Por Luiz Carlos Corrêa da Silva*
O problema de saúde do ex-presidente Lula, um tumor maligno na laringe tratado durante os últimos meses, tem repetidamente voltado à mídia, principalmente após as recentes declarações de seus médicos sobre o prognóstico favorável da situação. Em face destas últimas notícias, a população está menos apreensiva, pois ninguém poderia ficar indiferente ante o sofrimento de um líder com tal envergadura e carisma.
Um aspecto curioso é que, há alguns anos, quando questionado por repórteres por continuar fumando no seu gabinete presidencial, num momento em que se discutia a proibição de fumar em ambientes fechados,sua resposta não foi a que se esperava de um chefe de Estado: "Na minha sala, mando eu, e lá eu fumo quando quiser e ninguém tem nada com isso". Também, inúmeras vezes, a mídia chamou a atenção de que Lula estava exagerando no consumo de bebidas alcoólicas. O tempo passou e, ao que parece, o ex-presidente continuou com seus costumes. Fato semelhante acontece com milhões de brasileiros que, por não terem acesso ou por ignorarem e, como consequência, não incorporarem as fartas e já costumeiras informações sobre riscos para a saúde ou, simplesmente, por serem dependentes, permanecem com um estilo de vida errado e pernicioso, e não enfrentam seus problemas, com vistas à mudança necessária.
Lula deveria participar de campanhas de alerta sobre os fatores de risco do câncer?
Este episódio de saúde que monopolizou quase um ano da vida política, social e familiar do expresidente não foi suficiente para que se motivasse a dar mais uma grande contribuição ao país. Mas, agora que a poeira baixou e ele está, aparentemente, recuperado do susto e deste problema de saúde que, esperamos, tenha sido efetivamen-te vencido, se abre mais uma excelente oportunidade de vir a tornar-se um dos maiores líderes e heróis que o Brasil jamais teve. Para isso, bastaria que reconhecesse a relação causal do tabagismo e do alcoolismo como fatores relacionados ao câncer que o atingiu, manifestasse arrependimento por ter permitido que esses maus hábitos atrapalhassem sua vida e aconselhasse a todos que, para seu próprio bem, deveriam livrar-se desses problemas o quanto antes.
Um gesto tão simples e direto, mas inegavelmente temperado pela grandeza, certamente teria enorme influência para todas as pessoas, principalmente aquelas mais humildes que carecem de oportunidades e motivações para melhorar sua saúde e sua vida. O resultado poderia propiciar benefício para esses milhões de brasileiros simplesmente por pararem de fumar: em pouco tempo, se reduziria o número de casos de infarto de miocárdio em 30%, o de câncer de pulmão em 90%, o de enfisema em 85%, e o de derrame cerebral em 30%.
No momento atual, em que o setor político se desgasta a cada dia pela falta de compromisso com o povo e pelo seu envolvimento com pessoas e fatos nada edificantes, cairia muito bem uma atitude diferenciada, não demagógica e de tão profundo alcance humanístico. Não só pelos seus inúmeros outros feitos, mas, também, por este ato de bravura, desprendimento e humildade, que certamente poderia ajudar milhões de brasileiros a abandonar estes comportamentos de risco, Lula viria a ser o mais lembrado e mais admirado dos presidentes!
*Pneumologista da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre