Os mesmos R$ 600 que não pagam nem duas cestas básicas em Porto Alegre terão de ser administrados pelos servidores estaduais para cobrir as despesas dos próximos 11 dias. Com gastos acumulados do mês passado, muitos já entram setembro no vermelho e tentam calcular uma conta equacionada por juros, multas e cortes de gastos que insiste em não fechar.
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Desde que os extratos bancários confirmaram o fatiamento salarial do funcionalismo gaúcho nesta segunda-feira, marcada por protestos de servidores em frente ao Palácio Piratini e ao Palácio da Polícia, a angústia se espalhou entre as famílias que dependem dos vencimentos pagos por um Estado em profunda crise financeira. Para o ex-funcionário da Caixa Econômica Estadual, o aposentado Vilson Pedroso da Silva, 66 anos, o sentimento se materializou em lágrimas:
- Vou passar fome - desabafou, em frente ao Palácio Piratini.
Silva consultou o extrato da sua conta no sábado, quando havia previsão de depósito de R$ 100. Nesta segunda-feira, preferiu nem olhar novamente o saldo bancário para "não se desesperar mais". Líquido, seu salário chega a R$ 2,5 mil - dos quais, R$ 1,2 mil vão para o custeio de remédios. O aposentado não movimenta uma das pernas, sequela de um acidente doméstico, e não tem perspectiva de onde tirar dinheiro para quitar a conta na farmácia. A tranquilidade, ainda que ínfima, veio da Secretaria Estadual da Fazenda: pode haver casos pontuais em que os R$ 600 ainda não constavam no extrato, mas, até o final do dia, todas as 347 mil matrículas receberão o valor.
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Também pensionista, Cláudia da Costa Silveira, 41 anos, exibia, no protesto convocado por esposas de brigadianos, pela manhã, o extrato do Banrisul: R$ 888 negativos. Líquido, ela recebe R$ 3,1 mil a cada mês. Do valor, é descontada a contribuição para o IPE Saúde e Previdência, o Imposto de Renda e os empréstimos contratados para construir a casa onde mora. Os R$ 600 creditados não foram suficientes para cobrir nem a fatura de R$ 1,9 mil do Banricompras da mulher, mãe solteira de três filhos.
- A gente vai ter de ficar à base de pão e ovo, arroz com ovo ou arroz com feijão bem ralo - disse.
Cláudia convive com o efeito cascata do parcelamento de salários do Executivo. Para complementar a renda, trabalha como diarista na casa de professoras e oficiais da Brigada Militar (BM) - que também não receberam a integralidade dos vencimentos e, como consequência, cancelaram as próximas faxinas.
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- Essa situação cria uma insegurança nas pessoas porque não se consegue sequer cobrir as necessidades básicas - sintetizou o escrivão de polícia Fábio Castro, 44 anos, vice-presidente do Ugeirm Sindicato (que representa escrivães, inspetores e investigadores da Polícia Civil).
A situação de Castro se assemelha à de outros pais: mensalmente, parte do salário cai direto para o pagamento da pensão alimentícia da filha. São R$ 1,3 mil para a jovem e cerca de R$ 4 mil para ele. Nesta segunda-feira, o saldo foi de R$ 600 para cada. O dinheiro da pensão é usado para pagar o aluguel e custeios, como transporte e alimentação, da filha, moradora de Pelotas em decorrência dos estudos na UFPel. Só para o aluguel, são R$ 700.
- E eu vou ter problemas para ajudar porque não vai cobrir o meu aluguel também _ apontou o escrivão.
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Com outros colegas da Polícia Civil que enfrentam a mesma situação, Castro estuda ingressar com uma medida cautelar na Justiça na tentativa de que seja repassado o valor integral da pensão alimentícia, já que o não pagamento é passível de prisão. A Secretaria da Fazenda informou que o depósito de pensões seguirá o mesmo calendário de pagamentos divulgado pela manhã: ou seja, mais dinheiro, só no dia 11.
*Zero Hora