O ex-presidente da Bolívia Evo Morales disse nesta quarta-feira que a Organização dos Estados Americanos (OEA) aderiu ao "golpe de Estado" que o forçou a deixar o mandato. Em entrevista à W Radio Colombia, da Cidade do México, onde se asilou na terça-feira (12), Morales descreveu a Organização dos Estados Americanos (OEA) como "neogolpista", depois que denunciou sérias irregularidades nas eleições de 20 de outubro que desencadearam a crise boliviana.
— Infelizmente, a OEA aderiu a esse golpe de Estado. Eu recomendo aos novos políticos da América Latina: cuidado com a OEA. A OEA é neogolpista para mim — afirmou o líder da esquerda.
A fala do ex-presidente ocorre um dia após o secretário-geral da OEA afirmar que a situação ocorrida na Bolívia tratou-se de um "autogolpe".
— Houve um golpe de Estado na Bolívia. Ocorreu no dia 20 de outubro, quando se cometeu fraude eleitoral, que tinha como resultado a vitória do ex-presidente Evo Morales em primeiro turno. O tribunal eleitoral, ao anunciar a vitória em primeiro turno, pretendia perpetuá-lo no poder de forma ilegítima e inconstitucional. Era se manter no poder de uma das piores formas, roubando uma eleição. Quem está a favor dessa forma de autogolpe? Isso, sim, é voltar às piores épocas do Hemisfério. Isso, sim, é absolutamente condenável e inadmissível. A vergonha não é da OEA, que descobriu uma fraude eleitoral, é daqueles que o cometeram — disse Luis Almagro na terça, durante reunião do Conselho Permanente.
Vácuo de poder
No domingo (11), Evo Morales renunciou à presidência que ocupava desde 2006, depois de perder o apoio das forças armadas e da polícia. Ele havia convocado novas eleições presidenciais após a denúncia da OEA de haver graves irregularidades no processo eleitoral que o reelegeu como presidente. A medida, contudo, não conseguiu aplacar a ira da oposição.
Após a renúncia, o país mergulhou em um vácuo de poder. Pela Constituição boliviana, a sucessão passa primeiro para o vice-presidente da República, depois para o presidente do Senado e então ao presidente da Câmara dos Deputados. Contudo, todos eles renunciaram com Morales. A segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Añez, reivindicou no domingo (10) o direito de assumir o cargo de mandatária do país, sendo oficialmente empossada na terça-feira.
Morales questionou a proclamação da senadora como presidente interina na Bolívia, insistindo que a saída da crise deve ser constitucional.
— A única saída é respeitar nossa Constituição, recuperar a democracia; a única saída é respeitar o povo e principalmente os movimentos sociais — acrescentou.
Nesse sentido, ele pediu às forças de segurança que não "disparem uma bala".
— Equipei as forças armadas não contra o povo, não para que sejam contra o povo, mas para que defendam a pátria. Lamento muito que as forças armadas estejam agora do lado de um golpe de Estado — afirmou.
Informe da OEA
No epicentro da crise boliviana está o relatório produzido pela OEA. O informe da Organização diz que nos quatro elementos analisados — tecnologia, armazenamento, integridade dos registros e projeções estatísticas —, foram encontradas irregularidades, variando de muito graves a indicativas.
"A razão pela qual um estudo tão aprofundado foi realizado foi precisamente cruzar informações e garantir que as irregularidades encontradas não fossem superficiais e que a equipe de auditoria pudesse ter plena certeza de suas conclusões. No componente informático, sérias falhas de segurança foram descobertas", diz o documento.
A OEA diz ainda que foi descoberta uma manipulação do sistema de transmissão de resultados preliminares (Trep), que afetou os resultados de aproximadamente 350 mil votos. Como a margem de vitória no primeiro turno foi inferior a 40 mil votos, uma irregularidade dessas dimensões seria decisiva para o resultado.
"A existência de registros físicos com alterações e assinaturas falsificadas também afeta a integridade do cálculo oficial. Levando em consideração as projeções estatísticas, é provável que o candidato Morales esteja em primeiro lugar e o candidato Mesa em segundo. No entanto, é estatisticamente improvável que Morales tenha obtido uma diferença de 10% para evitar um segundo turno. A equipe de auditoria não pode validar os resultados dessa eleição; portanto, outro processo eleitoral foi recomendado. Observou-se também que qualquer processo futuro deve ter novas autoridades eleitorais para realizar eleições confiáveis", diz o informe da OEA, acrescentando que foram recebidas mais de 250 denúncias sobre o processo eleitoral.