posição dos russos
A primeira declaração oficial do Kremlin após a Ucrânia aceitar os termos dos EUA foi vaga. O porta-voz de Putin, Dmitry Peskov, afirmou que os americanos precisam informar Moscou acerca do resultado das negociações antes de qualquer comentário oficial russo.
Conforme a agência Reuters, fontes russas consideram difícil Putin concordar com um cessar-fogo sem discutir os termos negociados e sem ter garantias. Donald Trump disse que deve entrar em contato com o presidente da Rússia ainda nesta semana.
Entre líderes europeus, que se mantêm aliados à Ucrânia, a cobrança é para que Putin aceite o acordo. O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, falou em "progresso significativo" nas negociações, enquanto a sua colega italiana, Giorgia Meloni, insistiu que "a decisão agora depende da Rússia".
O presidente da França, Emmanuel Macron, que sugeriu a presença de forças europeias na Ucrânia, insistiu que Kiev precisa de garantias de segurança sólidas em qualquer cessar-fogo. O chanceler alemão Olaf Scholz afirmou que a ideia "é um passo importante e correto em direção a uma paz justa para a Ucrânia" e que a decisão "agora cabe a Putin".