
A porta de vidro quebrada e a grade de ferro violada, quase arrancada da parede, revelam já na entrada o último ataque ao Instituto Sanmartin, na Zona Sul de Porto Alegre.
No interior da sala, prateleiras vazias, manequins derrubados, gavetas reviradas e arroz espalhado pelo chão.
O mais recente arrombamento, descoberto na tarde de quarta, definiu o fechamento das portas do instituto, localizado na Avenida Wenceslau Escobar, no estacionamento coberto de um supermercado.
A violência venceu a solidariedade. As 39 entidades, entre creches e lares de idosos, que contavam com as doações recolhidas pelo Sanmartin recebiam cerca de duas toneladas de alimentos por mês.
- Não dá mais para ficar lá. Em um ano, sofremos nove arrombamentos. O penúltimo foi três dias antes de entregarmos os kits de Natal que tínhamos montado para 80 famílias. Nem isso respeitaram - desabafa a fundadora do instituto, Iara Zinn.
Criada na dor
A organização foi criada por ela há 14 anos após a morte do filho SanMartin em um acidente de trânsito. Segundo ela, nos 14 anos de existência, a ONG entregou mais de 270 toneladas de alimentos, amparando 80 instituições e beneficiando cerca de 6 mil pessoas.
Foi Luiza Zucchelli, 73 anos, quem deparou com a grade arrebentada e os vidros quebrados. Fazia uma semana que ela havia retomado a função, após dois meses de loja fechada.
- Levaram o rádio que eu escutava, meu ventilador, um teclado musical, roupas que vendíamos aqui ou trocávamos por doações. Os alimentos que estocávamos também foram levados, arroz, feijão, farinha, açúcar - detalha.
Outras entidades
Na quinta-feira, Luiza organizava os pertences do instituto que ainda restavam para deixar o local, que era emprestado pelo supermercado. Agora, para haver outra sede, somente com aluguel simbólico ou também sem cobrança.
A orientação é para que as pessoas que faziam doações ao instituto procurem outras redes de apoio.
O tenente-coronel Kleber Goulart, comandante do 1º BPM, informou que deslocou um oficial para atender o caso na manhã de quinta. Ele destacou a dificuldade do policiamento na região porque não houve registro da ocorrência.
Foram registrados na Polícia Civil, pelo menos, três dos nove arrombamentos citados por Iara.
Creche era beneficiada
Uma das entidades que vai sentir falta das doações recolhidas pelo Instituto Sanmartin é a Escola de Educação Infantil Bem-Me-Quer, na Rua Júlio Teixeira, na Cohab Cavalhada, Zona Sul da Capital.
Creche na Cohab sentirá falta das doações
Foto: Adriana Franciosi

A instituição, que é conveniada com a prefeitura, atende a 62 crianças entre 7h e 18h. Iolanda Garcia, 72 anos, sabe a diferença que faz bons alimentos entrando na despensa. Há 18 anos, ela é a cozinheira.
- Hoje, muitas crianças não vieram por causa da chuva. Mas a gurizada come bem aqui. Eles nos ajudavam muito. Tomara que consigam outro lugar - torce ela.
Pelo menos uma vez por mês, a ONG ligava avisando que havia alimentos para a escola, e a direção ia buscar. Mas não eram somente os donativos para a creche que faziam o Sanmartin querido na Cavalhada.
- Na Páscoa e no Natal, as crianças ganhavam presentes bons, e as famílias delas e os servidores da escolinha também recebiam cestas básicas do instituto - conta Iolanda.