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Convidado pela Assembleia Legislativa para prestar esclarecimentos sobre a situação financeira do Estado na manhã desta quinta-feira, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, denunciou um suposto relaxamento de metas fiscais previstas em contratos do governo federal em favor do Estado.
Os episódios teriam ocorrido no governo Tarso Genro, contando com aval do então secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin (PT), para as flexibilizações.
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O depoimento de Feltes ocorreu na Comissão de Finanças, Planejamento, Fiscalização e Controle. O afrouxamento das metas teria sido importante para ampliar a capacidade de endividamento do governo gaúcho.
No entendimento de pessoas ligadas ao governo José Ivo Sartori, o Tesouro Nacional sempre foi rigoroso na cobrança do cumprimento das metas fiscais. Na avaliação de peemedebistas, o caso poderá gerar implicações pela Lei de Responsabilidade Fiscal, dificuldades na busca de financiamentos futuros e eventuais reprovações de contas no Tribunal de Contas do Estado (TCE).
- O Arno Augustin assinava mesmo sem as metas fiscais jamais serem alcançadas. É interessante que as alternativas que poderiam ser utilizadas para a crise são as mesmas pactuadas pelo Estado com a Secretaria do Tesouro Nacional, mas nada foi cumprido - afirmou Feltes, indicando que os acordos descumpridos, com autorização de Augustin, listam diversas ações de ajuste, de aumento de receita e redução de despesa, com redução da máquina pública e venda de ativos.
O Plano de Ajuste Fiscal (PAF) apresentado por Feltes é referente ao período entre 2014 e 2016, tendo sido assinado em janeiro do ano passado. Em uma das revisões do programa, assinada no dia 31 de dezembro do ano passado, o Rio Grande do Sul se comprometia novamente a recuperar a sua situação fiscal com ações como venda de ativos (patrimônio) do Estado, federalização da CEEE e reprogramação de despesas.
Também era meta brecar as transferências financeiras às empresas estatais. Outra imposição era "limitar as despesas de pessoal a 60% da Receita Corrente Líquida". Já nesta época, o comprometimento da receita com a folha ultrapassava os 70%. Semanas antes de assinar o PAF se comprometendo com redução do custeio do funcionalismo, Tarso havia pago a primeira parcela de reajuste de 14% ao magistério. Ao mesmo tempo, já existia a previsão de um calendário de reajustes para a área da segurança entre 2015 e 2018, com impacto de cerca de R$ 4 bilhões.
Para Feltes, a prática do governo Tarso era de sempre aumentar gastos, em contrapartida aos compromissos assumidos de redução com a Secretaria do Tesouro Nacional.
Feltes ainda relatou que R$ 914 milhões de financiamentos recebidos pelo governo Tarso em 2014 caíram no caixa único e foram utilizados para gastos com custeio da folha de pessoal, e não para investimentos, conforme previsto em contrato. Agora, para liberar as próximas parcelas das operações de crédito, o Piratini terá de devolver em 2015 uma parcela de R$ 731 milhões com recursos próprios. Sem isso, os pagamentos seguintes dos empréstimos ficarão represados.
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O PAF é responsável por regularizar a situação do Estado com a União. No PAF, o Estado, em um indicativo de esforço de recuperação fiscal, assume metas como redução de despesas com funcionalismo, aumento da arrecadação própria, melhoria do resultado primário das contas, venda de ativos, redução da máquina e equilíbrio fiscal.
O Estado é obrigado a cumprir essas metas para manter o contrato de renegociação da dívida, receber recursos ordinários da União e ter autorização para contratar empréstimos de organismos internacionais, como o Banco Mundial.
No governo Tarso, pela política adotada, as metas teriam sido descumpridas. E, a cada período de avaliação na Secretaria do Tesouro Nacional, Augustin aceitava a prorrogação do prazo de cumprimento das normas fiscais, que voltavam a ser descumpridas. A observação do acordo acabava prorrogada. A flexibilização pelo Tesouro Nacional era fundamental para que o Palácio Piratini continuasse a receber, mesmo sem atender todos os requisitos do ajuste, as parcelas de empréstimos com bancos, principal aposta do governo Tarso para gerar investimento no Estado.
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Episódio como esse ocorreu em 2014. No início do ano, o PAF trazia uma série de previsões. Ao final de 2014, as metas não haviam sido cumpridas, mas a Secretaria do Tesouro Nacional assinou, em um ato de revisão, uma suposta flexibilização para manter o Rio Grande do Sul dentro de novos parâmetros.
Feltes diz que apresentou os documentos para demonstrar, segundo o seu ponto de vista, que a soma da política de endividamento à flexibilização das metas fiscais foi decisivo para colocar o Estado na atual situação de crise financeira.
CONTRAPONTO
Secretário da Fazenda do governo Tarso, Odir Tonollier afirma que todas as metas fiscais previstas no PAF foram obedecidas. Eventuais desrespeitos, como no caso do comprometimento da Receita Corrente Líquida com folha de pagamento, poderia gerar sanções graves.
- Existe um engano nessa questão. O Estado cumpre todas as metas e elas são atualizadas sempre quando o Estado pedir. O fato de termos revisado metas é porque a economia muda, com variações diversas - explicou Tonollier.
Ele explicou os pontos que supostamente teriam sido descumpridos:
1 - Meta que determina redução das despesas de pessoal ao limite de 60% da Receita Corrente Líquida. O governo atual diz que o nível já está em mais de 70%. Odir nega e afirma que o cálculo correto excluí os servidores inativos. Em 2014, afirma, a folha do Executivo fechou em 45,74% da Receita Corrente Líquida, abaixo do limite de 49%. O teto de 60% de gastos com salários se refere às folhas de todos os poderes. Também diz que o cálculo não inclui inativos, o que reduz o comprometimento.
2 - Limitação de repasses a empresas estatais. Odir alega que o Estado não repassa recursos a estatais. Ao contrário, diz ele, o Estado acaba recebendo dividendos.
3 - Assegura que Estado reduziu seu nível de endividamento com a rengociação da dívida com a União (ainda pendente de regulamentação), além de ter deixado encaminhadas ações previstas no PAF como operações de debêntures (emissão de títulos para antecipar receita) e a federalização de parte da CEEE (16%).
* Zero Hora