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O retrato das finanças públicas no primeiro semestre do governo José Ivo Sartori indica que as medidas de austeridade adotadas desde janeiro começaram a surtir efeito. Divulgado no fim de julho, o relatório resumido da execução orçamentária - documento que sintetiza, a cada bimestre, a contabilidade estadual - revela queda, em termos reais, de 20,9% no custeio do Poder Executivo, em relação a igual período de 2014.
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Ao mesmo tempo, o comparativo entre gasto e receita sugere que a busca pelo equilíbrio nas contas não ficou apenas no discurso, apesar de decisões polêmicas - como o aumento dos salários da cúpula, em janeiro. Traçando um paralelo entre os primeiros 180 dias de 2014 e de 2015, descontada a inflação, a arrecadação total minguou 0,88% e as despesas executadas aumentaram 0,05%.
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- Mesmo em um cenário de retração econômica e crescimento da inflação, estamos conseguindo realizar um ajuste significativo. As medidas de contenção estão funcionando - diz o subsecretário do Tesouro do Estado, Leonardo Maranhão Busatto.
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Embora os valores usados na manutenção da máquina tenham decrescido, o Rio Grande do Sul permaneceu no vermelho e não deve sair dessa condição tão cedo. De janeiro a junho, o rombo se atenuou, mas, no acumulado dos seis meses, atingiu R$ 1,55 bilhão. Na primeira metade da administração de Tarso Genro, as contas estavam no azul.
- Esse déficit já era esperado em razão dos reajustes concedidos na gestão passada. O gasto com pessoal vem crescendo, e o impacto está sendo sentido agora - afirma Darcy Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas.
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Houve, também, diminuição na capacidade de investimentos. Ao todo, o Piratini aplicou 81% a menos do que em 2014, quando contava com R$ 516,2 milhões em operações de créditos.
CORTES DE CUSTEIO ESTARIAM NO LIMITE
O núcleo do governo aposta em mudanças estruturais para sanar a crise. Parte das propostas, como a extinção de fundações e a reforma da previdência, já está na Assembleia. Uma nova leva deve ser encaminhada nos próximos 15 dias e promete causar polêmica, principalmente, pela tentativa de aumento de ICMS.
A avaliação é de que os cortes no custeio (decorrentes do decreto de contingenciamento assinado pelo governador em janeiro) dificilmente poderão ser ampliados, sob pena de colapso nos serviços públicos. Além disso, na prática, até agora, representaram economia suficiente para cobrir apenas dois meses de déficit.
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Ou seja, o Piratini continuará sem soluções imediatas para a falta de dinheiro que o levou a parcelar salários de julho do funcionalismo - e a tendência é piorar até o fim de agosto. O ponto de corte para o fatiamento das remunerações pode passar de R$ 2,1 mil para R$ 1 mil, e a ameaça de novas paralisações dos servidores é real.
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Pelos próximos meses, segundo o economista Liderau dos Santos Marques Junior, da Fundação de Economia e Estatística, a Secretaria da Fazenda se limitará a "administrar o caixa".
- Não vejo cenário promissor no curto prazo, mas é visível a mudança na política fiscal. O governo retomou a busca pelo superávit primário (poupança para pagar o juro da dívida) e, embora os resultados sejam insuficientes, o rumo está certo - sintetiza Marques.
"NÃO EXISTE SOLUÇÃO FÁCIL"
Com o semblante cansado, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, recebeu ZH na última quinta-feira, pouco antes de participar da apresentação dos 10 projetos que o governo do Estado enviou para a Assembleia, para um balanço das finanças públicas no primeiro semestre. Ao avaliar os resultados, afirmou que o governo fez "o possível" na busca pelo equilíbrio financeiro, mas que a situação só deve começar a melhorar a partir do segundo semestre de 2016.
Do ponto de vista das finanças, o primeiro semestre deste ano foi pior do que o esperado?
Sempre se espera mais, mas fizemos o possível. Os números nos deixam felizes, porque mostram que o ajuste fiscal está dando resultado.
O senhor tem conseguido dormir?
Voltei a acordar sobressaltado na madrugada, algo que só acontecia de vez em quando, no tempo em que era prefeito (de Campo Bom). Agora é frequente. Não é fácil fazer os enfrentamentos necessários.
Os gastos com custeio caíram 20,9%. É possível cortar mais?
Há limites do ponto de vista da qualidade da gestão. Temos um custeio de mais de R$ 5 bilhões por ano, e suprimir mais de 20% é um processo brutal. É preciso dizer não todos os dias.
O senhor se ressente de ser escalado para dar notícias ruins, como o parcelamento dos salários?
Isso não dá prazer para ninguém. Mas, ao mesmo tempo, tenho contado com uma boa assessoria, com a expertise dos técnicos da secretaria, e nunca fui de ficar na zona de conforto. Das vezes em que fiquei, me arrependo.
Causou desconforto o fato de Sartori ter se ausentado no anúncio?
Da minha parte, já estava previsto que assumiria posições de enfrentamento na Fazenda. Um dos motivos pelos quais o governador me convocou foi exatamente para assumir a comunicação para dentro e para fora do governo. Eu já sabia disso e faço o que precisa ser feito.
Quando será possível o governo sair do vermelho?
A coisa vai começar a melhorar a partir do segundo semestre de 2016. Por enquanto, o déficit vai continuar a existir, embora em um volume aquém do que imaginávamos.
O que vem sendo feito para melhorar a arrecadação?
Em razão da estagnação da economia brasileira, não temos muitas alternativas.
E em relação ao combate à sonegação de impostos?
Temos feito múltiplas ações que desencadeiam a percepção de risco, entre elas a do IPVA, nos últimos dias. Sempre há mecanismos para melhorar, e estamos fazendo isso. Mas é importante que as pessoas saibam que não existe solução fácil.
Dos 100% que temos de dívida ativa, 85% estão judicializados. Se fosse simples, os governos passados já teriam resgatado esses recursos.
Qual será o impacto dos projetos enviados na sexta-feira à Assembleia?
O ajuste fiscal fase três não traz modificações que gerem receitas exponenciais em curto prazo, mas sinaliza para um Estado que caiba dentro do bolso dos contribuintes. E outras medidas virão. O governador disse claramente que vai entregar um Estado diferente, que comece a andar com as próprias pernas, mesmo que trôpegas, daqui a três anos e meio.