
Após mais de um ano de buscas em terra e por cursos d'água, desde que a pior enchente já registrada castigou o Rio Grande do Sul, famílias de 25 pessoas ainda aguardam por notícias de parentes que sumiram em meio à inundação e aos deslizamentos de solo. Entre os desaparecidos, 64% viviam no Vale do Taquari — uma das regiões atingidas com mais violência pela enxurrada — e 60% são do sexo masculino.
Na quinta-feira (24) da semana passada, a lista de sumidos foi atualizada depois de um morador de Canoas ter sido localizado pelas autoridades. Ele estaria refugiado em um abrigo municipal e teria sido identificado depois de registrar uma ocorrência em uma delegacia da Polícia Civil. Por fim, a comunicação de que estava vivo foi encaminhada à Defesa Civil, que retirou seu nome da listagem.
Há diferentes formas de atualizar a estatística oficial de desaparecidos da cheia. O Corpo de Bombeiros segue fazendo buscas por corpos de vítimas. Segundo a assessoria de imprensa da corporação, equipes são mobilizadas "quando há alguma evidência de material biológico resultante de odores específicos, encontrados por cães farejadores, tendo em vista uma área vasta onde as vítimas foram vistas por último".
Além disso, a Polícia Civil mantém abertas as investigações sobre todos os 25 sumidos remanescentes — 15 homens e 10 mulheres.
Esse trabalho envolve busca ativa, por meio de contato com familiares e conhecidos, e cruzamento de informações como verificação de imagens de vídeo, monitoramento de redes sociais e eventuais contatos da pessoa procurada com serviços públicos. Também são apuradas pistas repassadas pela população.
Só vamos encerrar essas investigações quando todos forem encontrados. Essas pessoas não podem ser esquecidas.
MARIO SOUZA
Diretor do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa
À espera de respostas definitivas
O produtor rural Nivaldino Brino, 60 anos, é sobrinho de um casal visto pela última vez pouco antes de um deslizamento de terra destruir a propriedade da família no município de Roca Sales, no Vale do Taquari.
Desde então, Elírio e Érica Brino, ambos de 78 anos, não foram mais encontrados. Outros quatro parentes foram localizados já sem vida.
O que resta é localizar os dois e, pelo menos, sepultar os restos mortais. Mas sei que é muito difícil encontrar, infelizmente.
NIVALDINO BRINO
Produtor rural, sobrinho do casal desaparecido Elírio e Érica Brino, de Roca Sales
Ele estava junto dos tios no dia 30 de maio, quando ocorreu a tragédia, mas havia se afastado para tentar desobstruir um bueiro próximo quando o solo se desmanchou. Ele se mudou para outra casa, mas, quando chove, por conta do trauma busca abrigo na casa de um filho em uma parte alta da cidade de Muçum.
"De repente..."
Já o motorista Paulo Everton Fiel, 45 anos, mantém uma ínfima esperança de encontrar ainda viva sua mãe, Diana Alves Meirelles, 69 anos. Ela foi arrastada pela água no bairro de Passo de Estrela, em Cruzeiro do Sul, um dos locais mais atingidos pela enxurrada em todo o Estado.
Fiel conta que a mãe vivia em companhia de um caseiro e se recusou a buscar abrigo em outro lugar porque não queria abandonar os sete cães e os dois gatos de estimação.
— Enquanto a água ainda estava subindo, liguei para ela e pedi para sair de lá. Ela disse não acreditar que fosse acontecer alguma coisa, e que não queria deixar os bichos para trás — relembra o filho.

O motorista só teve condições psicológicas de voltar ao terreno onde ela morava um mês e meio depois da catástrofe. Só conseguiu reconhecer o ponto exato em que ficava a casa da mãe por conta de uma árvore que resistiu à força da água, já que restou apenas parte do alicerce da antiga moradia. Agora, espera que as autoridades coloquem fim à dúvida que lhe acompanha há um ano e enfim informem o paradeiro de Diana.
A gente tem 99% de certeza de que ela faleceu, mas sempre fica aquele 1% de chance de estar viva, de repente em algum abrigo, sem documento ou memória.
PAULO EVERTON FIEL
Motorista que procura pela mãe, Diana Alves Meirelles, de Cruzeiro do Sul
O Vale do Taquari concentra 16 dos 25 sumidos. Outros cinco são da Serra, três de municípios metropolitanos e um da Região Central.
Veja a lista completa de desaparecidos da cheia
- Agudo (1): William da Silva Ramos
- Bento Gonçalves (4): Carine Milani, Isabel Velere Antonello Gallon, Lourdes Helena Lazarini e Nelsa Faccin Gallon
- Canoas (1): Adriano Sandaowski
- Caxias do Sul (1): Doceliria Lourenço da Silva
- Cruzeiro do Sul (5): Adriana Maria da Silva, Diana Alves Meirelles, Fabricio Adriano Wendt, Jorge Lauri Rodrigues e Valdelirio Farias do Amaral
- Encantado (2): Bernadete Marques da Silva e César Gilmar das Chagas
- Estrela (1): Andre Dutra
- Lajeado (3): João Luiz Maurante, Gladis Elisabeth da Silva e Alexânder Júnior da Silva
- Marques de Souza (1): Clair Teresinha Bergmann
- Poço das Antas (1): Vanderlei da Rosa
- Porto Alegre (1): Diulnei Silva Corrêa
- Relvado (1): Leandro da Rocha
- Roca Sales (2): Elirio Brino e Erica Brino
- São Leopoldo (1): Carlos Eduardo Lassakoski dos Santos
Fonte: Defesa Civil