
Minutos antes de começar a colação de grau da turma 86 do curso de Agronomia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), sobravam nervosismo e emoção. Enquanto amigos e familiares dos formandos chegavam no Park Hotel Morotin para comemorar a conquista, nos bastidores, os acadêmicos se arrumavam e tiravam fotos. Mas o momento de alegria também foi de saudade de Erika Sarturi Becker e Miguel Webber May. Se os dois não tivessem morrido no trágico incêndio da boate Kiss, estariam recebendo o canudo, ao lado dos outros 22 formandos.
- E quando os teus amigos te surpreendem, deixando a vida de repente, e não se quer acreditar? Mas se essa vida é passageira, chorar eu sei que é besteira, mas meu amigo, não dá para segurar - disse Aline Camargo, formanda, em seu discurso, parafraseando Milton Nascimento.
Os dois haviam concluído o 4º semestre quando morreram. Para Aline e Rafael Lago Busanelo, que criaram o discurso especial, Miguel e Erika estiveram presentes naquela noite:
- Hoje podemos sentir o orgulho de dever cumprido, por nós e por eles. Obrigado, grandes amigos e anjos, por terem tornado nossos dias mais alegres e gratificantes, pela força e luz que nos guia. Com todo amor, carinho e saudade, da família 86.
A Agronomia da UFSM foi o curso que mais perdeu alunos na tragédia da Kiss: foram 26 mortos no incêndio.
Aos queridos amigos, o carinho e muita saudade
Erika Sarturi Becker tinha 22 anos, quando o incêndio na boate Kiss, em 27 de janeiro de 2013, interrompeu a sua vida e de mais de duas dezenas de estudantes do curso de Agronomia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
A jovem, que começaria o 5º semestre do curso, foi à festa Agromerados, organizada pelos alunos do então 2º semestre da Agronomia, para acompanhar um grupo de colegas de aula.
Os pais de Érika, Mauren e Léo Becker, assistiram à missa da turma 86 na noite de quinta-feira e participariam da colação de grau na sexta. Mauren lembrou que a filha única pretendia se formar em Agronomia e, depois, se especializar no cuidado aos animais:
- Eles (formandos) dividiram um momento deles com a gente e com os queridos amigos que não estão mais aqui. Isso é fraternidade, generosidade. Não são só profissionais que se formam, são grandes seres humanos.
Miguel Webber May, à época 23 anos, já tinha estágio garantido no exterior mesmo antes de receber o diploma. O jovem, que nasceu na cidade de Chapada, no Alto Uruguai, interior do Estado, iria para os Estados Unidos na fazenda de uma amiga do tio.
Após a morte trágica do filho, a dor impediu que a mãe de Miguel voltasse a Santa Maria. O pai chegou a voltar à cidade e recebeu homenagens dos colegas de Miguel. Mas nenhum deles confirmou participação na formatura da turma do filho.
Os tios do jovem, que moram em Santa Maria, participariam da cerimônia na sexta-feira. Era ao tio, o engenheiro agrônomo e professor da UFSM, Arno Udo Dallmeyer, que Miguel recorria em busca de bibliografias na área profissional. Também foi o tio que conseguiu estágio para o sobrinho nos Estados Unidos.
- Ele tinha uma raiz na terra. Eu estava tentando encaminhá-lo para concretizar aquele que era o sonho dele.
