Há vinte e sete anos, Bob Breen e Clare Graham começaram a morar juntos em um chalé pitoresco no bairro de Los Feliz, que mobiliaram com todo o capricho com peças garimpadas em brechós e peças vintage obtidas em encontros de troca em Southern California. No mesmo ano, 1986, eles também compraram um supermercado antigo em um bairro modesto dividido por vias expressas.
Não parece, mas os dois eventos estão relacionados, pois grande parte da vida em comum do casal desde então está relacionada com o risco imobiliário que assumiram.
Seis anos antes, Breen, que na época era cenógrafa de sitcoms como "The Jeffersons", tinha comprado a casinha que pertencera a Erle Kenton, um diretor das antigas de Hollywood, e sua mulher, que a manteve impecavelmente preservada. Havia um abacateiro imenso no quintal e a lareira de tijolos, as portas francesas e as paredes de madeira de pinho caiadas eram todas originais.
Todo fim de semana Breen e Graham iam à feirinha de Rose Bowl em busca de cerâmica Pacífico, vasos decorados Bauer, móveis Stickley e outras relíquias.
Apesar do capricho, Graham, que durante décadas foi diretor de arte da Disneylândia, não se desfez de seu apartamento em Long Beach - não porque não quisesse morar com Breen, mas porque simplesmente não havia espaço.
- A Clare tinha muita coisa - , conta Breen, de 62 anos, referindo-se não só aos achados nas feirinhas como ao material com que ela fazia suas esculturas - tampinhas de garrafa, peças do jogo de Scrabble e outras tranqueiras. - Tivemos que tomar várias decisões em relação ao espaço -
À procura de um estúdio para ela, o casal se deparou com uma estrutura de concreto construída originalmente em Highland Park para ser um Safeway e que, mais tarde, virou ringue de patinação. O bairro ainda estava a anos-luz da gentrificação e, com cara de bunker, o imóvel precisava de uma reforma urgente -, mas tinha um pé-direito de 8,5 m e um espaço de trabalho imenso. Jovens e entusiasmados, os dois se arriscaram.
- Há uma teoria que diz que o peixe dourado come o máximo que puder de acordo com o tamanho do aquário. Obviamente, a escala muda a dinâmica do projeto drasticamente e a minha arte se adequa ao espaço - , diz ela.
O prédio também acabou com o problema de armazenamento do casal, que passou a morar junto e a investir na coleção Breen-Graham - afinal, agora tinha uma van e 650 metros quadrados de espaço; podia comprar praticamente tudo o que chamasse a atenção, independente do tamanho. E, durante anos, foi o que fez.
Galen Lowe, antiquário de Seattle que ficou amigo dos dois e os acompanhava nas excursões de compras, conta como foi a primeira visita à Galeria MorYork, nome que o prédio ganhou inspirado na avenida em que se situa.
- Já estive em muitos lugares e vi muita coisa, mas naquele momento, meu queixo caiu - , relembra.
E acrescenta: - Eles se interessam por objetos que mostram a passagem do tempo, suas marcas. Coisas que acabaram se transformando em arte. É um tipo de depósito curiosíssimo -
A princípio, quem chega à MorYork não sabe nem para onde olhar: a fileira de gabinetes de teca indonésia com peças de cerâmica chinesas? A bandeja de próteses oculares? A coleção de bonecas do início do século XX? Os tanques de combustível de um avião da Segunda Guerra Mundial pendurados nas vigas do teto? A máquina de Dr. Pepper que o casal adquiriu em Rose Bowl, toda enferrujada e cheia de buracos, uma carcaça estranhamente bela que retrata os EUA moderno?
No meio de tantas excentricidades e antiguidades estão as obras de arte de Graham: arranha-céus feitos de peças de Scrabble; persianas criadas a partir de fitas métricas antigas e tampinhas de refrigerante amassadas; um gabinete de encaixe em moldura de madeira que tem um efeito incrível.
Embora a MorYork não siga o horário comercial oficial, funciona mais ou menos como loja e galeria para os curiosos e ponto de encontro do casal com os amigos. Houve um tempo em que Breen e Graham chegaram a receber artistas e músicos como parte dos passeios artísticos ao bairro.
A casa deles, por outro lado, é um espaço mais reservado em um quarteirão sossegado, perto do Parque Griffith - e uma versão "editada" da galeria.
- O material que a gente coleciona é resultado da inspiração de milhares de visitas a brechós e encontros de trocas, da epifania estética pela qual passamos nesses lugares -
Os itens antigos são vendidos ou trocados para que outros, novos, possam ser adquiridos nas eternas feirinhas. A compra do prédio permitiu que ambos mantivessem o hábito de colecionar.
- Nossa coleção aumenta e diminui como as marés - , filosofa Breen.
E acrescenta, referindo-se aos achados, mas talvez também à MorYork: - E, de repente, somos assolados por uma onda gigantesca -