O começo de semana ensolarado em Roca Sales, no Vale do Taquari, após mais uma enchente encharcar imóveis, derrubar árvores e revirar o solo que ainda recebia reparos desde setembro, colocou os moradores da cidade para pensar enquanto arrumavam a bagunça causada pelo Rio Taquari. Em uma mesma rua, é possível encontrar quem está decidido a desistir de ter um negócio na cidade e quem retornou ao município após a cheia de setembro e não pretende mais sair.
Na rua José Brock, poucos metros separam imóveis que foram impactados de diferentes maneiras pelas enchentes. Adelar dos Santos, 44 anos, perdeu o pai Laurentino dos Santos, 77, dias depois da inundação de setembro. O bar da família foi destruído pela água e os dois andares da casa onde ele vivia com a mãe Celita dos Santos, 71, foram cobertos pelo rio. Em um primeiro momento a solução foi migrar para Encantado, onde ele trabalha na Brigada Militar. Mas, depois, viu que o laço sentimental apertava mais forte quando a mãe se via longe da casa onde passara os últimos 48 anos.
Adelar se encheu de otimismo, efetuou melhorias na residência e voltou para Roca Sales. Na manhã desta terça-feira (21) ele se protegia do sol de 30 graus embaixo de um chapéu de palha para juntar, com uma pá, a areia que comprou para seguir reformando a morada para trazer conforto onde a mãe quer viver. A cheia do último sábado (18) arrastou até os tijolos pela rua e fez ele sair nadando do segundo andar do imóvel.
— O tempo que ela (mãe) tiver de vida, vou me esforçar pra manter essa casa pra ela. Eu teria condições de me estabelecer em outro lugar, mas as memórias estão aqui — diz.
Alguns metros acima na mesma rua, Aliceu Isotton, 42, usava uma mangueira pressurizada para limpar bandejas de metal em frente ao Mercado Roca Sales. Ele veio de Anta Gorda há nove anos empreender com a garantia de que a água do rio nunca tinha alcançado a porta do estabelecimento. Nos últimos três anos, conta, já foram três episódios de perda total dos produtos e equipamentos que ele tinha. As bandejas tinham 2 mil quilos de carne, que foram perdidos para o rio.
— O problema não é tanto a mercadoria, conseguimos um caminhão para guardar um pouco delas. Prejuízo maior é os equipamentos — detalha, listando um balcão de padaria, dois de açougue, quatro freezers e a câmara fria.
— De limpeza vai mais uma semana, não foi tanta água quanto a outra (enchente, de setembro). Mas não sei se vamos abrir de novo — desabafa.
Aliceu foi o quinto entrevistado por GZH em dois dias e duas cidades que acreditou e alertou para o boato que corre na localidade mais afetada do Vale do Taquari: haverá uma próxima enchente em dezembro. Ainda que a meteorologia diga que o El Niño seguirá ativo com chuvas e temperaturas extremas, é impreciso prever quão rápido o volume do rio subirá. Mais iminente são os alertas do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) para a volta dos temporais para a região sul ainda esta semana, com previsões que variam dos 50 aos 100 milímetros por dia.