A Argélia convocou neste sábado (19) seu embaixador em Madri para mostrar seu descontentamento com a "virada brusca" da Espanha no apoio ao plano de autonomia de Marrocos para o Saara Ocidental, região onde Argel apoia os independentistas saharauis.
A Espanha, ex-potência colonial nessa região, sempre defendeu a neutralidade entre Rabat e os separatistas da Frente Polisário. Mas na sexta-feira anunciou sua mudança de posição, assumindo o risco de desagradar a Argélia, país do qual depende muito para seu abastecimento de gás natural.
"As autoridades argelinas, surpreendidas por essa abrupta mudança de postura da antiga potência administrativa do Saara Ocidental, decidiram chamar o seu embaixador em Madri para consultas com efeitos imediatos", indicou um comunicado do Ministério das Relações Exteriores da Argélia.
O ministro espanhol de Relações Exteriores, José Manuel Albares, garantiu na sexta-feira em Barcelona que a Espanha "considera a iniciativa de autonomia apresentada em 2007" por Marrocos como "a base mais séria, realista e plausível para resolver esta disputa" entre Rabat e a Polisario.
As autoridades marroquinas foram rápidas em expressar sua satisfação com os "compromissos construtivos" da Espanha, abrindo caminho para um degelo nas relações bilaterais.
A crise diplomática entre Marrocos e Espanha começou em abril de 2021, quando Madri permitiu a entrada do líder da Frente Polisário, Brahim Ghali, inimigo jurado de Rabat, na península para ser hospitalizado por covid-19.
O resultado foi a chegada em massa em maio de 2021 de migrantes ao enclave espanhol de Ceuta, no norte do Marrocos, depois que o governo marroquino relaxou a vigilância nas fronteiras.
No âmbito da normalização das relações bilaterais, a Espanha anunciou na sexta-feira a visita a Marrocos do presidente de governo, Pedro Sánchez, em data a ser definida. E Albares viajará para Rabat "antes do final do mês".
Segundo Bernabé López, professor de estudos árabes e islâmicos da Universidade Autônoma de Madri, o principal objetivo do reposicionamento do governo espanhol sobre o Saara é obter do Marrocos uma gestão dos fluxos migratórios.
O Saara Ocidental é considerado pela ONU como um "território não autônomo". É o único território africano cujo status pós-colonial permanece em suspenso.
Marrocos, que controla cerca de 80% deste território rico em recursos minerais e com abundantes águas pesqueiras, propõe um plano de autonomia sob sua soberania.
A Frente Polisário reivindica um referendo de autodeterminação organizado pela ONU, previsto no cessar-fogo de 1991, mas que nunca se concretizou.
Os separatistas saharauis receberam a notícia "com grande surpresa", segundo um comunicado divulgado neste sábado.
Eles consideram que "a posição expressa pelo governo espanhol contradiz totalmente a legitimidade internacional" e exortam as forças políticas espanholas a "pressionar o governo para que corrija este grave erro".
* AFP