A melhor receita para sermos justos com os outros é, quando temos um impasse com alguém, colocarmo-nos no lugar desse alguém.
Entre mil coisas que evitaremos, existe muitas vezes o fato de exigirmos piedade e compreensão para nós e não concedermos isso para os outros.
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Há milhões de situações em que é sensato nos colocarmos no lugar dos outros.
Outro dia, fui até a Fronteira Oeste de ônibus de linha. Era evidente que o motorista do ônibus em que eu viajava estava fazendo ultrapassagens arriscadas e imprimia excesso de velocidade nas curvas.
Antes de chamar a polícia rodoviária para corrigir o motorista, como eu sou uma pessoa muito conhecida, vários outros passageiros me escalaram para tomar uma providência.
Não me esquivei, fui até a cabina do motorista e, enquanto ele prosseguia dirigindo, eu lhe fiz as seguintes colocações:
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- Senhor motorista, eu não o conheço, mas vários passageiros me pediram para que viesse aqui lhe fazer uma advertência e um apelo. Do jeito que o senhor está dirigindo, coloca em risco a vida de todos nós, passageiros, e sua própria. Os passageiros estão pedindo que o senhor não pratique mais ultrapassagens arriscadas e diminua a velocidade nas curvas. Tenha a bondade de atender o pedido deles. Sei que o senhor deve estar cansado e pode possuir razões para estar nervoso e apressado. Mas, acima de tudo, está a vida dos passageiros que o senhor está transportando.
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Mas aí é que está a coisa. Voltei para junto dos outros passageiros e disse para todos o seguinte:
- Meus amigos e amigas que estão viajando comigo. Ponham-se no lugar desse motorista que está nos guiando. Com certeza, ele não dorme direito, não lhe concedem a folga justa e humana. Além disso, a empresa em que ele trabalha deve exigir um horário nos trajetos que está acima de seu desempenho normal, o que o faz apressar-se. Outra coisa, vim a saber quanto ganha um motorista de ônibus intermunicipal, é por volta de R$ 1.110 a R$ 1.400 mensais. Ele deve ter família, talvez extensa prole, por já ter mais de 54 anos, não consegue dar um tratamento justo à família, falta dinheiro para sustentá-la. Eu pergunto, então, para os senhores: não há razões adequadas para esse motorista estar dirigindo tão perigosamente?
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Todos concordaram comigo, e alguns, que tinham ameaçado até agredir o motorista faltoso, ou xingá-lo, resolveram nada fazer com ele e seguir viagem cordata, à espera de que a advertência que fiz ao motorista em nome deles surtisse efeito e a viagem não apresentasse mais sobressaltos.
É a tal coisa: precisamos nos colocar no lugar de quem está nos prejudicando com suas atitudes. Sempre.
Não é certo só olharmos as questões por nossos pontos de vista. É preciso que assumamos o lugar dos outros, e compreenderemos melhor a vida.
Ah, faltavam 200 quilômetros para o fim da viagem quando aconteceu o relatado acima. E toda a distância faltante foi percorrida com tranquilidade. O motorista se pôs sereno depois que falei com ele.
Sem necessidade de chamar a polícia.
Opinião
Paulo Sant'Ana: "O motorista faltoso"
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