
A 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves condenou a empresa terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio e Gestão de Saúde Ltda. e os seus proprietários ao pagamento de R$ 3 milhões em danos morais por terem mantido 210 pessoas em situação análoga à escravidão no município.
As informações foram divulgadas nesta terça-feira (29) pelo Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT/RS), responsável pela Ação Civil Coletiva. A decisão é assinada pelo juiz do Trabalho Silvionei do Carmo. O valor da indenização será revertido aos trabalhadores resgatados. A decisão ainda pode ser alvo de recurso.
O esquema de trabalho escravo na produção vinícola da Serra foi descoberto em fevereiro de 2023. Os trabalhadores eram contratados e transportados pela Fênix Serviços Administrativos para atuarem em vinícolas da região, em especial na colheita da uva.
A reportagem tenta contato com a defesa da empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio e Gestão de Saúde Ltda para obter contraponto.
Ainda conforme o MPT/RS, a indenização anunciada nesta terça-feira se soma a outros R$ 2 milhões já pagos aos trabalhadores pelas três vinícolas contratantes — após ser firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), ainda em março de 2023. Conforme o órgão, o mesmo TAC gerou o pagamento de R$ 5 milhões em danos morais coletivos, revertidos a projetos sociais da Bahia e da serra gaúcha.
Relembre o caso
A situação dos trabalhadores em situação análoga à escravidão foi denunciada após seis homens conseguirem fugir do local onde eram mantidos e buscar contato com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), que prestou auxílio e deu início à operação. Um dos denunciantes já havia gravado um vídeo com um celular e publicado em uma rede social reclamando das condições de trabalho. Ele relatou que foi agredido pelos supostos empregadores por isso.
O homem contou à polícia que aproveitou quando os agressores foram atender a uma ligação e pulou de uma janela, correndo até um mato próximo do local onde estava. Ele e mais dois trabalhadores que estavam com ele aguardaram até as 3h de 23 de fevereiro de 2023 para sair e pedir ajuda.
No mesmo dia, uma operação conjunta entre PRF, Polícia Federal (PF) e Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagrou 180 homens no alojamento, em situação precária de hospedagem, higiene e alimentação. À equipe, trabalhadores relataram que sofriam violência verbal, física, ameaças de morte e eram alimentados com comida estragada. Após o primeiro flagrante, outros 27 homens foram resgatados, no dia seguinte, e encaminhados ao ginásio.
O aliciador da mão de obra e administrador da empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio à Gestão de Saúde Ltda, Pedro Augusto Oliveira de Santana, chegou a ser preso, mas foi liberado no dia seguinte, após pagar fiança de R$ 39.060. Natural de Valente (BA), o empresário investigado estaria trabalhando na região havia pelo menos 10 anos, conforme o MTE.
Os homens resgatados atuavam principalmente na colheita da uva, em propriedades rurais do município. As três vinícolas — Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton —, citadas pelos trabalhadores e que contrataram o serviço terceirizado da prestadora, afirmaram não ter conhecimento da situação em que os homens eram expostos até a operação e que iriam colaborar com a investigação.
Além de vinícolas, 23 proprietários rurais contratavam serviços de trabalhadores resgatados em Bento. A investigação ainda aponta que os trabalhadores atuavam na carga e descarga da uva em vinícolas e na colheita da uva nas propriedades rurais.