Judiciário e Legislativo justificam os gastos
A reportagem do DC procurou os chefes dos poderes Judiciário e Legislativo estaduais e enviou a eles, mais ao Ministério Público de Santa Catarina e ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, uma mesma questão a respeito da adequação do gasto de cerca de R$ 50 milhões com auxílio-moradia em tempos de crise:
Em 2015, Santa Catarina gastou quase R$ 50 milhões com auxílio-moradia para 1.028 funcionários que já recebem salários que variam de R$ 22,5 mil a R$ 30,4 mil. Embora seja um benefício previsto em lei, o senhor considera adequada essa gratificação diante do cenário de crise econômica e das dificuldades dos Estados em manter em dia a folha do funcionalismo?
Nelson Schaefer Martins, presidente do Tribunal de Justiça (TJSC)
"O auxílio em questão, como bem dito, é devido por força legal. É um direito da magistratura, previsto na Lei de Organização da Magistratura Nacional (Loman) e na Lei Complementar Estadual n. 376/2006, além de também estar regulamentado pelo próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É pago pela maioria dos tribunais do país e demais poderes. Mais do que um benefício para integrantes de uma carreira marcada pela itinerância, é igualmente uma forma de remuneração pela ausência de uma política de reposição salarial para a magistratura brasileira. Outros servidores e agentes públicos percebem verbas indenizatórias diversas, como por exemplo periculosidade, insalubridade, e adicional por tempo de serviço, as quais não alcançam a magistratura. Aliás, nunca é demais lembrar que os poderes constituídos são independentes e harmônicos entre si, cada qual com responsabilidades na gestão orçamentária em busca de suas metas e objetivos. A crise econômica afeta a todos indistintamente e exige adequações dentro dos princípios da legalidade. No Poder Judiciário de Santa Catarina, por exemplo, procedemos contingenciamento orçamentário da ordem de quase R$ 100 milhões em 2015, sem contudo malferir direitos."
Aderson Flores, Ministério Público junto ao Tribunal de Contas de Santa Catarina (MPTC-SC)
"Defendo que o auxílio-moradia deva respeitar a ideia que originou sua criação, na lei orgânica da magistratura e no estatuto do Ministério Público. Conforme essas leis, é uma verba indenizatória devida apenas a juízes e promotores públicos. Em razão da carreira desses agentes públicos não se dar em um único lugar, havendo a possibilidade de remoção/promoção para diversos municípios do estado, apenas neste caso parece pertinente que as despesas com moradia sejam indenizadas pelo poder público. Nessa hipótese, a questão econômica não deve se sobrepor à questão legal. De outro lado, houve expansão na interpretação dos beneficiários do auxílio-moradia, provocada por leis que vinculam a remuneração de determinados agentes públicos às carreiras do Judiciário e do Ministério Público. A título de exemplo, cito a Lei Estadual nº 15.939/2012,1, que define, no âmbito do Estado de Santa Catarina, o valor e as condições para a percepção do auxílio-moradia a uma série de agentes públicos."
Gelson Merisio, presidente da Alesc
"No ano passado, na Assembleia Legislativa, fizemos economia de R$ 100 milhões e aplicamos o recurso em banco. Justamente para garantir apoio ao Governo em 2016 em situações emergenciais. Desde 2011, a Alesc vem devolvendo recursos aos cofres do governo. Mas, além disso, acredito que não seja só o momento de crise econômica que nos obrigue a apertar o cinto e fazer mudanças, mas também o modelo de estado pesado, caro e antigo que ainda estamos usando. Hoje, temos uma estrutura administrativa muito grande, inchada, que acaba, sim, comprometendo investimentos nas atividades fim, como saúde, educação e segurança. E as mudanças precisam ser profundas e efetivas. Por exemplo: se a lei que prevê o auxílio-moradia for extinta e ele não mais for pago, o recurso não retorna necessariamente para o governo. Vai acabar ficando nos poderes porque o Executivo faz um repasse fixo para cada um deles. E este é o ponto, o debate tem que ser na origem do problema e precisa ser feito. De uma forma geral, há muita gordura pra cortar."
Fábio de Souza Trajano, subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais do Ministério Público (MPSC)
"Cumprimos o que rege a lei e seguimos a decisão do Conselho Nacional do Ministério Público (resolução nº 117, de 7 de outubro de 2014). Cabe-nos respeitar as determinações legais."
Luiz Roberto Herbst, presidente do Tribunal de Contas de Santa Catarina
"Houve uma ampliação exacerbada do sentido e do objetivo originais do auxílio-moradia. Porém, atualmente, não é possível qualquer correção de forma isolada para um órgão ou para um determinado cargo. Isto dependeria de um ajuste geral, abrangendo categorias das administrações estaduais e federal."
*Com colaboração de Felipe Lenhart
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