Nas ruas de Kunduz, no nordeste do Afeganistão, os talibãs patrulham sorridentes, enquanto os civis, que temem por suas vidas, fogem da cidade.
Um combatente barbudo, com arma no ombro e uniforme camuflado, sorri de orelha a orelha, trocando um aperto de mão amigável com alguém em um carro.
Animados pela retirada das forças estrangeiras, que terão deixado o Afeganistão definitivamente no final deste mês após 20 anos de presença, os talibãs aumentaram seu controle sobre vastos territórios no norte do país.
No domingo (8), tomaram Kunduz, a grande cidade no nordeste do Afeganistão, e, nos últimos dias, outras oito capitais provinciais, como parte de uma ofensiva relâmpago lançada desde maio e que se acelerou.
Nesta quarta-feira (11), os insurgentes saíram às ruas de Kunduz montados em suas motocicletas, ou veículos off-road - apreendidos do Exército afegão -, enquanto posavam para fotos.
Enquanto isso, no aeroporto, centenas de membros das forças de segurança que haviam-se barricado ali após a queda da cidade, viram-se cercados e decidiram se render.
Os civis que conseguiram fugir de Kunduz nos últimos dias relatam represálias contra funcionários do governo, execuções sumárias, decapitações e sequestro de meninas para casá-las à força com combatentes.
"Vimos cadáveres no chão perto da prisão (...) Havia cães ao lado deles", contou Friba, de 36 anos, uma viúva que deixou Kunduz no domingo com seus seis filhos.
Como muitas outras pessoas que ousaram falar à AFP, ela pediu para não ser totalmente identificada por medo de represálias.
- Cicatrizes dos combates -
Abdulmanan, outro deslocado de Kunduz, disse à AFP que os talibãs decapitaram um de seus filhos. Eles agarraram-no "como uma ovelha, cortaram sua cabeça com uma faca e jogaram fora".
Essas alegações não puderam ser verificadas com fontes independentes pela AFP.
Os talibãs negam, por sua vez, terem cometido atrocidades nos territórios agora sob seu controle.
Quando chegaram ao poder, entre 1996 e 2001, impuseram uma versão ultraortodoxa da lei islâmica (Sharia).
As mulheres eram proibidas de sair de casa sem acompanhante masculino, não podiam trabalhar, nem ir à escola. As acusadas de crimes, como adultério, eram açoitadas e apedrejadas até a morte.
Em Kunduz, as cicatrizes dos combates continuam visíveis nas paredes. A cidade já esteve duas vezes em mãos talibãs: por duas semanas, em 2015, e por apenas um dia, em 2016.
Apesar de tudo, a vida gradualmente retoma seu ritmo normal. Motoristas de triciclos aguardam passageiros perto de um prédio desabado após uma explosão, motoristas de táxi buzinam, e ciclistas passam pela grande praça central, na qual uma bandeira dos talibãs foi hasteada.
Os habitantes dizem, no entanto, temer pelo que os espera sob o regime insurgente.
"As pessoas abrem suas lojas. Mas ainda dá para ver o medo em seus olhos (...) os combates podem recomeçar na cidade a qualquer momento", disse o comerciante Habibullah.
* AFP