O exercício de um mandato de vereador tem suas limitações. Um parlamentar não pode, por exemplo, criar projetos de lei que tragam gastos ao Executivo local. Contudo, nem só de limitações é feito o mandato de um político de uma Câmara de Vereadores.
Em Santa Maria, os parlamentares buscam dar sua contribuição à sociedade e, claro, validar o voto obtido junto ao seu eleitorado por meio de agendas e compromissos que lhe deem visibilidade.
Os caminhos para isso, quase sempre, apontam em duas direções: ir a Porto Alegre, sede do governo do Estado e da Assembleia Legislativa, e também a Brasília, onde estão aportados os recursos do governo federal. Uma viagem implica no uso de diárias (basicamente para cobrir gastos com hospedagem e alimentação), recurso disponibilizado dentro do orçamento da própria Casa, para que os vereadores possam ter suas viagens garantidas.
O "Diário" traz nesta reportagem um levantamento do uso de diárias pelos 21 vereadores. Foi analisado o período de 2013, quando começou a atual legislatura, até 2015. Os números são públicos e constam no Portal de Transparência do Legislativo. E o que se constata é que, no primeiro ano, houve um gasto de R$ 51 mil.
No ano seguinte, ocorreu uma queda em mais de 40% no uso de diárias, fechando 2014 com R$ 22,6 mil em diárias. Já 2015 foi o ano que os vereadores fizeram o maior uso de diárias: R$ 67,1 mil. Ou seja, o número quase triplicou.
No primeiro ano da atual legislatura, em 2013, o vereador Marcelo Bisogno (PDT) foi o campeão no uso de diárias, com R$ 9,2 mil. Também em 2013, só três não retiraram diárias: Cezar Gehm (PMDB), Deili Granvile (PTB) e Werner Rempel (PPL). Em 2014, Bisogno manteve-se como o parlamentar que mais recorreu ao uso de diárias, com R$ 3,1 mil. Já Ovidio Mayer (PTB), Sergio Cechin (PP) e Werner nada gastaram.
Em 2015, o tucano Admar foi o que mais gastou, com R$ 8,3 mil. Nestes três anos, o vereador que apresenta uma crescente no uso de diárias é João Chaves (PSDB): em 2013, retirou R$ 250; R$ 1,1 mil, em 2014; e no ano passado, R$ 7,2 mil.
Valores concedidos
As diárias contam com valores diferenciados. Para viagens dentro do Estado e idas à Capital, a diária é de R$ 250. Já para viagens fora do Estado e que tenham Brasília como destino, a ajuda é de R$ 375. Ao retornar da viagem, o vereador emite um relatório da viagem em que aponta as atividades as quais ele participou. O político deve apresentar notas fiscais à Casa.
Agenda intensa e retorno à sociedade, asseguram os políticos
O pedetista Marcelo Bisogno, que presidiu a Casa em 2013, justifica os mais de R$ 9 mil gastos ao dizer que buscou estar à frente de questões prioritárias para a cidade: como a duplicação da ERS-509 (Faixa Velha de Camobi), a retomada das obras de esgoto da Corsan, o recomeço dos trabalhos no hospital regional, a buraqueira nas estradas da região, com reuniões no Daer, e temas da segurança pública.
- Pela função que eu exerci, acabei usando mais a estrutura para representar o Legislativo. Também me envolvi na questão do prédio da Câmara (obra parada) quando rompemos contrato com a empresa (Engeporto). Deixo claro que apenas busco agenda quando há margem de retorno imediato à sociedade.
O tucano Admar Pozzobom, que utilizou R$ 8,3 mil no ano passado, também destaca que suas agendas ocorreram na busca de dar respostas aos santa-marienses, o que foi, em parte, obtido:
- Fui atrás da liberação de R$ 4 milhões para um centro desportivo para a cidade, a garantia de dois caminhões-pipa para a cidade e para a região. Além de demandas para a saúde, como as ambulâncias do Samu.
O tucano João Chaves justifica o uso de R$ 7,2 mil em viagens junto às comissões que ele integra na Casa, entre elas a da saúde. Chaves enumera os retornos obtidos em suas viagens: cobrança pela conclusão das creches municipais do ProInfância; inclusão de Santa Maria no traçado da Ferrovia Norte-Sul, busca pelo credenciamento do Hospital de Caridade junto aos serviços de alta complexidade; e demandas envolvendo o hospital regional e os serviços da Corsan.
Na contramão
A vereadora Deili Granvile (PTB), a segunda que menos gastou nos três anos, prefere focar em Santa Maria. Segundo ela, na cidade seu leque de atuação é mais amplo e são maiores as chances de fazer algo pela sociedade.
Sem disparar críticas, ela acha que "falta parcimônia no uso de diárias". O colega Werner Rempel (PPL), que presidiu a Câmara no primeiro semestre de 2014, fala que o fato de ele não ter retirado diárias nos três anos não quer dizer que ele não tenha viajado.
- Presidi a Câmara e me envolvi em questões como, por exemplo, o prédio da Câmara. Mas não vi necessidade de solicitar (diárias).
Colegas propõem limitações
O ano de 2016 deve trazer à tona dois projetos, já conhecidos pelos vereadores, que visam rever a concessão de diárias. O primeiro deles, de autoria de Luciano Guerra (PT), quer limitar a concessão e, principalmente, tornar mais rígido o pagamento desse benefício. Já a outra matéria, proposta por Deili Granvile (PTB), visa impedir que os políticos retirem diárias durante o período de campanha eleitoral.
O projeto de Guerra nem chegou a ser colocado em votação em 2015. À época, a matéria teve parecer contrário da Procuradoria Jurídica e, por isso, não tramitou nas comissões da Casa.
- Entendo que diária não é complemento de renda. Até porque todos, que lá estão (na Câmara), têm o seu emprego. O vereador deve ser ressarcido pelo o que de fato realmente gastou e com comprovação de nota fiscal. Meu projeto ainda propõe que o valor da diária baixe para R$ 200 (no Estado) e para fora do Estado o valor fique em R$ 300.
Já o projeto de Deili foi apresentado em 2014, contudo, a matéria foi rejeitada em votação pelos colegas. A vereadora adianta que apresentará a matéria de novo. O efeito prático de uma lei dessas seria que, no decorrer dos quatro anos de um mandato, haveria restrição para solicitar diárias em dois anos, pois há eleições municipais e estadual/nacional.
- Em ano de eleição o cuidado ao erário deve ser ainda maior. Espero que os colegas tenham compreensão e esse entendimento - conclui Deili.
Motivos da queda
Em 2014, os vereadores usaram bem menos diárias. Entre os colegas de Legislativo impera o entendimento que, por ter sido um ano de eleição, os vereadores mantiveram sua agendas em Santa Maria em busca de votos para seus candidatos à Assembleia e à Câmara Federal. Este ano, por ser de eleições municipais, isso pode se repetir.