Purpurinas, lantejoulas, plumas e paetês são a cara do Carnaval. Elas enfeitam os personagens da folia e, junto com os acessórios e carros alegóricos, são passaporte para a entrada do sambista na avenida. Para desfilar em uma escola da Capital - como experimentei pela primeira vez na noite de sexta-feira para sábado - não é obrigatório pertencer à comunidade de origem, sambar como passista ou tocar um instrumento: basta uma fantasia e um sorriso no rosto. Sambar na passarela é estar no foco da atenção de todos - da mídia, da plateia, dos jurados - e, ao mesmo tempo, ficar despercebido no meio da multidão.
De acordo com a posição que se ocupa e da fantasia que se veste, ganha-se mais ou menos notoriedade. Para grande parte dos participantes, no entanto, pouco importa a posição: o maior desejo é cultivar a tradição, honrar o nome da escola, respeitar as regras, esbanjar alegria e cativar o público. Esses elementos garantem a ligação entre novatos e antigos.
Foi assim que me misturei aos 2 mil integrantes do Estado Maior da Restinga para momentos de cumplicidade e estranhamento no Porto Seco. Mesmo não sendo moradora da comunidade da Tinga e não tendo participado do deslocamento em comboio que deixou o bairro na Zona Sul até a Zona Norte, me senti integrada. Mesmo desconhecida dos membros da escola, me tornei familiar assim que coloquei a fantasia, pisei na passarela e comecei a dançar e cantar. Olhar esta festa de dentro para fora significa compreender a importância do Carnaval como um grande momento para essa comunidade. Significa entender a folia como uma expressão de sua cultura, de sua solidariedade, de seu modo de viver.
- O desfile dessa escola representa exatamente o que a gente é: um grande estado, unido e diversificado, praticamente uma cidade à parte dentro da Capital. E o carnaval é a nossa cara, o que mais gostamos de fazer para se divertir - explica um integrante.
É esse senso de felicidade compartilhada a maior razão que leva as pessoas ao Porto Seco, uma década após sua instalação. Essa mesma razão leva pessoas como Joseliza Moraes a se tornar uma espécie de "fada madrinha" dos foliões da Tinga, fazendo ajustes de última hora nas fantasias para ver o sonho de pisar na passarela se materializar.
- Todos os anos é assim, essa correria até o último minuto. No final, sempre dá tudo certo - diz Joseliza.
Fora isso, cada um tem seus motivos particulares para curtir o carnaval. Ao final do desfile, um menino chorava copiosamente vendo a Tinga deixar a avenida. Olhei para sua mãe em busca de entendimento, e ela foi logo dizendo que "aquilo era emoção e emoção não se explica". Dos seus poucos anos de vida, ele mal podia compreender a complexidade do enredo e das alegorias que homenageavam a cantora gaúcha Elis Regina, mas certamente tinha uma interpretação própria que dava todo o sentido para o enredo "És fascinação! "
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Carnaval
Vidas compartilhadas na comunidade e na passarela do Porto Seco
A repórter de Zero Hora Lara Ely conta como foi desfilar com a Estado Maior da Restinga
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