
As dores de um trabalho de parto em meio à escuridão, à dificuldades de comunicação e ao cerco das águas do Rio Botucaraí foi substituída por um sentimento de alívio na casa da operadora de caixa Gisele Beatriz Golke, 35 anos. Uma das vítimas da enchente que castigou o Vale do Rio Pardo no final de abril de 2024, Gisele estava grávida de 39 semanas quando a chuvarada que viria a se tornar na maior tragédia climática no RS começava a mostrar toda a sua ferocidade.
Um ano depois da enchente, Zero Hora revisita histórias de moradores do Vale do Rio Pardo. Segundo a Defesa Civil estadual, 14 municípios da região decretaram estado de calamidade em razão da enchente de 2024, entre eles Candelária, onde mora Gisele. Outros nove decretaram situação de emergência.
Gisele fica emocionada ao recordar a operação de resgate, que durou quatro horas e foi acompanhada por Zero Hora no dia 2 maio, na região de Linha Palmital. O socorro ocorreu graças a um vizinho, o único que ainda contava com um fraco sinal de celular, e que levou a mensagem de pedido de ajuda, no dia seguinte, aos bombeiros voluntários de Candelária.
Após aquelas 12 de horas de dores de trabalho de parto e de um ano da tragédia climática, a família se prepara para uma festa. O marido de Gisele, Márcio, os pais dela Delmar e Veleta Schultz, e o filho Murilo, de 11 anos, organizam o aniversário de um ano da pequena Maitê.
— É uma gratidão e agradeço a Deus por ter os dois filhos com saúde. Passamos por momentos difíceis, mas o sentimento é de gratidão a Deus e a todas as pessoas envolvidas no socorro — diz Gisele.
Enchente em Candelária
Com um uma área territorial quase duas vezes maior que a de Porto Alegre, Candelária foi um dos primeiros municípios a registrar estragos em rodovias e a viver a ameaça de isolamento em razão de quedas de pontes e destruição de estradas vicinais. Na sua extensa área rural, famílias começavam a ficar incomunicáveis devido ao transbordamento dos rios Pardo, Pardinho - além do Botucaraí.
— Ficamos angustiados pois a água não parava de subir. Ficamos sem luz às 5h do dia 30 de abril — relembra Gisele Golke.
A região da Linha Palmital reúne cerca de 8o famílias que, na sua maioria, trabalha com agricultura, pecuária e na lavoura de fumo. Em todo o município de Candelária, a prefeitura registrou aproximadamente mil pessoas afetadas pela enchente, que ficaram desalojadas ou desabrigadas. Um ano depois, cerca de 200 pessoas ainda não conseguiram voltar para casa.