Vinte e dois meses depois do início da guerra entre Rússia e Ucrânia, o exército ucraniano admite dificuldades para encontrar novos recrutas para lutar contras as forças russas.
— Nossas unidades não têm pessoal suficiente. Precisamos de jovens, abaixo de 40 anos, e motivados — explica o major Oleksandre Volkov, comandante de um batalhão da 24ª brigada.
O oficial preferiu cancelar na manhã desta terça-feira (19) uma sessão de treinamento ao ar livre perto de Bakhmut para novos recrutas, devido ao frio. Serão ministradas apenas aulas sobre montagem e desmontagem de armas pessoais e primeiros socorros.
— A sociedade atual provavelmente foi enganada por alguns meios de comunicação, que afirmavam que está tudo bem (para o exército ucraniano), que vencemos o inimigo e a vitória ocorrerá em um futuro próximo. Mas a situação não é tão simples. O inimigo é muito forte e poderoso. Faremos todo o possível para contê-lo e vencê-lo — acrescenta o major.
Após o fracasso da contraofensiva ucraniana no sul, as tropas de Moscou retomaram a iniciativa e estão atacando vários setores, em especial o leste.
Com mais recursos humanos e munições, o exército russo avança lentamente no terreno — Kupiansk, Bakhmut, Avdiïvka, Marinka —, apesar das grandes baixas de homens e material.
Os ucranianos lutam para defender o local, após dois anos de combates exaustivos, e enfrentar calor de dois verões, a lama e a neve dos invernos e os bombardeios constantes sobre as trincheiras.
Alguns soldados, presentes desde o início em 24 de fevereiro de 2022, estão esgotados. Há dificuldades para substituir mortos e feridos, e os voluntários são raros.
Sai adrenalina, entra o medo
No início do conflito, "havia muita adrenalina, uma espécie de exaltação. Todos se apressaram para lutar, e não havia problema de efetivos", afirma o tenente Igor Prokopiak.
— Mas, com o tempo, as pessoas tiveram acesso às redes sociais e viram o lado terrível da guerra. A adrenalina inicial se dissipou, o cérebro entrou em alerta, o medo apareceu e, como resultado, as pessoas passaram a temer por suas vidas — declara o oficial de 32 anos.
Oleksandre Volkov constata que os civis não têm muito interesse em se unir às forças armadas e a idade média dos soldados no front está aumentando. O major afirma que, em sua unidade, 40% dos soldados têm 45 anos ou mais.
— Muitos jovens são vistos na vida civil. Não sei por que não foram mobilizados. É necessário que o Estado responda, que recrute, que substitua as pessoas que lutam há dois anos, eu inclusive — completa.
Há algumas semanas, as esposas dos soldados se manifestam também em Kiev para pedir o retorno de seus maridos do front de batalha, entre outras causas.
— Está na vez dos outros — gritam.
Em 1º de dezembro, o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, pediu ao comando militar que revisasse o sistema de recrutamento.
O major Volkov critica as oficinas de mobilização "soviéticas" demais, com uma abordagem, na qual "a qualidade é secundária".
— Se concentram apenas no resultado quantitativo — relata.
O sistema também se viu afetado pela corrupção, que permitiu aos recrutas se esquivarem do Exército, levando Zelensky a demitir todos os responsáveis regionais pelo recrutamento no verão passado.