No início de abril surgiram notícias do vazamento de documentos militares altamente sigilosos sobre a guerra da Ucrânia, levando o Pentágono a dar início ao controle de danos com força total, buscando apaziguar aliados e avaliar a extensão do vazamento.
As informações trouxeram a público possíveis vulnerabilidades nos recursos de defesa aérea da Ucrânia e expuseram avaliações privadas de aliados sobre uma série de questões de inteligência, despertando perguntas quanto à possibilidade de que o vazamento possa minar a confiança dos aliados em compartilhar informações com os Estados Unidos, ou impactar os planos da Ucrânia para intensificar a luta contra a Rússia nesta primavera.
De maneira geral, os documentos vazados representam um "risco muito grave para a segurança nacional", disse um importante porta-voz do Pentágono a repórteres na semana passada. Abaixo, confira o que se sabe sobre o vazamento:
O que são os documentos?
Os documentos sigilosos — que não foram autenticados individualmente por autoridades americanas — variam de slides de instruções mapeando posições militares ucranianas a avaliações de apoio internacional à Ucrânia e outros tópicos delicados, incluindo sob quais circunstâncias o presidente russo Vladimir Putin pode usar armas nucleares.
De onde vieram?
Investigadores federais americanos prenderam na última quinta-feira (13) Jack Teixeira, um oficial da Guarda Nacional de Massachusetts de 21 anos, que eles acreditam estar ligado ao vazamento em massa dos documentos secretos de inteligência.
O vazamento prejudicou as relações com aliados americanos e expuseram fraquezas nas forças armadas ucranianas. Teixeira supervisionava um grupo online chamado Thug Shaker Central, no qual cerca de 20 a 30 pessoas, a maioria jovens e adolescentes, se reuniam para compartilhar o amor por armas, memes racistas e videogames.
Na tarde da quinta-feira, agentes fortemente armados do FBI entraram na casa de Teixeira. O FBI disse em um comunicado que havia feito uma prisão e continuava a conduzir "atividades policiais autorizadas" em uma residência em North Dighton.
O que é Discord?
O Discord é uma plataforma de mídia social popular entre as pessoas que jogam online. O site hospeda chats de voz, vídeo e texto em tempo real para grupos e se descreve como um lugar "onde você pode fazer parte de um clube escolar, um grupo de jogadores ou uma comunidade artística mundial".
Em um desses fóruns, originalmente criado para tratar de assuntos diversos, os membros debatiam a guerra na Ucrânia. De acordo com um dos integrantes do chat, um usuário não identificado compartilhou documentos que alegou serem sigilosos, primeiro transcrevendo-os, juntamente com opiniões do próprio usuário e, depois, enviando imagens de papéis dobrados. A partir daí, eles parecem ter se espalhado até serem captados pela mídia.
O que foi revelado?
Os vazamentos revelaram o quanto os Estados Unidos monitoram de perto como seus aliados interagem com Rússia e China. Autoridades de diversos países negaram ou rejeitaram as alegações dos documentos vazados.
A Associated Press noticiou que a inteligência dos Estados Unidos captou alegações de agentes russos de que eles estariam construindo um relacionamento mais próximo com os Emirados Árabes Unidos, país do Oriente Médio rico em petróleo, que abriga importantes instalações militares americanas. Os Emirados Árabes Unidos rejeitaram as alegações, chamando-as de "categoricamente falsas".
O jornal The Washington Post informou na segunda-feira (10) que o presidente do Egito teria determinado aos subordinados que se preparassem secretamente para enviar até 40 mil foguetes para a Rússia durante a guerra contra a Ucrânia. Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Egito disse que o país mantém "o não envolvimento nesta crise e se compromete a manter distância igual de ambos os lados".
Outros vazamentos dizem respeito a alegações de que os líderes sul-coreanos estariam hesitantes em enviar projéteis de artilharia para a Ucrânia e que o serviço de espionagem Mossad de Israel se oporia à proposta de reforma do judiciário do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
Com orçamento anual de US$ 90 bilhões (R$ 445 bilhões), as agências de inteligência dos Estados Unidos têm amplos poderes para interceptar comunicações eletrônicas, espionar e monitorar por satélites. Os resultados desses poderes raramente são expostos publicamente, mesmo de forma limitada.
A resposta dos Estados Unidos
O Pentágono iniciou auditoria interna para avaliar o impacto do vazamento na segurança nacional. A auditoria está sendo coordenada por Milancy D. Harris, vice-subsecretária de Defesa para inteligência e segurança, segundo informou uma autoridade de defesa em comunicado à Associated Press. Essa autoridade também afirmou que a equipe inclui representantes dos órgão de assuntos legislativos, assuntos públicos, políticas, assessoria jurídica e a equipe conjunta.
O Pentágono também está tomando medidas para reduzir rapidamente o número de pessoas que têm acesso aos briefings do governo, disse outro funcionário da Defesa. Ambos os funcionários falaram sob condição de anonimato para discutir assuntos delicados. Autoridades do Pentágono também estão monitorando de perto onde os slides vazados estão "sendo publicados e amplificados", disse Chris Meagher, assistente do secretário de Defesa para relações públicas.
Paralelamente, o Departamento de Justiça abriu investigação criminal para descobrir como os slides foram obtidos e vazados. Na última terça-feira (11), o diretor da CIA, William Burns, chamou o vazamento de "profundamente lamentável".
— É algo que o governo dos Estados Unidos leva muito a sério. O Pentágono e o Departamento de Justiça deram início a uma investigação intensa para chegar até o fundo da questão — comentou, em uma fala na Universidade Rice.
Qual o impacto da revelação?
Líderes militares de alto escalão têm entrado em contato com aliados para lidar com as consequências. Isso inclui ligações "de alto nível para tranquilizá-los de nosso compromisso com a proteção da inteligência e a lealdade às nossas parcerias de segurança. Essas conversas tiveram início no fim de semana, e continuam acontecendo", afirma Chris Meagher.
É provável que as autoridades americanas enfrentem mais questionamentos quando viajarem para a Alemanha na semana que vem para a próxima reunião do grupo de aliados, onde representantes de mais de 50 países se reúnem para coordenar armas e auxílio para a Ucrânia.
Contudo, não se espera que o vazamento dos documentos afete a reunião ou a disposição dos aliados em continuar a fornecer assistência militar à Ucrânia, disse um alto funcionário de defesa dos Estados Unidos à Associated Press, falando sob condição de anonimato para discutir assuntos delicados.
— Acho que muitos dos aliados provavelmente ficarão mais curiosos sobre os motivos para isso ter ocorrido — disse Chris Skaluba, diretor da iniciativa de segurança transatlântica da organização Atlantic Council.
Considerando, em primeiro lugar, o alto nível de autorização de segurança necessário para acessar as informações, o vazamento enseja perguntas sobre quem "teria tanto interesse nessa divulgação" e a possibilidade de intenção em minar o apoio à Ucrânia, acrescenta Skaluba.