Em nova reviravolta jurídica, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou na tarde desta terça-feira (14) o habeas corpus que mantinha fora da prisão os quatro réus condenados no julgamento da Boate Kiss. Concedida enquanto o juiz Orlando Faccini Neto ainda lia em plenário a sentença condenatória, na última sexta-feira (10), a liminar que permitiu a Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Marcelo dos Santos e Luciano Bonilha Leão recorrerem em liberdade foi cassada pelo presidente do STF, ministro Luiz Fux.
Os mandados de prisão foram expedidos e dois dos condenados já estão detidos. Santos se apresentou às autoridades penitenciárias em São Vicente do Sul, enquanto Spohr se dirigiu ao Cartório do 2º Juizado da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre. Spohr foi sentenciado a 22 anos e seis meses de prisão, Hoffmann a 19 anos e seis meses, enquanto Santos e Leão receberam pena de 18 anos.
Como havia sido uma decisão monocrática do desembargador Manuel José Martinez Lucas, da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça (TJ-RS), o mérito do hábeas estava previsto para ser julgado na próxima quinta-feira (16). Todavia, numa estratégia para ganhar tempo, o Ministério Público decidiu recorrer direto ao STF. O autor do recurso foi o procurador Fabiano Dallazen, ex-procurador-geral de Justiça do Estado. A velocidade com que o pedido de suspensão da liminar foi julgada surpreendeu o universo jurídico gaúcho.
Na decisão, Fux argumenta que "uma vez atestada a responsabilidade penal dos réus pelo Tribunal do Júri, deve prevalecer a soberania de seu veredito". Em sete páginas, o ministro cita jurisprudência da Corte e "a altíssima reprovabilidade social das condutas dos réus, a dimensão e a extensão dos fatos criminosos, bem como seus impactos para as comunidades local, nacional e internacional, a decisão impugnada do Tribunal de Justiça do Rio Grande Sul causa grave lesão à ordem pública". Ao final, Fux sustenta ainda que "ao impedir a imediata execução da pena imposta pelo Tribunal do Juri, ao arrepio da lei e da jurisprudência, a decisão impugnada abala a confiança da população na credibilidade das instituições públicas, bem como o necessário senso coletivo de cumprimento da lei e de ordenação social".
Autor do pedido de habeas corpus que imediatamente foi estendido aos demais réus, o advogado de Spohr, Jader Marques, contestou a decisão de Fux. Em nota distribuída à imprensa, Jader sustenta que o processo deve ser anulado. O advogado afirma ainda acreditar que o hábeas será mantido no julgamento de quinta-feira no TJ.
Decisão de Fux sobre caso Kiss é vitória da estratégia do Ministério Público
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"O processo da boate Kiss é totalmente nulo por ilegalidades que aconteceram desde o sorteio de jurados ao curso do julgamento, passando pela votação e indo até a sentença. Os erros gravíssimos estão todos registrados no processo e serão levados ao Tribunal de Justiça no recurso de apelação da defesa. Quanto à decisão do Ministro Fux, válida apenas para a suspensão da liminar, temos a expectativa de que será afastada na próxima quinta-feira, quando será julgado o mérito do Habeas Corpus, restabelecendo-se o direito de liberdade dos réus", diz a nota de Jader.
Advogado de Leão, Jean Severo diz que o cliente irá se entregar tão logo seja expedido o mandado de prisão e que pretende recorrer da decisão do STF.
— Recebi essa decisão com surpresa. Estou chateado. Mas vamos recorrer ao plenário do STF porque meu cliente é inocente. Ele vai se apresentar, não será um foragido. E vamos aguardar o julgamento do mérito da liminar na quinta-feira, porque se o Tribunal de Justiça mantiver o habeas corpus, eles vão ter de soltar o Luciano — diz Severo.
O julgamento do mérito da liminar na 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça está mantido para esta quinta-feira (16). Nos bastidores do TJ, contudo, se especula que o relator, Manuel José Martinez Lucas, possa considerar o caso prejudicado em função da decisão do STF.
O procurador-geral de Justiça do RS, Marcelo Dornelles, se diz confiante de que a fundamentação acatada pelo STF, e que resultou na suspensão do habeas corpus, também será aceita pelo colegiado:
— Por óbvio, o colegiado deve acatar a decisão do STF e reconhecer. Se houver uma decisão contrária, nós imediatamente encaminharemos um novo recurso para que haja nova revogação.
O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do Ministério Público, Júlio César de Melo, confirmou ainda que o MP pretende recorrer da decisão sobre as penas aplicadas aos quatro condenados.
GZH tentou contato com os advogados de Hoffmann e Santos, mas não obteve retorno.
Confira a entrevista coletiva do MP
Confira como ficaram as penas
- Elissandro Callegaro Spohr, o Kiko, sócio da Kiss — condenado a 22 anos e seis meses de prisão em regime fechado
- Mauro Hoffmann, sócio da Kiss — condenado a 19 anos e seis meses de prisão em regime fechado
- Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista da banda Gurizada Fandangueira — condenado a 18 anos de prisão em regime fechado
- Luciano Bonilha Leão, produtor de palco da banda Gurizada Fandangueira — condenado a 18 anos de prisão em regime fechado