Um oficial de justiça e dois advogados de uma imobiliária ficaram chocados com a cena que encontraram durante o cumprimento de uma ação de despejo em um sobrado na Avenida Medianeira, bairro Nossa Senhora de Fátima, em Santa Maria, nesta quarta-feira.
Quando a garagem foi aberta, por volta das 12h30min, eles estranharam o cheiro e se surpreenderam ao ver o cadáver de um cão, já em estado de decomposição. O espaço, que foi por onde entraram na casa, estava com as janelas fechadas, bagunçado e sujo.
Ao subir para o segundo piso da casa, os advogados relataram que encontraram mais cadáveres, totalizando 25. De alguns só foi possível perceber pele e ossos, apesar de haver cadáveres inteiros. Eles estavam em meio à imundice. Havia restos de pacotes de ração, pratos de comida, com água, fezes, ratos mortos e cobertores espalhados pelo piso. A casa estava praticamente vazia, com exceção de alguns móveis e caixas. A situação indicava abandono.
Conforme a veterinária Letícia Adamy, os animais apresentavam indícios de morte por inanição. As mortes "podem ter acontecido há meses".
Os advogados acionaram a Patrulha Ambiental da Brigada Militar (BM), que foi até o local. Eles entraram na casa, vistoriaram e coletaram depoimentos. Um boletim de ocorrência seria feito na Delegacia de Polícia de Pronto-Atendimento (DPPA) para que uma investigação comece.
Vizinhos contaram ao Diário que já tinham denunciado a situação há cerca de um mês. A BM foi o local, mas ele estava fechado.
A ordem de despejo e a locatária
A ação foi autorizada pela Justiça por causa de uma dívida de aluguel. Conforme os advogados da imobiliária, Adriano dos Santos e Renato Weber, o valor de R$ 1.350 mensais pela casa de 100 m² não foi pago nenhuma vez desde o início do contrato, há dois anos. Em abril de 2015, os proprietários entraram na Justiça para pedir a desocupação.
A locatária é Elis Dal Forno de Freitas Parode, integrante do Gaspa Amigos Fiéis, entidade que atua em Santa Maria resgatando animais em situação de abandono. O Diário foi ao pet shop que ela mantém.
Em áudio gravado pelo jornal (Elis não permitiu que fossem feitas imagens dela), ela diz que deixou a casa há cerca de três meses, mas que havia retirado todos os cães do local. Elis alega não saber como esses cães foram parar na casa.
– Eu estou até um pouco em choque com essa notícia. Estou sem ir lá há três meses. Só estive lá para pegar as minhas coisas e trazer para cá. Tem pessoas que me ajudavam lá. Alguns animais eu deixei em lar temporário. Nós estávamos com uma média de 25 cães mais ou menos, nessa base, que estavam sendo cuidados. Então eu acabei não tendo mais nenhum envolvimento, mais nenhuma preocupação com isso. As minhas coisas, pessoais, estão lá, inclusive – explica.
Ela diz que deixou de pagar o aluguel porque locou o imóvel para uso comercial e residencial. A vontade dela era abrir um pet shop no andar de baixo e viver no de cima. No entanto, não pode abrir o empreendimento porque o imóvel não teria a documentação necessária para funcionar de forma comercial. Por causa disso, Elis se sentiu lesada e entrou com uma ação contra o proprietário.
– Eu enfrentei um problema de saúde e não pude trabalhar. Tive que fechar a minha loja – conta.
Este ano, ela conta que fez um acordo com o proprietário, onde abriria mão da ação contra ele e, em troca, o não pagamento do aluguel seria dado a ela como indenização.
Os advogados da imobiliária contam que toda a documentação para que ela pudesse abrir o empreendido foi providenciada, no entanto, Elis não teria buscado o registro na prefeitura, fato confirmado pela Secretaria de Finanças. Ainda, dizem que se tivesse havido acordo, não haveria necessidade de uma ação de despejo.
– O acordo na verdade foi para que ela deixasse a casa em três meses. Meu cliente não tinha perspectiva de receber, então desistíamos das ações e ela saia da casa. Ela aceitou, mas não saiu de lá – explica o advogado Weber.
Mais tarde na quarta, um dos advogados que representa Elis, Thomaz Almeida, disse que sua cliente destinou os animais para lares antes de deixar a casa. Questionado sobre se ela era a única que tinha a chave do imóvel, ele respondeu que somente a imobiliária. Ainda, Elis é a única representante da Gaspa em Santa Maria, que atualmente não está em funcionamento.
Os animais mortos devem ser retirados do local, mas ainda não se sabe de que forma e quando.
Investigação
Conforme o delegado Jun Sukekava, titular da Delegacia de Polícia de Pronto-Atendiment0 (DPPA), que investigará o caso, um inquérito foi aberto, e diligências já foram realizadas.
– Ouvimos algumas pessoas. Parece que ela (Elis) estava passando por problemas de saúde e abandonou os animais lá. Estamos tentando localizá-la para ver o que ela vai nos dizer – afirma.
O caso está sendo como maus-tratos a animais, que é um crime ambiental. A pena prevista é de três meses a um ano de prisão. No entanto, há o agravante de os cachorros terem morrido, o que pode aumentar a pena em até mais quatro meses. Em caso de condenação, como a pena não chega a quatro anos, poderá ser substituída por uma prestação de serviço ou pagamento de multa.