O historiador e cientista político argentino Rosendo Fraga, diretor do Centro de Estudos União para a Nova Maioria e um dos principais estudiosos do seu país, analisou, em entrevista por telefone para Zero Hora, a Batalha de Ezeiza e seus reflexos na atualidade. Leia trechos:
Zero Hora - O que estava por trás do enfrentamento?
Rosendo Fraga - Ambos setores se enfrentaram pelo controle do palanque desde onde iria falar o líder do peronismo. Eclodiu uma luta surda que vinha se desenvolvendo dentro desse movimento político e que Perón vinha postergando com habilidade. Foi o início da ruptura entre Perón e a esquerda do seu movimento, liderada pelos grupos juvenis.
ZH - O massacre se reflete nas divisões do atual peronismo?
Fraga - Marx disse que a história se repete, primeiro como tragédia e depois como farsa. Há certa semelhança entre o que ocorre hoje no peronismo e o que teve lugar quatro décadas atrás. A esquerda do movimento, que responde à presidente Cristina Kirchner, impulsiona um modelo chavista que se enfrenta com o peronismo tradicional, representado por dirigentes sindicais como Hugo Moyano. Eles têm posição ideológica diferente e se articulam no peronismo dissidente. O simbólico também tem participação. A agrupação que melhor expressa Cristina se chama La Cámpora, que toma o nome do presidente de centro-esquerda que Perón substitui depois do massacre. O grupo do governador de Buenos Aires, Daniel Scioli, denomina-se La Juan Domingo, em homenagem a Perón.
ZH - Esse legado afeta o país?
Fraga - A política argentina tem fortes dificuldades para consensos. Há uma cultura do dissenso, que nos anos 1960 era representada por peronismo e antiperonismo, nos 1970 pelo conflito violento entre esquerda e direita do peronismo e, agora, pelo enfrentamento entre o kirchnerismo e o antikirchnerismo.