Há poucos dias, Paris estava em festa. Das janelas dos prédios, os franceses gritavam "Bonne Année", celebrando a chegada de 2015. Grupos de jovens, encharcados de champanhe e vinho nacional, cambaleavam pelas ruas próximas ao Trocadero recebendo o novo ano. E turistas se espalhavam pela Champs-Élysées disputando o melhor ângulo para uma selfie com o Arco do Triunfo ao fundo.
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Agora, o Arco do Triunfo está envolto em uma faixa negra: "Paris est Charlie". O mundo inteiro é Charlie. Cinco dias depois de celebrar a chegada de 2015 em Paris com minha família, regresso e encontro uma cidade mais apagada, esvaziada e triste.
Os tiros que vitimaram 12 pessoas na quarta-feira passada ainda não estancaram na França. Na sexta-feira à noite, três dias após o atentado, ainda há resquícios claros dessas feridas. Em frente à Rue Nicolas Appert, próxima à Praça da Bastilha, equipes de TV ainda mantinham vigília, a rua está interditada e turistas e passantes deixam suas homenagens a Charlie Hebdo.
De toda a forma, a cidade tenta recuperar o seu ritmo. A maioria das pessoas trabalhou e foi às aulas normalmente apesar do clima de luto. Para um engenheiro brasileiro, que vive na França desde 2001, a rotina não se alterou. Ele mora nos arredores de Paris, próximo ao mercado kosher onde houve novas vítimas na sexta-feira. O assunto é tema permanente de conversa - no trabalho e no prédio onde mora -, mas a rotina segue.
A busca pelos culpados parece ser mais ampla do que encontrar, prender e matar os homens que dispararam aqueles tiros. A França vive um problema de integração enorme e, de certa forma, o atentado mexe com essa situação complexa, que não envolve apenas religião, mas uma questão social.
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Os muçulmanos estão pelas ruas de Paris, fazem parte do tecido social da cidade e do país. Para um motorista de táxi, o episódio está sendo usado pelo governo para reforçar a rejeição e desviar a atenção de um cenário de baixo crescimento econômico, violência e racismo.
- Eu sou muçulmano, e os muçulmanos não são maus. Eles querem dizer que o Islã é mau, mas não é verdade.
No domingo, uma grande mobilização convocada pelo presidente François Hollande deve tomar as ruas do país. Uma demonstração de união, liberdade e força da Franca para o mundo. Os franceses ainda devem enfrentar uma caminhada até superar esse trauma. E nós, com eles, devemos percorrer o trajeto na tentativa de entender o que está por trás do terror.
No mapa, confira o local dos ataques em Paris:
Confira as fotos da movimentação no entorno da fábrica:
Fábrica fica a cerca de 40 quilômetros a nordeste de Paris:
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O que aconteceu
Três homens atacaram a sede da revista satírica francesa Charlie Hebdo, em Paris, matando pelo menos 12 pessoas. Os homens encapuzados, armados com fuzis Kalashnikov, entraram no escritório por volta do meio-dia (9h de Brasília) desta quarta-feira e abriram fogo, deixando 12 vítimas fatais - 10 jornalistas e dois policiais
Pelo menos cinco pessoas estão em estado grave. Após trocar tiros com a polícia, os terroristas fugiram do local em um carro dirigido por uma quarta pessoa em direção ao nordeste de Paris. As informações são do jornal The Guardian e da BBC News. Entre os mortos, estão o jornalista, cartunista e diretor do semanário, Stephane Charbonnier, conhecido como Charb, e três cartunistas: Cabu, Wolinski e Tignous.
Charlie Hebdo é uma revista satírica semanal conhecida pelo envolvimento em polêmicas. Um dos seus últimos tweets foi uma charge do líder do Estado Islâmico, Abu Bakr al-Baghdadi. O semanário já havia sido alvo de outros atentados: em 2011, a sede foi incendiada após a publicação de charge sobre o profeta Maomé.
Al-Baghdadi representado em charge recente da revista
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Vídeo mostra terroristas executando policial na saída da sede:
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